A bibliotecária Kátia Costa já havia sido convidada em outras ocasiões a participar dos pleitos eleitorais. No entanto, por acreditar que não estava pronta para uma empreitada tão importante, recusou os convites. Só neste ano de 2018 é que ela finalmente ganhou coragem e se candidatou a deputada federal pelo PSOL em Santa Catariana. “Diante do que vemos em nosso legislativo, executivo e judiciário, percebi que era hora de tentar”, justifica Kátia que é uma das 8.595 pessoas em todo o Brasil que concorrem a uma vaga no Congresso Nacional.
Tendo atuado em várias frentes na Associação Catarinense de Bibliotecários (ACB), de onde está licenciada, a bibliotecária percebeu que poderia, a partir desta experiência, “fazer política boa, partidária ou não”. “Vejo que é possível não se vender, mesmo que o caminho seja mais difícil ou tenha mais obstáculos, porque lutar contra bancadas inteiras de políticos fascistas, comprometidos com seus bolsos e não com a população, não deve ser tarefa nada fácil”, diz ela que trabalho há oito anos no serviço público.
Kátia explica que uma de suas propostas é a de criar editais, leis e programas para fortalecer o Fundo Nacional de Cultura com dotação orçamentária própria e continuada, incluindo comissões julgadoras plurais e democráticas e formadas pela sociedade civil e pelo poder público. Além disso, a candidata se compromete a lutar para que que o Conselho Nacional de Política Cultura, órgão colegiado integrante da estrutura do Ministério da Cultura (MinC), seja paritário, com reuniões regionalizadas, podendo a sociedade participar ativamente em todos os processos.
Ela ainda pretende propor uma percentagem mínimo de 2% do orçamento da União para cultura. “A Cultura não pode ser vista somente como lazer. A arte e a cultura são importantes elementos de diversidade, criação, desenvolvimento humano. Temos que fomentar, difundir, estimular todas as áreas da cultura e arte, seja material ou imaterial, assim estimulamos outros segmentos como segurança, economia, saúde e educação”, diz ela que também pretende rever a Lei Rouanet, bem como os critérios de estímulo ao financiamento de empresas em produções locais.
No que se refere às bibliotecas, seara que tanto conhece, a bibliotecária pretende fiscalizar o cumprimento da Lei 12.244/10, que estabelece a instalação de uma biblioteca, com bibliotecário, em cada unidade de ensino básico do país até o ano de 2020, além de estimular a criação de fundos e/ou editais para bibliotecas públicas, escolares, comunitárias e prisionais. “[Pretendo] estimular a criação de novas salas de cinema, manutenção de teatros, museus, arquivos e bibliotecas públicas”, destaca a ex-presidente da Associação Catarinense de Bibliotecários.
Em São Paulo
Seguindo os mesmos passos da colega catarinense, a bibliotecária Vera Stefanov também se lançou à disputa a uma vaga na Câmara dos Deputados pelo PSOL de São Paulo depois de uma experiência sindical de 20 anos. Vera é presidente licenciada do Sindicato dos Bibliotecários do Estado de São Paulo (SinBiesp), onde conseguiu implantar a convenção coletiva de trabalho, o dissídio coletivo, além de um piso salarial para a categoria no estado, sendo este uma “referência para o Brasil”. “São anos que nos dedicamos à luta da classe, enfrentando a resistência na empregabilidade e nas condições de trabalho adequadas ao profissional da informação”, destaca.
A candidata se orgulha de sua participação na formação das leis de incentivo à cultura e de sua presença em eventos para políticas socioculturais, reivindicando implantação de bibliotecas, além de se empenhar na preservação do patrimônio público. “É por essas iniciativas, disseminando a profissão e em defesa da cultura e da educação, em todas as suas formas, livros, literatura, bibliotecas, museus, arquivos, entre tantos, que estamos preparadas para assumir novos desafios políticos”, garante.
Além da luta pela cultura, uma das motivações de Vera para concorrer a uma vaga no Congresso Nacional é a baixa representatividade feminina. Segundo ela, o Brasil tem uma das maiores desigualdades entre gêneros, sendo que em nosso parlamento há apenas 11% dos cargos ocupados por mulheres (menor que o Níger, país africano de menor IDH, ocupando a posição 183º).
No que se refere às suas propostas, a bibliotecária afirma que reduzir o orçamento destinada à cultura, como tem sido feito anos após ano pelos governos, “é um crime”. Afirma que dos 5.570 municípios brasileiros, 112 ainda não possuem biblioteca e que a grande maioria não tem bibliotecário. Para ela, é preciso valorização e preservação de todas as culturas étnicas, indígenas, quilombolas, afros e demais miscigenações.
Na campo da educação, pretende propor uma reestruturação escolar do ensino fundamental, desde fisicamente (prédios) até a inclusão de matérias retiradas recentemente do currículo escolar. “Simplesmente 82% dos prédios de escola pública não contemplam banheiros adequados para crianças. As escolas devem ter salas de aula bem equipadas, bibliotecas completas com o profissional bibliotecário e auxiliares, quadras esportivas, aulas de artes cênicas, música. Período integral obviamente. E nenhuma criança fora da escola, um programa de alfabetização de adultos”.
Ainda de acordo com a candidata, no Brasil existem 13 milhões de analfabetos, além de 50 milhões são semianalfabetos, “o que é inadmissível”. “Isto significa que 40% da população não lê. 30% nunca comprou um livro. Cada brasileiro lê apenas 4,96 livros ao ano e destes somente 2,43 terminaram a leitura. Incentivo à leitura está muito fortemente presente em nossos projetos, como por exemplo, a obrigatoriedade das empresas de incluir na cesta básica o vale cultura. As escolas devem atender a comunidade local, com atividades culturais e esportivas”, garante.
Na área de ciência e tecnologia, ela critica a redução de recursos para a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) que teria prejudica 93 mil pesquisadores, “que foram simplesmente excluídos, com trabalhos em andamento”. De acordo com a candidata, mais 105 mil bolsistas do programa de formação de professores da rede básica de educação também deixarão de receber os recursos previstos o que, segundo ela, se faz urgente realocar investimento no desenvolvimento de pesquisas e profissionais.
No Rio de Janeiro
Concorrendo a uma vaga à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) pelo MDB, o bibliotecário Andre Britto decidiu ingressar na vida política porque, segundo ele, inúmeras vezes se indignou sobre os acontecimentos recentes no Brasil e os efeitos que isso impunha ao estado do Rio de Janeiro, cuja economia sempre foi bastante dependente do Setor de Petróleo e Gás, área em que atua desde que se formou em 2008.
“No governo federal, podemos destacar que a crise se intensificou pela falta de planejamento e gestão, além da corrupção generalizada e de esquemas de desvios de verbas e recursos públicos como destacado por exemplo em matéria da Folha de São Paulo com o título ‘Financiamento do BNDES às obras no exterior é maior do que feito no país’, sobretudo nestes últimos 16 anos, ocasionando no sucateamento e no desmonte do Serviço Público”, destaca Andre que é servidor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Como especialista na área, o bibliotecário destaca de forma negativa uma agenda marcada pelo que chamou de “ideologia do ultranacionalismo” em que, segundo ele, se defendeu a descontinuidade de captação de investimentos de origem estrangeira. Isso teria resultado num atraso em anos sem licitações para concessão em diversos setores, “como no Setor de Petróleo e Gás em que se ficou 5 anos sem Rodadas de Licitação de Blocos para Exploração e Produção de Petróleo e Gás, causando retração na Indústria Nacional e consequente onda de demissões e desmobilização da estrutura produtiva”.
Embora o programa de trabalho do candidato não tenha um tópico específico sobre cultura, ele propõe que o setor produtivo possa realizar investimentos diretos de até 1% do valor devido do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) para o investimento em bibliotecas, arquivos e museus públicos, bem como em projetos de acesso à leitura.
Dentre as suas propostas também está as de realizar a contratação por meio de concurso público, ou de forma direta e indireta, de bibliotecários, arquivistas e museólogos para compor a rede de bibliotecas, arquivos e museus municipais e estaduais, bem como promover a tipificação de bibliotecas, arquivos e museus no estado do Rio, além de realizar estudos com a finalidade de estabelecer parâmetros para implementação de adicional de insalubridade e de periculosidade para estes e outros profissionais envolvidos nestes setores.
O candidato também assinou um termo de compromisso com o Conselho Regional de Biblioteconomia da sétima Região (CRB7) no qual se compromete, entre outras coisas, a apoiar a criação de um sistema estadual de bibliotecas escolares, inclusive com o cumprimento da lei das bibliotecas escolares, a promover a reestruturação da rede de bibliotecas públicas do estado, bem como se empenhar em estabelecer uma previsão orçamentária tanto para bibliotecas públicas, quanto para as escolares.
Ainda no Rio
Dentre os candidatos aqui apresentados, Waldeck Carneiro é de longe o que tem a maior experiência na política partidária. Embora esteja em seu primeiro mandato como deputado na Assembleia Legislativa do estado do Rio de Janeiro, Waldeck foi vereador por três vezes em Niterói, cidade da região metropolitana do Rio, além de cumprir funções no executivo local. Waldeck tenta a reeleição pelo Partido dos Trabalhadores (PT), legenda a qual é filiado.
Bibliotecário de formação, mas tendo desenvolvido sua carreira como pesquisador na área da educação, o deputado fez deste último a razão para aderir à vida política. “A luta pela educação e o compromisso com a educação me trouxeram para a política. E com uma visão da educação muito articulada com a ciência e a cultura. Ou seja, com foco na formação humana e nos processos criativos. Toda a minha trajetória na vida pública tem sido pautada pela valorização da educação e de seus profissionais; pelo apoio às mais diversas manifestações culturais, em especial no âmbito da cultura popular”, garante.
Autor de uma lei que obriga a instalação de bibliotecas escolares em todas as unidades públicas e privadas de educação básica no estado do Rio de Janeiro até 2020 (Lei 7383/2016), o deputado preside na ALERJ a Frente Parlamentar em Defesa das Biliotecas, do Livro e da Leitura, lançada recentemente. Segundo ele, a leitura, como prática pedagógica cotidiana, é fundamental para elevar a qualidade da escola e decisiva para o processo de construção do conhecimento pelos estudantes.
“Como prática do campo da cultura, a leitura é essencial para a ampliação do repertório cultural das pessoas. Nesse sentido, em todas as iniciativas onde cabe jogar peso nesse tripé (biblioteca, livro e leitura), fico sempre vigilante. Recentemente, foi aprovado na ALERJ um projeto sobre ocupação cultural de prédios ociosos. Fiz uma emenda, que foi aprovada, garantindo, nas salas de leitura implantadas como parte da ocupação cultural, a presença de bibliotecários”, destaca ele que é professor licenciado da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF), onde coordena o Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas de Educação.
“Já inaugurei várias bibliotecas, quando fui secretário de educação de Niterói e também idealizei e coordenei três edições do Salão da Leitura de Niterói, evento literário de grande porte”, afirma ele que é autor de várias publicações, principalmente na área de política educacional, como “A miséria da biblioteca escolar”.