- Por que os ingleses fazem selfies e os chilenos fazem ‘footies’?
- Por que a mídia social é considerada uma distração para a educação na China rural, mas uma ajuda de aprendizagem valiosa no Brasil?
- Por que as mídias sociais não são tão revolucionárias para a política mas têm empoderado mulheres em países como Índia e Turquia?
Estes são apenas alguns dos temas explorados em “Por que postamos”, curso originado de um projeto de pesquisa de mídia social global realizada por uma equipe de antropólogos da University College London
Posts, selfies, memes. Palavras que se fazem cada vez mais presentes no vocabulário do dia a dia de qualquer população do globo com acesso a internet e conta em redes sociais. Hoje, as mídias sociais ganharam relevância incontestável, sendo fonte de novos comportamentos, originando debates, repercutindo fatos e ecoando a mentalidade de uma sociedade. E seus conteúdos variam consideravelmente de região para região, refletindo uma visão de mundo local. Se, para muitos as mídias sociais decretam o fim da privacidade, para os chineses, por exemplo, ela pode ser uma das poucas oportunidades de preservá-la. Na Índia e Turquia, as mídias sociais são utilizadas como instrumento de empoderamento das mulheres, em duas sociedades com forte estratificação de gênero.
Foi na tentativa de verificar como as mídias sociais são entendidas regionalmente que a University College London promoveu a pesquisa Por que postamos (Why we post), sobre os efeitos e os hábitos das mídias sociais no mundo. É a primeira pesquisa comparativa internacional sobre o tema. Os dados da pesquisa serão divulgados em um curso online gratuito que está marcado para acontecer ao longo de cinco semanas a partir do dia 29 de fevereiro.
Além do inglês, o curso estará disponível nas línguas dos países pesquisados, inclusive o português. A pesquisa também vai gerar um site com os resultados, mais de 150 vídeos curtos no Youtube e 11 livros. Todos com acesso gratuito. O curso parte de pesquisa qualitativa em que nove antropólogos da University College London (UCL) acompanharam por 15 meses populações de oito países ao redor do mundo para verificar o impacto das redes sociais em comunidades tão variadas como uma aldeia Inglesa, uma cidade industrial no norte da China, uma comunidade na fronteira turco-síria e um povoado de trabalhadores na Bahia. Cada membro da equipe realizou uma análise aprofundada sobre a forma como as populações locais se comportam e interagem em todos os canais de mídia social e como essas plataformas estão impactando sobre a maneira como eles vivem.
A pesquisa foi realizada a partir de um dos principais centros de pesquisa acadêmica da Europa, a University College London, e dentro do respeitado Departamento de Antropologia dessa instituição, coordenada por um dos mais ativos antropólogos do mundo hoje a pesquisar as mídias sociais, o professor Daniel Miller, autor de 37 livros traduzidos para oito idiomas, entre os quais “Trecos, Troços e Coisas” (Zahar). Dedicado ao estudo da cultura material, atualmente realiza pesquisas em antropologia digital, mídias e redes sociais.
Se, em geral, pesquisas sobre mídias sociais são quantitativas e têm como origem das informações os Estados Unidos e a Europa, neste caso, a pesquisa “Por que postamos” é qualitativa e foi feita em oito países: Inglaterra, Brasil, China, Turquia, Trinidad e Tobago, Chile, Itália é Índia.
O curso vai abordar todos os temas – com apresentação dos dados da pesquisa – e foi elaborado para um público não acadêmico, com apelo especial para publicitários, jornalistas, profissionais de marketing, de pesquisa de mercado, políticas públicas e interessados em mídias sociais e cultura digital. Por meio deste curso, a UCL dispõe para a comunidade resultados de três anos de estudos, estreitando e reforçando o diálogo entre universidade e sociedade. O participante terá a oportunidade de entender como a mídia social é usada para amizade, negócios, educação, romance e comércio e terá uma visão detalhada sobre como as diferentes plataformas sociais são utilizados, de QQ na China para WhatsApp no Brasil, e como elas estão mudando o mundo.
As inscrições já estão abertas e podem ser feitas pelos links:
https://www.futurelearn.com/courses/anthropology-social-media (curso em inglês).
https://extendstore.ucl.ac.uk/catalog?pagename=why-we-post (registro e curso com legendas em chines, hindi, italiano, portugues, espanhol, tamil e turco).
Endereço da página no face: https://www.facebook.com/porquepostamos/?ref=bookmarks
Algumas das principais conclusões do estudo que serão abordadas no curso incluem:
- A mídia social é vista como oportunidade de melhorar a educação por famílias de baixa renda, e como impedimento/distração na educação pelas famílias de alta renda;
- Ao contrário da crença popular, a mídia social não está nos tornando mais individualistas ou narcisistas – ela tem reforçado o senso de família e de comunidade;
- Selfies têm uma interpretação diferente ao redor do mundo: as pessoas fazem ‘footies’ no Chile e selfies mais tradicionais na Itália e no Brasil. Na China, selfies são populares entre os jovens, ao passo que na Índia e na fronteira turco-síria eles são vistos como muito informais para o espaço formal da mídia social;
- A mídia social está tendo um impacto profundo na política de gênero em todo o mundo, especialmente em sociedades altamente conservadoras, como a Turquia, onde, pela primeira vez, homens e mulheres jovens podem ter contato direto uns com os outros;
- Plataformas de mídia social públicas são mais conservadoras do que os privadas: no Facebook, por exemplo, o comportamento tende a ser conservador, e em muitos dos locais de pesquisa, as pessoas evitam postagem com enfoque político. Por outro lado, mídias sociais que garantem mais privacidade, como o WhatsApp, podem ser utilizadas para divulgação de informações com tom político, muitas vezes radical, com objetivo de promover mudanças sociais;
- Igualdade online muitas vezes não se traduz em igualdade off-line: No Brasil, os funcionários podem ter os mesmos smartphones que seus empregadores, mas isso não faz com que sejam amigos e se adicionem em redes sociais.
- São as pessoas que usam a mídia social que a criam, não os desenvolvedores de plataformas: conteúdo, como brincadeiras de jovens estudantes, vídeos engraçados e partilhamento de fotos de bebês e animais vêm de usuários, e não dos criadores de plataformas;
- Memes são consideradas a “polícia moral” da vida on-line: vão desde temas religiosos na Índia a paródias e piadas sobre os políticos em Trinidad e Tobago. Mas, em ambos os casos, memes tendem a afirmar um conjunto de valores e criticar outros. Pessoas que sejam tímidas ou estejam com vergonha de expressar seus próprios valores e opiniões, muitas vezes usam memes;
- Estamos inclinados a acreditar que a mídia social é uma ameaça à privacidade, mas, às vezes, ela pode garantí-la: algumas das maiores populações no leste e sul da Ásia vivem em famílias extensas com expectativas limitadas de privacidade individual. Para essas pessoas, a mídia social pode ser a sua primeira experiência com uma ferramenta que promova sua privacidade.
Ementa do curso Por que postamos:
PRIMEIRA SEMANA: Introdução ao curso e o uso das mídias sociais em uma vila inglesa.
SEGUNDA SEMANA: Impacto da visualidade nos meios de comunicação (o que são e para que servem selfies e memes, o uso da fotografia e imagem para refletir desejos e aspirações em povos tão diferentes) e uso das mídias sociais na Itália e em Trinidad e Tobago.
TERCEIRA SEMANA: Turquia e Índia; os efeitos das mídias sociais em relação a gênero e política.
QUARTA SEMANA: China rural e industrial; censura e privacidade, quais são as plataformas usadas pelos chineses, considerando que eles não têm acesso a Facebook, Twitter e Youtube; o que os chineses pensam sobre censura; na China, a mídia social pode ser uma oportunidade para se ter privacidade .
QUINTA SEMANA: Chile e Brasil; mobilidade social; a redução da desigualdade acontece apenas em relação à conectividade ou há um impacto da internet na vida das pessoas fora da internet?