Ao longo de 2016 a Revista Biblioo acompanhou de perto a situação das bibliotecas parque do Rio (BPEs). Registrou e realizou eventos nas dependências das BPEs; problematizou o desmantelamento das unidades e o descaso do governo para com estes espaços; repercutiu as manifestações que se seguiram e por fim discutiu o encerramento do projeto.
Apesar disso, nesta última semana a dispensa dos funcionários, contratados por meio de uma organização social (o IDG), foi sacramentada, seguido do trancamento das portas, deixando sem emprego diversos trabalhadores e sem assistência um número significativos de usuários.
Como última iniciativa de repercussão dessa triste situação neste ano, a Biblioo apresenta agora a manifestação de diversas pessoas sobre o fechamento das BPEs. Bibliotecários, professores e usuários falam sobre a importância do projeto encerrado de forma prematura e do significado deste em suas vidas e na vida de diversos cidadãos. Confira:
Daniella Spudeit, professora da Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC) e membro do Movimento Abre Biblioteca
“É com muita tristeza que recebo essa notícia após algumas lutas travadas no movimento Abre Biblioteca Rio. Não é só o fechamento de uma rede magnífica de bibliotecas, é o fim de um espaço democrático para acesso à informação, cultura e lazer. É o fim de um ambiente de construção de sonhos, de busca de cidadania, de um mundo novo, de oportunidades. O povo precisa lutar. É seu futuro que está em jogo. Cobrem das autoridades. Façam jus aos votos que deram. Não parem de lutar.”
Kelly Pereira, bibliotecária da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro (PGE/RJ) e presidente do Grupo de Informação e Documentação Jurídica do Rio de Janeiro (GIDJ/RJ)
“Fico triste como cidadã carioca pelo fechamento (sem previsão de reabertura por causa da crise e por falta de prioridade nas práticas governamentais) de um espaço de Cultura e entretenimento de arquitetura contemporânea e de consonância com práticas ambientais, como a proposta da biblioteca parque. Como bibliotecária estou perplexa pelos profissionais que neste final de ano estão sem empregos e pelos cidadãos que perdem mais um espaço de múltiplas formas de convivência com a informação que nos permite ver, rever, refletir e achar possíveis soluções para as tensões atuais e futuras.”
Leonardo Nóbrega da Silva, doutorando em Sociologia (IESP-UERJ) e usuário das BPEs
“As bibliotecas desempenham um papel fundamental na construção de uma sociedade justa: trata-se de um espaço de uso comum em que se pode ter acesso a livros, periódicos, filmes e demais meios de divulgação científica e de entretenimento, num ambiente acolhedor e de livre acesso. A Biblioteca Parque do centro do Rio de Janeiro foi um dos lugares mais acolhedores que eu, recém-chegado à cidade como estudante de pós-graduação, encontrei para estudar. Ambiente iluminado e climatizado, com vasto acervo de livros e revistas, no centro da cidade, e bastante receptivo às pessoas que dela fazem uso. Foi um duro golpe saber, ainda em 2015, da redução do horário de atendimento, que não mais funcionaria no início da manhã e à noite (horários em que os trabalhadores podem ir à biblioteca) e aos domingos (que passava a receber cada vez mais pessoas em seus passeios de final de semana e estudantes atarefados). Mais entristecedor saber agora da real possibilidade de fechamento definitivo de todas as Bibliotecas Parque. O prejuízo para a atual geração de estudantes, leitores e demais frequentadores da biblioteca é incalculável. Por tudo que representa, o fechamento de bibliotecas não deveria nem mesmo ser cogitado.”
Amanda Ribeiro Dias, ex-bibliotecária da Biblioteca Parque do Estado
“Nós funcionários estamos desolados com o fechamento das Bibliotecas Parque. Cada uma das unidades representa um importante equipamento cultural para suas regiões. Não é somente o fato de estarmos desempregados. Existe um comprometimento de nossa parte com o projeto e com cada leitor e frequentador. O impacto será sentido por todos: crianças, adultos, idosos de todas as classes sociais. Ali, todos são tratados de forma igual. Na Biblioteca Parque Estadual [no Centro do Rio] eu ainda tenho a propriedade de falar na falta que fará para os leitores especiais, já que eu me encontrava na função de bibliotecária do setor de acessibilidade por mais de dois anos. Sabemos que a biblioteca é conhecida como um espaço acessível. Porém, para se chegar até o prédio, as pessoas com necessidades especiais enfrentam diversas barreiras arquitetônicas, já que a cidade do Rio de Janeiro, assim como muitas capitais do nosso país, ainda tentam se adaptar para dar condições de mobilidade. Durante os mais de dois anos que estive na biblioteca, algumas modificações foram feitas para facilitar a circulação no entorno da biblioteca. Rampas foram feitas. Funcionários do Metrô recebem treinamentos. O prédio da BPE está localizado num ponto estratégico entre as estações de Metrô da Central [do Brasil] e da [Avenida] Presidente Vargas. Nós funcionários acompanhávamos os leitores deficientes visuais até o Metrô. Esse simples fato, fez com que reconquistássemos os leitores (a biblioteca ficou fechada por seis anos para obras e antes existia um setor com um acervo em braile que era referência para os deficientes visuais). Ao saber do fechamento da biblioteca, esses leitores que retornaram estão se perguntando para onde irão já que a biblioteca a do Instituto Benjamim Constam não funciona nos meses de janeiro e fevereiro, segundo relatado por eles.”
Luciana Manta, bibliotecária e presidente do Sindicado dos Bibliotecários do Estado do Rio de Janeiro (SINDB/RJ)
O SINDIB-RJ externa o que na opinião de sua diretoria é o chamado ato irresponsável de uma gestão totalmente descompromissada com a sociedade e com o dinheiro público. Usada como máquina de campanha, as Bibliotecas Parque são o espelho de uma biblioteca pública que toda coletividade deseja. Principalmente, as mais carentes. Porém, como todos sabemos, tanto as bibliotecas parque como os demais aparatos implementados no governo anterior, herdados no atual, foram amplamente comprometidos por uma terceirização que imputa gastos muito maiores à máquina pública do que concursos públicos, isso sem falar no sucateamento do Rioprevidência, já que grande parte do corpo de funcionários públicos estão se aposentando e como não há novos concursos para repor, não haverá caixa suficiente para futuramente cobrir seus gastos, processo nítido de privatização. Nesse momento, esperamos que a Prefeitura possa arcar com essas grandes fábricas de mudanças sociais, que trazem no seu bojo, sonhos e possibilidades. Informamos aos funcionários, que todos podem buscar o Sindicato dos bibliotecários, inclusive já possuímos processo coletivo na justiça do trabalho contra o IDG, por não pagar corretamente o Piso Estadual.