Vivemos em um país múltiplo em pessoas, culturas, comidas, vestimentas, clima. O Brasil sem dúvida abriga uma infinita diversidade, dando-nos reconhecimentos internacionais por termos “o mundo inteiro” dentro de um só país. Mas nem todas as diferenças existentes por aqui são bem vistas pela maioria da população.
A Antropologia nasceu, dentre outros motivos, para estudar o que até então era desconhecido pelos povos europeus. Sociedades que viviam “isoladas’’ do velho continente foram sendo descobertas junto com a expansão marítima europeia. Esses povos causaram espanto, admiração, repulsa, e uma infinidade de emoções e sentimentos nos “civilizados” europeus; tão logo esses tiveram contato com aqueles. A isso dar-se o nome de Etnocentrismo, que segundo Everardo Rocha, em seu livro O que é Etnocentrismo?, “é uma visão do mundo com a qual tomamos nosso próprio grupo como centro de tudo, e os demais grupos são pensados e sentidos pelos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência”.
Muitas mudanças significativas vêm ocorrendo no seio da sociedade brasileira, desde a metade do século passado. O uso da pílula para evitar a gravidez, a lei que autoriza o divórcio, o início da independência da mulher (que passou a trabalhar fora), o surgimento de movimentos reclamando mais participação das minorias etc. Dos exemplos citados acima, nos atentaremos nos movimentos que reclamavam mais participação das minorias no cenário político e social brasileiro, mas especificamente, falaremos do movimento que adiante trataremos como LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros).
Um novo cenário social
A partir do final dos anos de 1970 do século XX, começam a aparecer pelo Brasil, sobretudo nos grandes centros, pessoas e grupos que se alto declaravam homossexuais, reivindicando direitos e mais participação dos mesmos na vida política e social brasileira. Tudo ocorria em meio às incertezas, pois o regime civil/militar ainda figurava no cenário político da nação, e com sanções terríveis para quem ousasse transgredir a lei vigente. Nesta época em que o Estado (apoiado por correntes mais conservadoras da sociedade, incluindo a Igreja Católica, e os donos de grandes fortunas), ditava as regras e condutas para a sociedade brasileira seguir. Com uma sociedade praticamente obediente e crédula, movimentos que propunham romper com a ordem vigente de forma abrupta, não tinham muitas chances de sobreviver.
A década de 1980 chegou com um grande e novo problema a ser enfrentado: a epidemia de AIDS. Com isso, muitos grupos e ativistas LGBT deixaram a militância um pouco de lado e passaram a trabalhar para que a AIDS fosse controlada. Sabemos que nesse tempo, a AIDS era uma doença nova, e como tal, havia pouca informação a seu respeito. Não demorou muito para a nova doença ser tachada como “peste gay”, devido ao alto índice de contágio entre a população LGBT. Por consequência, esse grupo que já não era bem-vindo por suas roupas, estilo de vida, e práticas sexuais, foi responsabilizado por “trazerem” esse mal ao mundo.
Os anos 1990 chegaram, e com eles, muitas conquistas para população LGBT. Inúmeros grupos e ONGsvoltados para esse público, surgiram e as chamadas “paradas do orgulho gay” começaram a acontecer em várias cidades do país; pessoas, famílias, escola e instituições passaram a enxergar as pessoas que tinham uma orientação sexual diferente da dita maioria. Isso serviu para dar visibilidade a essa população, mas também causou revolta e indignação da parte dos conservadores, que sempre ditaram normas para a sociedade, mas que agora estavam perdendo o controle.
Os discursos acerca da população LGBT são dos mais variados. Normalmente, se tem uma ou outra pessoa que defende os direitos dessas pessoas de forma enfática, enquanto a maioria tece comentários discriminatórios, baixos e ofensivos. Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros, são ”obrigados” a ouvir piadas injuriosas e constrangedoras de homens e mulheres que, do alto de seus valores morais e religiosos, se acham no direito de preterir o outro, por achar que o outro é anormal, por ter uma orientação sexual diferente. A sexualidade humana é diversa, incapaz de alguém a medir e/ou definir!
Pesquisas mostram que o Brasil é o campeão mundial de mortes da população LGBT. Em nosso país, uma pessoa LGBT é assassinada por motivos torpes a cada dois dias, segundo Luiz Mott em seu livro Causa Mortis: homofobia. Violação dos direitos humanos e assassinato de homossexuais no Brasil. Essa pesquisa é datada do ano 2000, e como sabemos que muitas instituições do Estado brasileiro não dão a devida importância para esse tipo de crime (como a Polícia, por exemplo), dando outros motivos para a morte, mas não por intolerância sexual, acreditamos que esse número não corresponde mais a realidade que vivemos nos dias atuais, ou seja, tememos que os números de assassinatos por homofobia tenham crescido vertiginosamente. A homofobia ganha terreno no Brasil, influenciada e muito por discursos políticos e religiosos. Fundamentalistas das mais diversas frentes da sociedade, engrossam o discurso e já não mais disfarçam, declaram em alto e bom som que vão lutar para que a lei do país favoreça a família e os bons costumes. No último pleito eleitoral (ocorrido em outubro), a chamada “bancada evangélica” saiu com 82 parlamentares eleitos; homens e mulheres com o compromisso de barrar leis que atendam a população LGBT (como o PL 122/06 da Câmara, que visa criminalizar a discriminação motivada unicamente na orientação sexual ou na identidade de gênero da pessoa discriminada). Com isso, pessoas perdem suas vidas devido à intolerância de tantas outras que não conseguem conviver com a diferença. Querem que a sociedade brasileira tenha apenas o padrão heterossexual como aceitável e o que não for assim, deverá se tratar ou sofrer as sanções legais do país.
A laicidade do Estado brasileiro é colocada em cheque, sempre que vejo pessoas do gabarito do pastor e deputado Marcos Feliciano falar em direitos humanos pautados no que ele acha como correto. Outros tantos, como o Jair Bolsonaro (e seus dois filhos que foram eleitos), Silas Malafaia e seu filho (que também foi eleito), dentre muitos outros que penso não valer a pena mencionar, fazem campanhas e mais campanhas contra aprovação de leis que atendam – eu disse atendam! – a população LGBT. Não se quer direito exclusivos para os LGBTs, pede-se que a lei os favoreça, como favorecem os que não são LGBTs, ou seja: o que se quer são direitos iguais, nem menos e nem mais!