A Associação dos Servidos da Fundação Biblioteca Nacional (ASBN) divulgou hoje (6) uma carta de repúdio contra o Ministério da Cultura (MinC) na qual critica o processo de discussões da legislação referentes ao depósito legal e à guarda de publicações digitais, bem como a retirada da bibliotecária Luciana Grings, que é servidora na instituição, do grupo de trabalho (GT) formado para discutir a questão.

Grings foi afastada do GT no último dia 5 após entrevista à Biblioo , na qual ela criticava não só a não inclusão dos servidores da BN na rediscussão da legislação do depósito legal, mas também o convite que o ministro da Cultura, Roberto Freire, teria feito a Amazon, uma empresa transnacional de comércio eletrônico norte-americana, para participar do referido GT.

“A remoção arbitrária de Luciana Grings do GT, além de perseguição política, configura uma censura de vozes dissonantes ao discurso e proposta da gestão atual do MinC”, diz o documento. “Diante desses inaceitáveis acontecimentos, prestamos apoio e endossamos as palavras da profissional servidora de carreira da FBN, Luciana Grings, coordenadora de Serviços Bibliográficos, sob o qual se encontra a área responsável pelo depósito Llgal”, esclarecem os servidores.

Luciana Grings é coordenadora de Serviços Bibliográficos da Biblioteca Nacional. Foto: Rodolfo Targino / Agência Biblioo

De acordo com a nota, assinada também pelas Associações dos Servidores do Iphan (ASPHAN) e da Funarte (ASSERTE), a Biblioteca Nacional, principal interessada e implicada no sistema de depósito legal, não foi consultada a respeito da criação do GT, “composto de forma autocrática para a revisão da lei”.

A possível descentralização do depósito legal, fazendo com que as bibliotecas públicas estaduais passassem a assumir este papel, também foi criticada pelos trabalhadores. “Entendemos a descentralização do depósito legal como interferência em atos administrativos e processos, com o objetivo de desmonte da estrutura principal da FBN, órgão cuja missão fundamental é a preservação da memória bibliográfica brasileira”, diz o documento.

Os servidores cobram uma revisão da atitude tomada pelo MinC e pelo Departamento de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas (DLLLB), cujo diretor é o bibliotecário Cristian Brayner, órgão ao qual a FBN não está subordinada. “O GT, como está composto atualmente, fere os princípios da administração pública e ofende o interesse coletivo, pois intenta alterar uma legislação referente a processos técnicos fundamentais para a preservação do patrimônio nacional”, dizem os trabalhadores.

De acordo com a presidenta da ASBN, Luciana Muniz, até o início da noite o MinC ainda não havia se pronunciou sobre a manifestação dos servidores.

Esclarecimento da Biblioo

Logo após a publicação da entrevista de Grings, a Biblioo foi procurada pelo diretor do DLLLB, que se mostrou contrariado com as afirmações feitas pela bibliotecária no decorrer da entrevista. Segundo ele, a publicação deveria ter consultado as outras partes envolvidas no caso, ou seja, MinC, FBN e DLLLB, antes de publicar a fala da servidora. Brayner foi informado pela equipe de editores que no caso de publicações integrais de entrevistas, como foi o caso, a Biblioo aguarda a repercussão inicial para em seguida convidar as partes citadas a manifestar suas posições, o que já foi feito em relação ao DLLLB e a FBN.

Ele ainda foi informado que este procedimento das entrevistas integrais adotado pela Biblioo, muito comum entre os veículos de comunicação, é diferente do adotado em relação às reportagens nas quais os editores procuram consultar as partes antes mesmo de colocar o conteúdo no ar, possibilitando que todos tenham chances de se manifestar.

Aparelhamento do MinC

Os servidores do MinC também divulgaram uma nota nesta quarta-feira (5) criticando o que chamaram de aparelhamento do Ministério e ao desmonte das políticas culturais. De acordo com o documento, há um claro processo de comprometimento de ocupação dos cargos iniciado pela gestão do ex-ministro da Cultura, Marcelo Calero.

“A atual gestão do Ministério optou por não dar continuidade a procedimentos de seleção por critérios que sejam publicamente conhecidos. O único critério que parece ter sido adotado é o de pertencer ao partido do ministro”, diz o documento.

De fato, uma reportagem publicada no último dia 31 pelo portal Fórum mostra que dezenas de derrotados do PPS, partido de Roberto Freire, nas últimas eleições ganham cargos no Ministério. Procurada pela Fórum, a assessoria de imprensa do MinC enviou uma nota, assinada por Freire, na qual ele alega que a escolha dos nomes para a equipe “se dá por critérios republicanos”. “Nossa preocupação é com a competência, a experiência, a idoneidade e a conduta ilibada dos funcionários que aqui atuam”, dizia o comunicado.

Leia baixo a integra da nota da ASBN, ASPHAN e ASSERTE

URGENTE!!!!

PRECISAMOS FALAR SOBRE A BIBLIOTECA NACIONAL

CARTA DE REPÚDIO

Nós, servidores da Fundação Biblioteca Nacional (FBN), profissionais e instituições envolvidos com a área de BIBLIOTECONOMIA e CULTURA, vimos, por meio desta, manifestar nossa veemente indignação e repúdio à atuação do Ministério da Cultura (MinC) no que diz respeito às discussões da legislação referentes ao Depósito Legal e à guarda de publicações digitais, bem como a retirada da servidora Luciana Grings do Grupo de Trabalho (GT) sobre o tema.

O Depósito Legal é um poder-dever concedido à FBN (como a todas as Bibliotecas Nacionais do mundo) para recolher um exemplar de todas as obras publicadas em território nacional. O objetivo do dispositivo legal é a preservação desta memória. Entendemos a descentralização do Depósito Legal como interferência em atos administrativos e processos, com o objetivo de desmonte da estrutura principal da FBN, órgão cuja missão fundamental é a preservação da memória bibliográfica brasileira.

Ressaltamos também o processo desrespeitoso pelo qual as discussões de revisão da legislação estão sendo conduzidas pelo MinC. A Biblioteca Nacional, principal interessada e implicada no sistema de Depósito Legal, não foi consultada a respeito da criação de um GT, composto de forma autocrática para a revisão da lei. Segundo matéria veiculada no site do MinC, em 16 de março de 2017, representantes de uma empresa transnacional de comércio eletrônico norte-americana, a Amazon, foram convidados pelo Ministro da Cultura, Roberto Freire, a participarem de “um Grupo de Trabalho […] com o objetivo de analisar, discutir e propor reformas na legislação”. Somos enfaticamente contrários à inserção de uma empresa privada de fins comerciais em diálogos que envolvam a manutenção do patrimônio público brasileiro.

Diante desses inaceitáveis acontecimentos, prestamos apoio e endossamos as palavras da profissional servidora de carreira da FBN, Luciana Grings, coordenadora de Serviços Bibliográficos, sob o qual se encontra a área responsável pelo Depósito Legal. Após ser indicada como membro representante da FBN, em resposta ao Ofício do MinC nº 035/2017, de 06 de fevereiro de 2017, a funcionária sofreu retaliações por causa de entrevista realizada ao periódico online Biblioo, na qual criticava a postura do MinC. No último dia 05 de abril de 2017, a mesma foi removida do GT. Destacamos que a servidora foi escolhida para compor o grupo por sua capacitação profissional e produção de conhecimento acadêmico sobre o assunto, com publicações referentes à Lei. A remoção arbitrária de Luciana Grings do GT, além de perseguição política, configura uma censura de vozes dissonantes ao discurso e proposta da gestão atual do MinC.

Queremos, portanto, uma revisão da atitude tomada pelo MinC e pelo Departamento de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas, órgão ao qual a FBN não está subordinada, através de uma retratação e retomada de decisões com protagonismo efetivo da principal instituição responsável pelo Depósito Legal, tal como o cancelamento do GT, instituído de forma autoritária e irregular, através de interferências administrativas. O GT, como está composto atualmente, fere os princípios da administração pública e ofende o interesse coletivo, pois intenta alterar uma legislação referente a processos técnicos fundamentais para a preservação do patrimônio nacional.

Assinam essa carta,

ASSOCIAÇÃO DOS SERVIDOS DA FUNDAÇÃO BIBLIOTECA NACIONAL (ASBN)

ASSOCIAÇÃO DOS SERVIDORES DO IPHAN (ASPHAN)

ASSOCIAÇÃO DOS SERVIDORES DA FUNARTE (ASSERTE)

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