Mesmo no mês dos bibliotecários, tive dúvidas sobre escrever esse texto. Uma dúvida que permeia a maior parte das escritoras com a experiência social e política de ser mulher, porque sempre questionamos nossas pretensões. No entanto, nossa responsabilidade política por vezes precisa ser relembrada, especialmente em momentos de crise.

Responsabilidade política que inclui quem se diz “apolítico”, quem é contra a política partidária, e quem diz que não gosta de política, porque todas as nossas decisões são políticas, incluindo a abstinência e a ignorância (no sentido de desconsiderar algo, não no sentido de desconhecer – que pode não ser uma opção).

Escrevo como bibliotecária e como técnica de enfermagem, duas formações que me apaixonaram e me moldaram como ser humano ao longo desses últimos 18 anos. Poderia, em tempos atuais, fazer um vídeo ou podcast, mas é a escrita essa outra paixão que insiste em me definir e o modo como expresso melhor o que penso – ou o que desejo pensar.

Dito isso, porque é necessário hoje em dia nos apresentar de tantas formas diferentes, começo um apelo ao senso político de colegas bibliotecárias, bibliotecários e bibliotecárixs; arquivistas; pós-graduados em ciência da informação e afins. Apelo, com o lembrete de que, ainda que se isente de participar da política ativamente, você é um profissional da informação, e a informação é, por si só, política.

Em tempos em que nossa profissão é cada vez mais desvalorizada, num projeto de educação subvalorizada e quando, mesmo sendo dedicadas/os nos questionamos qual é a nossa real função – em tempos em que todo mundo acha que tem acesso à informação disseminando fake news – é que se faz mais necessário darmos um passo e olharmos o todo.

Somos profissionais treinados para encontrar, avaliar e disseminar a informação, para dizer o mínimo. É nosso compromisso social, político e profissional, em tempos em que a informação se faz mais necessária, olharmos com respeito para o nosso papel.

Educarmos. Disserminarmos informações com fontes confiáveis. Explicarmos porquê uma fonte não é confiável. Ajudarmos a encontrar uma fonte que seja confiável. Identificarmos fake news e todo tipo de informação falsa, equivocada ou mal colocada – e apontar. Não nos cabe explicar o que não conhecemos, mas nos cabe dar acesso à informação correta. Espalhar onde estão as informações adequadas.

Ainda que você não seja profissional de informação em saúde, seu treinamento te permite identificar as fontes mais confiáveis para essas informações. Contate os colegas. Usem as redes para o bem informacional. Usem a OMS[1], as BVS[2], a Bireme[3]. Usem a Fiocruz[4] a vontade. Mas usem. Façam seus papéis, aproveitem os trabalhos remotos e dispensas para mostrar a nossa importância e a importância de um país bem informado.

Nosso maior problema atual é a saúde básica (Atenção Básica em Saúde), assim como a educação básica. Nos tiraram o básico. Nos tiraram o acesso à informação, prevenção em saúde, atenção primária. Para quem ainda não percebeu, esses são os termos em saúde para começar a busca, em qualquer vocabulário: controlado ou não. A área de saúde é ampla, mas é fácil encontrar as orientações de entrada que nos são negadas.

Os profissionais em saúde, de postos de saúde ou não, estão tão sobrecarregados e mal remunerados de modo que não conseguem, sozinhos, dar conta de passar toda essa informação para a população. Nosso povo sofre de verminoses e contaminações cruzadas simples por falta de noção da importância de lavar as mãos. Isso é saúde e educação básicas. E numa crise como a pandemia do Coronavírus isso fica visível e extremamente grave.

Não é só por “estupidez” e “individualismo”, como tenho lido, que as pessoas não estão cumprindo as recomendações, é por falta de conhecimento também! Por não saber o prejuízo – inclusive financeiro – para si e para os demais – de não cumprir as precauções e recomendações dos órgãos de saúde. Como podemos nos omitir diante disso? E não me venham dizer que isso é ignorância ou “porcaria”: quantas vezes vocês não viram os coleguinhas na graduação ou no trabalho saírem do banheiro sem lavar as mãos? É isso aí, parceiro, a gente viu e não falou em nome da boa educação e ética no trabalho.

Será ética mesmo, ou uma timidez moralista de acharmos que não devemos repreender ou educar pessoas adultas, ainda que o que ela faça seja grave do ponto de vista político? Falta de higiene é um problema de saúde pública que diz respeito a todos, sim. Será que alguma vez pensamos em nosso papel de profissional da informação, ou tememos parecer arrogantes?

Eu sei, não temos essas reflexões diariamente, mas é hora de ter. Você, como profissional da informação, tem se feito as perguntas certas? Tem questionado seu papel como ponte para uma informação essencial e relevante? Ou estamos apenas agindo de modo maquinário com o nosso fazer: “catalogar, divulgar, dar acesso”? “Posta nas redes, todo mundo vê” e só. É isso? O que fazemos é Serviço de Referência, verdadeiramente, ou apenas atendimento ao público? É mesmo a falta de tempo e de equipe que nos impede de refletir e prestar um serviço de qualidade?

Não estou aqui isentando a estrutura e o poder público com o qual temos que lidar. Não estou isentando a responsabilidade das grandes faculdades e escolas privadas e de empresas em sucatear o nosso trabalho nem propondo que façamos trabalhos não remunerados. Estou aqui propondo uma reflexão sobre os profissionais que somos e os profissionais que queremos e podemos ser. Tenho muito mais pra dividir e ponderar com vocês, mas por hora, deixo apenas essas provocações, para quem sabe assim, começarmos um movimento diferente.

PS: se você quer mais textos nessa temática, ou saber algo que não ficou claro, deixe sua opinião  nos comentários.

[1] OMS = Organização Mundial de Saúde

[2] BVS = Bibliotecas Virtuais em Saúde (diversas)

[3] Bireme = Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde

[4] Fiocruz = Fundação Oswaldo Cruz

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