Diante de tudo o que nos tem acontecido desde o início da pandemia, é surreal (para ser cavalheiro) ver como o governo federal tem se portado frente a maior crise sanitária e econômica da história do Brasil pós 1889. Não obstante, os inúmeros problemas que temos enquanto nação (flagrante desigualdade social, racismo, misoginia, xenofobia dentre outras mazelas), o mal maior chamado corrupção não é extinto do centro do poder, seja no âmbito nacional ou em diferentes entes da federação.

Minhas caras e meus caros, vivemos tempos estranhos neste país tropical, abençoado por deus e bonito por natureza. Tempos esses em que pensei que fosse tema de um livro, ou de um filme distópico, porém, jamais viver. Tempos em que o que parece ser correto é apontado como erro, e o que parece ser flagrantemente fora dos padrões de honestidade, lógica e bom senso, é elevado à categoria de um padrão a ser seguido.

O desgoverno do presidente Jair Bolsonaro, sem medo de incorrer numa injustiça, é o pior governo que já tomou posse neste país, e olha que eu já publiquei neste periódico inúmeros textos tecendo críticas aos últimos governos. De forma completamente amadora, o governo não tem noção do que fazer com o país, frente, repito, a maior crise sanitária e econômica que já vivemos em tempos republicanos.

Diversos quadros que compõem o governo, não raro, estão no seu primeiro emprego (sabe como é, são amigos dos meninos, no país que extinguiu a mamata). Como não bastasse os novatos, no que tange ao trabalho, centenas (aos milhares) de militares resolveram cruzar à rua, para ocuparem cargos oferecidos pelo presidente que adora se arvorar de bom militar, mas que tem uma péssima reputação no meio, por ter sido insubordinado e ganancioso, acreditando que iria enriquecer na força.

Talvez só os bons militares consigam enxergar isso! Além dos “amigos dos meninos” que ocupam cargos no governo federal, diversos ministérios estão infestados de agentes que vestem verde oliva, azul marinho e branco mar. Os militares foram atraídos pelo Jair, pelo pseudo projeto de Jair, pela grana que fora oferecida pelo Jair.

Muitos brasileiros acreditaram que os militares fariam um bom trabalho nos ministérios, devido ao senso de patriotismo que emana das forças (ou pelo menos nos lemas das forças), e pela reputação militar que sempre gozou de larga aprovação na sociedade. Entretanto, o castelo de cartas começou a balançar com o ingresso do general Pazuello como ministro efetivo do Ministério da Saúde.

Apresentado como um fenômeno em logística, Eduardo Pazuello já teve sua expertise contestada quando um carregamento de insumos enviado pelo Ministério da Saúde para Manaus, capital do Amazonas, foi parar em Macapá. Lógico que, uma vez questionado sobre o ocorrido, o ministro atribuiu a culpa a um funcionário do ministério, claro!

Desde que assumiu o Ministério no ano passado, Eduardo (que não é o general de três estrelas da música do Legião Urbana), teve uma atuação, digamos, suspeita, para dizer o mínimo. Em diversas vezes ele se posicionou de forma não muito clara sobre a compra (reserva) de vacinas, assinou um contrato com o Instituto Butantan para obtenção da CoronaVac de manhã, e foi desautorizado pelo presidente na tarde do mesmo dia. Não obstante, questionado se o ministério compraria ou não vacinas, disse que não havia pressa para a compra, e que o ministério faria isso se houvesse demanda; tudo isso em meio a maior pandemia em um século.

Se não bastasse o que fora supracitado, Pazuello ainda demorou, enquanto ministro, para viabilizar testes para o país, testes que foram comprados em números insuficientes para atender a população, e que tiveram suas datas de validade alteradas para que o Brasil não tivesse prejuízo, pois os testes que deveriam estar nos postos de saúde atendidos pelo SUS, estavam em um depósito do Ministério da Saúde em Guarulhos/SP.

A gestão de Pazuello foi marcada por inúmeros acontecimentos negativos. Não há o que se aproveitar da desastrosa passagem do general da ativa pelo ministério mais importante em tempos de calamidade sanitária. Quando Pazeullo assumiu o Ministério, o Brasil contava oficialmente 14.962 pessoas mortas pela Covid-19, e quando o general deixou o cargo, eram 295.425 óbitos em decorrência do vírus. Como se vê, a passagem do general de divisão do Exército brasileiro foi desastrosa, se bem que cabia outra palavra!

Mortes, C.P.I. e militares

Devido ao alto número de mortes no Brasil por conta da pandemia, e a letargia do governo federal em solucionar questões já superadas em diversos países, o Senado Federal instalou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar se houve ação ou omissão por parte do governo federal em relação à pandemia, sobretudo o caos que ocorreu em Manaus (AM), em janeiro último.

Seguindo negacionistas aqui, remédios ineficazes no combate ao Covid-19 acolá, à CPI encontrou fortes indícios de corrupção nas negociações para a compra de imunizantes. Militares da ativa e da reserva, que ocuparam postos no Ministério da Saúde, foram apontados como participantes de esquemas bilionários de corrupção. Enquanto vidas são perdidas pela ação do vírus (e meu pai foi uma dessas vidas que se foi), larápios agindo na surdina tentaram assaltar o erário público.

Durante a gestão Pazuello no Ministério da Saúde, o general nomeou nove militares para cargos em comissão, dentre eles estava o coronel Elcio, que vez por outra tem seu nome declinado na CPI. Foi também na gestão do ex-ministro e general da ativa, que a Pfazer fez mais de 50 tentativas de contato com o governo brasileiro, oferendo vacinas. Foram precisos mais de 300 dias para que o governo do Brasil fechasse contrato com a epresa, o que não aconteceu com a Precisa, que precisou (não resisti ao trocadilho) de menos de 200 dias para ter tudo acertado, só que “faltou combinar com os russos”.

Durante à pandemia, o governo federal conseguiu elevar os salários do presidente e vice presidente, bem como dos ministros, deu vantagens financeiras aos militares com verbas que eram destinadas ao combate à pandemia. Ainda durante o período pandêmico, hospitais militares vazios se recusaram a receber pacientes civis; militares fizeram compras volumosas de cervejas, carnes de primeira, chicletes e leite condensado, além de Pazuello, Blanco, Elcio…

O presidente da CPI, o senador Omar Aziz, disse, no último dia 07, em outras palavras, que os bons militares devem estar com vergonha de ouvir falar de militares envolvidos com possíveis esquemas de corrupção, e que há muito tempo não se ouvia falar de militares envolvidos com coisas erradas. Acusando o golpe, parafraseando o velho Brizola, os comandantes das três forças assinaram uma nota conjunta com o ministro da defesa general Braga Neto, repudiando a fala de Aziz, e, só para não perder o costume, ameaçando um golpe nas entrelinhas.

Aqui eu deixo minha solidariedade ao senador Omar Aziz. Não há nada na fala do senador que seja dirigido às Forças Armadas, pelo contrário, se o português desta gente estivesse em dia, eles deveriam agradecer ao senador por reforçar que os maus das Forças Armadas estão dando péssimo exemplo. O senador separou os maus do resto da força, mas, pela virulência da nota emitida pelo ministério da defesa, parece que não se pode falar dos maus das forças armadas.

Foram vocês que atravessaram à rua para assumir boquinhas dadas pelo Planalto. Foram vocês que ignoraram que milhares de militares estavam ocupando cargos civis no governo. O presidente já fez diversas ameaças de golpe, vive falando mal do STF, de parlamentares, do TSE, e não vemos manifestações do Ministério da Defesa. Um general da ativa participou de um comício ao lado do presidente, alegou que o presidente não tinha partido, logo aquilo não poderia ser ato político, e ficou por isso mesmo; ridicularizando o regimento interno da força.

De resto, é preciso lembrar que foi a sociedade civil que resolveu criar às forças armadas, para que elas protegessem a sociedade em geral. Não foi para ficar lendo e/ou ouvindo ameaças de golpes amiúde que a sociedade brasileira resolveu criar e manter o Exército, a Marinha e a Aeronáutica. Colocam-se no seu devido lugar constitucional e não se misturem com à política; deixe à política para os civis! E para finalizar, não há quem mais perturbe a ordem institucional hoje no Brasil do que o presidente da República; que tal mandar uma nota lembrando ao presidente do seu papel constitucional?!

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