No dia 21 de março os estudantes do Colégio Estadual Prefeito Mendes de Moraes, localizado na Ilha do Governador, Zona Norte do Rio de Janeiro, ocuparam a escola como forma de protesto frente aos recentes cortes no orçamento da Educação e contra a precarização da escola pública.
Cartaz com as reivindicações do Ocupa Mendes / Fonte: Página da ocupação no Facebook
Desde essa data, os estudantes estão nas dependências da escola organizando atividades de greve e ocupação. Segundo Alan Fernandes, a ideia de ocupar a escola surgiu na metade do mês de fevereiro quando os alunos começaram a se manifestar devido à falta de climatização nas salas de aula e a extinção dos cargos de porteiros, inspetores e seguranças. “Partimos para uma ação direta com a ocupação para chamar atenção do governo estadual para o que está acontecendo”, destaca o estudante de 18 anos.
As atividades da ocupação
A equipe da Revista Biblioo foi até à escola Mendes de Moraes na tarde do dia 29 de março para conhecer mais a respeito deste movimento e das reivindicações dos alunos.
Os estudantes estão divididos em comissões em que cada um é responsável por uma tarefa. O controle do portão de entrada, a limpeza da escola e o desenvolvimento das atividades da ocupação, tudo ocorre de forma organizada e sempre prezando pelo bem estar da escola.
Segundo Andreh Luiz, aluno do 1º ano do Ensino Médio, dentre as atividades desenvolvidas pela ocupação estão as oficinas de grafite, as rodas de capoeira, o futebol, as aulas de hidroginástica, atividades culturais, assembleias de alunos e as aulas públicas.
Na tarde da quarta-feira (29) foi realizada uma aula pública de Geopolítica ministrada pelos universitários Bruna Aguiar, Matheus Tavares e Guilherme Bottino.
Aula pública ministrada por universitários / Foto: Hanna Gledyz – Agência Biblioo
Bruna Aguiar destacou que o atual sistema educacional não incentiva os alunos e a intenção dos aulões na ocupação é a de ampliar os horizontes dos estudantes. “Um sistema educacional que não incentiva os alunos e precisa ser derrubado, através das aulas podemos abrir os horizontes e ampliar o pensamento dos alunos”, ressaltou a aluna de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Matheus Tavares, ex-aluno do Mendes de Moraes e recentemente aprovado para cursar Geografia na UFRJ, destacou que na aula pública procurou contar um pouco de sua trajetória. Ele criticou o pouco uso da estrutura da escola e demonstrou seu apoiou a ocupação dos estudantes. “Estudei nesta escola por quatro anos, nunca entrei na piscina, só tive uma aula no laboratório de informática e tem uma sala de dança em que a maioria nunca utilizou. Apoio a ocupação e estou aqui para ajudar os alunos”, comentou o aluno de Geografia da UFRJ.
Guilherme Bottino enfatizou a importância de passar a experiência de aprovação para cursar uma universidade pública para os alunos da ocupação. “Estou aqui ajudando a ocupação, passando o meu exemplo para mostrar que mesmo com as dificuldades é possível ingressar na universidade”, destaca Bottino que foi aprovado recentemente para cursar a graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense (UFF).
A biblioteca livre
O Colégio Prefeito Mendes de Moraes possui uma excelente estrutura, mas os alunos reclamam que a mesma não está disponível e o uso é pouco incentivado pela diretoria da escola.
Além de piscina e quadra poliesportiva, a escola possui um auditório grande, refeitórios, laboratório de informática, uma sala de dança em boas condições, mas por outro lado, a biblioteca da escola não possui bibliotecário e não fica aberta durante os três turnos, o laboratório de informática e a sala do grêmio estudantil estão fechados e com pilhas de livros didáticos.
Sala do grêmio estudantil fechada e amontoada de livros didáticos / Foto: Hanna Gledyz – Agência Biblioo
“Eu nunca entrei na biblioteca. A biblioteca funciona no período da manhã, às vezes no da tarde, mas os alunos da noite dizem que ela não fica aberta”, destacou Ana Clara, 16 anos, aluna do 2º ano do Ensino Médio.
Biblioteca não atende todos os turnos da escola / Foto: Hanna Gledyz – Agência Biblioo
No contexto em que a Lei 12.244/2010, que dispõe sobre a universalização das bibliotecas nas instituições de ensino do país, está prestes a completar dez anos de vigência, o cenário na escola Mendes de Moraes não é animador. Nos fundos da escola, atrás da sala do arquivo permanente, existe um verdadeiro lixão com restos de carteiras escolares, livros didáticos jogados ao tempo, um verdadeiro descaso com o patrimônio público.
Livros didáticos e materiais escolares abandonados / Foto: Hanna Gledyz – Agência Biblioo
Cansados de esperar uma solução, os alunos da ocupação decidiram criar sua própria biblioteca e a denominaram como biblioteca livre. Colocaram uma mesa no corredor do primeiro andar e disponibilizaram livros para consulta. Além de romances de Zelia Gattai e Agatha Cristie, têm livros de história de autoria de Boris Fausto, o Cortiço de Aluisio Azevedo, entre outros.
“Montamos o projeto da biblioteca livre em que as pessoas levam e leem o livro a vontade”, ressalta a estudante Ana Clara.
Projeto biblioteca livre organizado pelo Ocupa Mendes / Foto: Hanna Gledyz – Agência Biblioo
Precarização da Educação
O cenário atual da Educação carioca é caótico. Com diversos cortes no orçamento, os reflexos da recessão afetam diversos setores e principalmente as condições de trabalho dos servidores e professores.
Os professores da rede estadual de ensino estão em greve desde o dia 02 de março. Os técnicos administrativos, servidores e professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) também estão em greve desde o dia 07 de março.
Até o momento duas escolas públicas do Rio estão ocupadas por alunos, a primeira foi o Mendes de Moraes e a segunda é o Colégio Estadual Gomes Freire de Andrade, localizado no bairro da Penha, Zona Norte do Rio.
A secretaria estadual de Educação do Rio insiste em não dialogar com o movimento grevista e muito menos com as ocupações de alunos. Em entrevista coletiva na tarde de segunda-feira (28), o secretário estadual de Educação do Rio, Antonio Vieira Neto anunciou que vai entrar com ação judicial de reintegração de posse no Colégio Mendes de Moraes.
Ao invés de procurar o diálogo e ouvir as reivindicações dos secundaristas, o secretário preferiu partidarizar o caso alegando que o Ocupa Mendes está recebendo apoio do movimento grevista dos professores, de representantes de movimentos estudantis da Uerj, da UFRJ, do Movimento dos Sem Terra (MST) e de partidos da esquerda e de extrema esquerda.
Os alunos do Ocupa Mendes continuam resistindo e acreditam que o movimento de ocupação deve se espalhar para outras escolas. “Todo apoio as ocupações porque vai ter mais e estamos lutando também por aqueles que são contrários a ocupação”, ressaltou a estudante Susane Whitehead.
Estudantes do Ocupa Mendes / Foto: Hanna Gledyz – Agência Biblioo