O profissional bibliotecário promete tudo fazer para preservar o cunho liberal e humanista de sua profissão, garantindo acesso à informação, fomentando a pesquisa, incentivando a leitura, instigando o seu público a aprender mais, a saber mais. E o saber, seja ele de natureza científica ou não, requer dedicação: inspira o prazer pelo contato com o novo.

Com o advento das tecnologias informacionais, o bibliotecário tem conseguido expandir sua área de atuação, potencializando sua formação, ocupando novos espaços no mercado; atualmente, esse profissional trata a informação e a disponibiliza com mais rapidez, desenvolve novas competências e habilidades, se identifica com outros nichos de mercado.

É necessário pensar além do óbvio e ultrajar-se de novos aprendizados e conhecimentos, deixar de lado pensamentos engessados e métodos “ultrapassadas”. Assim destaca Farias (2015, p. 107): “libertar-se de ideias conservadoras e estáticas, para poder sentir as demandas de um grupo”. Existe uma máxima que induz as pessoas a pensarem fora da caixa, e se fizermos o inverso? Possivelmente irá surtir um resultado mais concreto.

Todos os dias as nossas competências e habilidades são testadas e quase sempre não percebemos. Liderar uma biblioteca aparentemente pode ser uma missão simples, mas o fluxo de usuários, ações dentro e fora das paredes (aos que se propõem) e administrar inconsistências cotidianas requer, sim, um perfil empático, criativo, inovador, humano e empreendedor. A biblioteca é um ambiente interativo, perigoso e de impacto; se não está sendo, torne-a, você é capaz.

Contudo, o perfil do bibliotecário não obedece a regras gerais: a iniciativa e o protagonismo assumido por este profissional configuram uma escolha, uma decisão pessoal. Enquanto agente disseminador da informação, cabe ao bibliotecário atentar-se à necessidade de expandir sua função pedagógica, formadora. Segundo Manhique (2014), esse cenário exige a transformação do perfil do bibliotecário que deve ser informacionalmente competente e dominar as habilidades necessárias para a realização da pesquisa.

O cunho liberal e humanista da profissão oportuniza, por si só, o desenvolvimento do pensamento crítico e autocrítico do ator, bibliotecário. Nesse sentido, se espera deste técnico, em linhas gerais, uma sede insaciável pelo desenvolvimento de novas competências que são, naturalmente, inerentes ao exercício desta profissão; na contramão, o bibliotecário que se entrega ao marasmo se permite quebrantar a imagem do profissional disseminador da informação como um todo.

Cabe ao profissional bibliotecário, portanto, e correndo o risco de soar como discurso do método, acompanhar os avanços tecnológicos, científicos, educacionais nos quais pode atuar, de maneira a garantir que novas práticas alvissareiras abram as portas para a ocupação de espaços nunca antes facilitados para a atuação e/ou implantação de atividades inerentes a unidades de informação.

Entre velhos e novos hábitos, é questionável qual o perfil ideal para liderar uma biblioteca nos dias atuais e vindouros. Destarte a teoria, sobrepondo a exigência do mercado, ora sucumbe às necessidades temporais (avaliação do MEC), ora reconhecendo o papel essencial da profissão.

No atual cenário econômico e social, é necessário que os profissionais tenham competências transversais (soft skills), estas diretamente ligadas a um compilado de habilidades (criatividade, inovação e engajamento), não acadêmicas e críticas. As competências técnicas (hard skills) dizem sobre a formação acadêmica e experiência profissional; nesta última, não há garantias de que o ator seja um bom líder. Diga-se então: “Ninguém nasce líder”.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma pandemia é “a disseminação mundial de uma nova doença”. Outrossim, arriscamos afirmar nestas linhas que verificamos entre a categoria uma espécie de pandemia; embora não saibamos exatamente desde quando, uma “cultura”, uma “transgressão” no tocante ao disposto no artigo 6º., parágrafo 3º. do Código de Ética e Deontologia do Bibliotecário parece ganhar força, uma vez que a redação desta Resolução prevê que cabe a este profissional “estimular a utilização de técnicas atuais objetivando a excelência da prestação de serviços ao usuário”.

Ora, para que haja estímulo é necessário que o agente da ação tenha afinidade com a atividade (seja ela meio ou fim) que deseja repassar, disseminar, fomentar. Dito isto, vêm a reflexão: se o bibliotecário cultiva em seu ambiente de trabalho a preguiça de pesquisar, a estagnação, a procrastinação, como pode ele estar preparado para tratar as demandas, cada vez mais exigentes, de seu público alvo?

Pensando mais um pouco, aprofundarmo-nos nos conceitos dos termos aqui elencados se faz indispensável; a preguiça, substantivo feminino, é sinônimo de moleza, lerdeza, desleixo, prostração, morosidade, desmazelo, indolência, mândria, mandria. Citando Confúcio, a preguiça anda tão devagar, que a pobreza facilmente a alcança. Deve ser, portanto, uma “inimiga declarada” daquele que trata a informação, visto que esta última é mutável, dinâmica, versátil.

Igualmente identificada como contraponto ao exercício da tão valorosa profissão de bibliotecário, a procrastinação (o adiamento, a protelação) parece estar “caindo no gosto da freguesia”, virando “modinha”. Do mesmo modo, redundante é a constatação de que há de se considerar que tudo isto pode ter uma causa patológica: o disléxico, por exemplo, pode parecer preguiçoso, mudo, descuidado, imaturo, “não tentando o suficiente”. Segundo dados divulgados pela Associação Brasileira de Dislexia, a lentidão na aprendizagem, a dificuldade de concentração, a reincidência de palavras escritas de forma estranha, bem como a dificuldade de soletrar, podem ser encontradas numa parcela relativamente considerável da nossa população.

Trazendo um neologismo que nos parece adequado, estudamos aqui o marasmo informacional. Segundo o dicionário, marasmo configura “a condição da pessoa que se encontra apática”; ou, “ausência de coragem; prostração”. Em continuação, o marasmo pode ser entendido como o “intervalo em que nada acontece”; pode ser, ainda, a “falta de situações relevantes ou acontecimentos importantes”.

Some-se a isto o estereótipo injustamente desenhado pela sociedade que nos cerca de que o (a) bibliotecário (a) nada faz, embora prometa, por intermédio do juramento, tudo fazer. O arquétipo mal cabe na visão que os profissionais visionários e entusiastas detém: não lhes basta emprestar e devolver livros, diariamente, atrás de seus balcões; estes indivíduos são criativos, protagonistas, o que lhes confere destaque frente às atividades desenvolvidas em suas unidades de informação, alcançando outras frentes de trabalho, outros modos de fazer biblioteconomia.

O marasmo que criticamos nestas linhas pode ser também relacionado ao ato de reduzir a importância da pesquisa, da leitura, da busca pela (apropriação da) informação; engessamento do fazer, preguiça de estudar, resistência ao que pode ser tocado pelo mudar são fatores que, a grosso modo, se pode verificar quando da análise do perfil do profissional bibliotecário avesso às novas competências que se pode desenvolver.

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