Há poucos dias foi escrita uma das mais importantes páginas da história deste país. Alguns chamam de ‘’Revolução dos 0,20’’, outros acham que foi uma baderna sem tamanho. A opinião pública ficou dividida, a mídia que antes classificou como manifestação antidemocrática e de vândalos, voltou atrás quando percebeu a magnitude que tal ato ganharia. Foram jovens abraçados com anciões, mães com seus filhos, estudantes, artistas, mendigos, homens, mulheres, enfim, o povo unido nas ruas.

Os momentos desde a primeira manifestação, quando poucos estudantes foram tratados de forma truculenta pela tropa de choque da Polícia, nas imediações de umas das principais artérias do centro do Rio, desde o ápice apoteótico na lendária e emblemática Avenida Rio Branco, habitarão para sempre em minha memória. Vivenciei uma experiência única e peculiar, chorei como criança ao perceber que a mente das pessoas estava mais aberta, mais sensível às causas comunais.

No histórico dia 17 de Junho, eu vi trabalhadores de vários setores unidos aos jovens, somando mais indignação, revolta e desejo de mudança. Vi sindicatos inteiros representados por pessoas que não esperam a mudança sentados em suas confortáveis salas, bebendo dos mais desejados vinhos. Vi operários acostumados à luta sentirem orgulho dos jovens que foram às ruas clamar por mudanças. Vi pessoas saírem dos inúmeros escritórios que há na lendária avenida, com suas roupas sociais, aderirem à marcha. Porém não vi futuros colegas de trabalho participando do ato. É claro que não posso cometer o erro de generalizar e proferir falácias afirmando que não tinha nenhum bibliotecário presente; claro que tinha! Mas a participação desses profissionais em protestos, manifestações é tão ínfima, que sempre me faço uma pergunta: onde está você bibliotecário?

Muitos (mais muitos mesmo) bibliotecários preferem ficar alheios a essas manifestações por achar que não tem nada a ver com a causa ou que R$ 0,20 realmente não vale a pena para tamanha mobilização. Esquecem que a profissão está dentro da área das ciências sociais e humanas e, por consequência, deveriam estar mais atentos ao clamor popular. Esquecem que há cidadãos sem direitos básicos, pois não têm acesso à informação que possa levá-los a adquiri-los. Esquecem até do juramento feito quando colam o grau de bacharel.

A culpa nem sempre é toda desses profissionais. A formação contribui para o distanciamento do bibliotecário das causas sociais. O modelo que os cursos de Biblioteconomia escolheram no Brasil, foi o modelo voltado para a formação de profissionais para o mercado de trabalho. Como afirma Luís Milanesi no texto A formação do Informador (2002), “[…] preferindo-se formar aplicadores de procedimentos técnicos a profissionais críticos. Tal opção justificava-se pela necessidade de atender à demanda do mercado que, aliás, nunca esteve acima da capacidade dos cursos superiores de formarem bibliotecários”.

Não culpo os colegas que querem passar em concursos, que buscam bons empregos em empresas conceituadas, que investem pesado em estudos para obterem melhores salários; eu também penso e quero ter uma estabilidade financeira. O que me deixa triste é perceber que a classe só se une quando é para fazer encontros restritos e prosear nos coquiteis da vida. Fico estático quando vejo profissionais pachorrentos, sentados em suas cátedras de madeira maciça, alheios aos acontecimentos sociais.

Buscam um novo nome para estarem “atualizados” no mercado de trabalho, como se bibliotecário fosse hoje sinal de um profissional ultrapassado, com práticas não mais importantes e fora de contexto. Também, depois de tanto afastamento, tanto preocupar-se com o mercado de trabalho em detrimento de uma atuação mais voltada ao social, ao trato com as pessoas, é de se esperar que adotando o pseudônimo de ‘cientista da informação’, a sociedade possa nem perceber que se trata de um bibliotecário, que tanto fez para que ele próprio não fosse reconhecido como um profissional importante pela própria sociedade.

As ruas mandaram o recado, os covardes e morosos governantes recolheram-se ao abrigo dos palácios, querendo negociar o inegociável. A mídia oportunista quer ditar o tom do discurso e sugerir indumentárias. O mundo voltou-se mais uma vez para o Brasil, não para ver o carnaval ou mais um exemplo ruim que mancha nossa imagem, mas para assistir umas das maiores demonstrações de força de um povo que está cansado de ser maltratado. E a pergunta persisti: e você, onde está bibliotecário?

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