Você almeja minhas certezas. Uma fagulha que seja. E te dou minhas dúvidas. Que fará você com as certezas? Escalará montanhas? Derrubará barricadas? Atravessará oceanos a braçadas? São as dúvidas que nos projetam.

Duvide, duvide, então. De si mesmo, mais do que outro. Coma a dúvida, do nascer ao por-do-sol. E, ainda, sonhe com ela, enquanto as estrelas brilham (muitas delas já morreram há milhões de anos). São só eco luminoso. Resíduos.

Eu compartilho contigo a minha aflição de existir. Mas não desejo que você me traga a cura. Eu te ofereço meu silêncio que, embora nada diga, é meu tudo. E transbordo – cântaro que sou – transbordo porque já não caibo em mim. Minha matéria não me suporta. E se você não for louco o suficiente para entrar na minha dança? E se você não for bastante esperto para perceber que é o peixe que contém o mar, que é o pássaro que contém o céu, e não o contrário?

Agora, jamais subestime os loucos. Esses guardam grandes segredos. São mestres do espanto. Não nascemos para o susto cotidiano? Permita assustar-se. E não precisa ser com grandes coisas. Nem com coisas negativas. Abrace o susto mais insignificante como se ali estivesse acontecendo uma grande explosão: o Big Bang. Cada coisa é fagulha daquela explosão primordial. Como não estávamos lá para contemplar, urge que saiamos por aí, abismando-nos. Isso significa recolher os cacos da existência. Estar sempre à beira é, ao contrário do que dizem, bastante positivo. É preciso conviver com o perigo, senão para que viver?

Não me pergunte sobre o sentido das coisas. Esse mundo cretino ilude a gente com explicações. Aprendemos desde crianças a pedir explicações. Nem tudo cabe explicação. Tampouco esse texto. Portanto, não fique querendo pôr sentido em tudo. As coisas estão exaustas disso. Ficam loucas quando perguntamos para que servem. Escute a mudez delas. Contente-se com o fato de que elas existem simplesmente.

Foi a escola, não foi? Foi ela quem obrigou você a arrumar tudo em arquivos conforme os usos. Foram nossos pais, que aprenderam com nossos avós que o mundo existe para ser explicado. Humanidade bobinha! Seja discípulo de Alberto Caeiro: “porque pensar é não compreender… O mundo não se fez para pensarmos nele (Pensar é estar doente dos olhos) Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo. Eu não tenho filosofia: tenho sentidos…” (Fernando Pessoa, O guardador de rebanhos). Isso basta.

Mas voltemos à questão do dar-receber. Eu ofereço a você as minhas incertezas. São o meu presente, o que de mais rico poderia dar. Com elas, espero que você realize grandes proezas.

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