O livro “Justiça”, do sociólogo Luiz Eduardo Soares, poderia perfeitamente ser adotado pelas escolas brasileiras, já que o autor evitou propositalmente o “juridiquês” e, dessa forma, construiu uma obra acessível sobre conceitos como: justiça, crime, violência e punição. Além disso, deveria ser leitura obrigatória para quem pleiteia uma vaga no curso de Direito de qualquer universidade.

Um dos temas tratados, o encarceramento de jovens em conflito com a lei, está em perfeita sintonia com o momento em que a sociedade é chamada a dar sua opinião sobre a redução da maioridade penal, muitas vezes em pesquisas que tratam apenas do binômio concordância/discordância, sem discutir a questão com maior embasamento e calcada num senso comum extremamente danoso.

Soares, de maneira didática, traz elementos para uma reflexão mais apurada sobre a temática. Além disso, o leitor tem a oportunidade de entender um pouco mais sobre a aplicação das leis e suas consequências, pois os textos sobre a atuação de nosso sistema judiciário costumam ser pouco convidativos à leitura e as informações obtidas na mídia são, costumeiramente, rasas e construídas de forma a perpetuar a espiral de violência contra uma parte da população que é historicamente a mais atingida – jovens negros e pobres da periferia.

E, para corroborar o didatismo, o sociólogo concebe exemplos em que é possível verificar as fragilidades de nossa atual legislação, tão apartada da realidade que acaba por construir lacunas cada vez maiores entre os encarcerados e egressos do sistema penal e a sociedade.

Em contraponto à justiça redistributiva (para determinado crime uma determinada pena), atualmente em voga no Brasil, Luiz Eduardo Soares propõe a justiça restaurativa. Através dela se desenvolveria uma pactuação entre quem viola a lei, a vítima, a sociedade e o Estado – através das corregedorias de polícia (militar e civil), o Ministério Público e o poder judiciário – num modelo de corresponsabilização.

Essa mudança de perspectiva em que a penalização deixa de ser o eixo central traz para o cerne da discussão a reparação dos danos causados e o entendimento de que não é mais aceitável simplificar um crime nas relações criminoso/vítima em que a ação começaria num indivíduo e se encerraria em outro, assim como causa e consequência costumam afetar mais do que os sujeitos diretamente envolvidos.

“Justiça” provocará reflexões e, provavelmente, causará algum incômodo àqueles desacostumados ao exercício da alteridade. Que a cegueira da justiça, comumente e controversamente citada como prova de sua isenção, não atinja o leitor, até porque o livro ajuda a retirar o manto de invisibilidade jogado sobre um grupo de indivíduos no Brasil.

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