“Vamos sair, mas não temos mais dinheiro

Os meus amigos todos estão procurando emprego

Voltamos a viver como há dez anos atrás

E a cada hora que passa envelhecemos dez semanas“…

(O teatro dos vampiros – Legião Urbana)

Nascido em um dos maiores colégios eleitorais do estado do Rio de Janeiro, o jovem Alfredo Dantas, desde pequeno sempre gostou de futebol. Assim como milhares de crianças das periferias cariocas já chegou a sonhar em ser um craque do futebol, desfilando nos gramados brasileiros e fazendo sucesso com a camisa do Vasco da Gama, clube que torce desde pequeno.

Mas como a vida é uma caixinha de surpresas e o futebol é uma aposta incerta, Alfredo, seguiu os conselhos dos seus pais e principalmente o de seu tio: “para ser alguém na vida é preciso estudar”.

Mesmo com todas as dificuldades os pais sempre fizeram questão de investir em sua educação e na do seu irmão.  Cursou todo o Ensino Fundamental em escola particular e somente no Ensino Médio viveu suas primeiras experiências com a educação pública, ao ingressar no Liceu Nilo Peçanha, conhecida na época como uma das melhores escolas públicas da cidade de Niterói.

Durante o Ensino Médio teve o seu primeiro contato com a biblioteca pública ao frequentar a antiga Biblioteca Pública de Niterói, localizada a poucos metros de sua escola e atualmente conhecida como a Biblioteca Parque de Niterói. Utilizava o espaço para estudar, pesquisar e fazer os trabalhos recomendados pelos professores. Ao caminhar sob o piso de madeira, entre as estantes de ferro e nas condições precárias do antigo prédio da biblioteca, jamais passou pela sua cabeça que um dia cursaria uma faculdade de Biblioteconomia e se tornaria um bibliotecário.

Terminado o Ensino Médio conseguiu seu primeiro emprego, mas o desejo de ingressar em uma universidade pública não foi abandonado. Depois de quatro anos de carteira assinada e poucas perspectivas de crescimento pediu demissão e ingressou no pré-vestibular, Oficina do Saber, da Universidade Federal Fluminense (UFF). Nesse período estudou, conheceu novas pessoas e mudou sua visão de mundo.

Prestou o vestibular e conseguiu aprovação em dois cursos de universidades públicas do Rio de Janeiro: Biblioteconomia e História. Talvez se pudesse fazer essa escolha hoje teria optado pelo curso de História na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), mas como não tinha condições de fazer as duas graduações ao mesmo tempo escolheu cursar Biblioteconomia e se matriculou na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).

Ainda no período em que frequentou o pré-vestibular desenvolveu a ideia de coletivo. Como uma forma de retribuir o que o Oficina do Saber fez por ele, assim que ingressou na universidade retornou ao pré, mas dessa vez como colaborador, organizou a biblioteca fechada há anos e na maioria das vezes subutilizada como um depósito de livros.

Nos primeiros períodos da graduação, conforme muitos calouros, logo ficou deslumbrado com a universidade e prontamente acreditou no discurso de alguns professores de que a “Biblioteconomia é a profissão do futuro”, “Só fica desempregado quem quer”, “Somos os guardiões do conhecimento”, “É só passar em um concurso público que a vida está garantida” etc.

As ofertas de estágios na Biblioteconomia eram boas e com remunerações tentadoras. No segundo período a Uerj cruzou seu caminho pela segunda vez ao conseguir o primeiro estágio na Biblioteca Central do campus de São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro. Nessa experiência inicial começou a entender as dificuldades que atravessam as bibliotecas universitárias com a escassez de verbas e os períodos intermináveis de greves e paralisações.

À medida que avançava no bacharelado em Biblioteconomia foi adquirindo conhecimento e começou a postular uma oportunidade melhor de estágio. Durante a sua adolescência estudou violão clássico e teoria musical com seu tio violonista e foi através deste conhecimento que conseguiu uma oportunidade de estágio na Divisão de Música e Arquivo Sonoro da Fundação Biblioteca Nacional (FBN). Adorava ficar entre as partituras do período imperial brasileiro e fazer Análise Bibliológica das riquezas documentadas no acervo da divisão.

Foram dois anos de estágio na Biblioteca Nacional do Rio em que aprendeu mais sobre a área, vivenciou as dificuldades de uma instituição pública em preservar a memória do país e no fim além do aprendizado guarda consigo uma declaração timbrada da FBN como agradecimento pelos serviços prestados.

Assim como muitos universitários, Alfedo Dantas, já não aguentava mais os períodos finais da graduação em Biblioteconomia e contava os dias para entregar a monografia e se formar. Finalmente em 2011 se formou com direito a emoção e discurso de homenagem a professores na cerimônia de formatura.

Ao ingressar na selva de pedra que é o mercado de Biblioteconomia, Alfredo, teve suas primeiras experiências como profissional fazendo consultorias em uma empresa privada que organizava e higienizava acervos. Depois dessa experiência inicial continuou estudando e ingressou no mestrado.

Ainda não satisfeito somente com o mestrado, resolveu fazer sua segunda graduação. Foi dessa vez que a Uerj cruzou seu caminho pela terceira vez ao ser aprovado na prova de aproveitamento de estudos ingressou no curso de Jornalismo da Faculdade de Comunicação Social da Uerj.

Todos os dias ao cruzar os corredores da Uerj, Alfredo Dantas, sente na pele o descaso com a Universidade. O pacote de maldade do governador Pezão atinge em cheio toda comunidade acadêmica e pelo que tudo indica os professores estão sendo empurrados pelas condições precárias de trabalho a aderirem uma nova greve.

Por um instante, Alfredo, lembra os conselhos dos seus pais e do seu tio: “para ser alguém na vida é preciso estudar”, mas quando olha para a realidade ao redor percebe que a educação pública desse país caminha a passos largos para o desmantelamento e agoniza como um peixe sem oxigênio no Rio atingido pela lama da corrupção de anos e anos.

Mesmo em um cenário adverso, Alfredo Dantas, segue o seu caminho e o sinal aponta vermelho no fim da linha. Parece que voltou a viver como há dez anos atrás…..

Comentários

Comentários