RIO – O sentido dicionarizado do termo restaurar remete ao ato de reparar, restabelecer e ainda reintegrar ou pôr no estado primitivo. É certo que o visitante de um museu, arquivo ou biblioteca deseja observar itens que se aproximem ao máximo de seu aspecto original. A visualização, por exemplo, de que uma obra publicada em 1650 com encadernação típica do século XX ou de uma escultura de 1840 com o brilho de uma estátua adquirida há pouco numa loja podem causar estranheza ao visitante ou pesquisador.
Lidar com a gestão de coleções que passam por processos de restauração caracteriza-se como um problema a ser superado por profissionais gestores de informação. A preocupação tem pleno sentido: os resultados muitas vezes são desastrosos.
Recentemente o site globo.com publicou uma reportagem apontando os maus resultados causados à imagem de Santa Bárbara, exposta na Fortaleza de Santa Cruz da Barra, em Jurujuba, Niterói (RJ). De acordo com o site, a restauração foi considerada “grotesca”, causando indignação a alguns frequentadores do local.
Livros e documentos avulsos também são alvos de verdadeiras aberrações. A falta de acompanhamento adequado e o desconhecimento de práticas e materiais empregados nos procedimentos podem render a descaracterização do item, quase sempre irreversível. Pode-se citar, como exemplo, o distanciamento de tons nas cores (em esculturas), perda de suporte resultante do aparo dos cortes laterais (no caso de encadernação de livros e periódicos raros), acidificação de componentes empregados no restauro (páginas e documentos avulsos).
O despreparo dos interventores é a maior preocupação
Segundo Marcelo Lima, bibliotecário especialista em preservação de acervos e membro da Associação Brasileira de Conservadores e Restauradores de Bens Culturais (ABRACOR), “a preocupação deve anteceder as técnicas de restauro propriamente ditas. É necessário que se entenda o que é a restauração e quais seus objetivos. É muito comum a ideia de que restauração é a renovação de um determinado Patrimônio. Não é”. Marcelo salienta ainda que “a restauração visa devolver as condições físicas e estruturais, ou seja, assegurar que o patrimônio, qualquer que seja, possa estar em condições de fornecer as informações necessárias a quem desejar e ainda garantir sua permanência ao longo dos anos. A restauração não deve se basear em princípios meramente estéticos”. A permanência das características originais também é lembrada nos processos de restauro: “Deve ocorrer com o mínimo de intervenção no original, ser executada com ética, respeito ao Bem e principalmente ao conhecimento”.
Sobre os casos de descaracterizações, o especialista comenta que “quando não há conhecimento teórico-metodológico qualquer intervenção será um erro. Vemos nos noticiários… Não podemos creditá-los na conta de conservadores-restauradores, pois são intervenções executadas por leigos, com boa intenção, mas sem conhecimento. Nestes casos a responsabilidade deve ser dividida com os responsáveis pela guarda desses Bens”.
Para a jornalista e gestora cultural, Patrícia Mentorco, a “questão do restauro está diretamente atrelada à memória social. O ato de restaurar perpassa a lógica do embelezamento estético e pressupõe um compromisso entre o objeto material e imaterial”. Mentorco lembra ainda que “a qualificação vai além de técnicas… ela articula dois saberes: o utilitário e o simbólico”.
Clique aqui para ler integralmente a entrevista de Marcelo Lima que compôs essa reportagem.