Um concurso para professor titular do Departamento de Informação e Cultura da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), realizado no último dia 5, tem gerado polêmica entre estudantes, professores e outros profissionais. Isso porque o resultado final da disputa consagrou como escolhido a ocupar a vaga Eugênio Bucci, que é professor do curso de jornalismo, em detrimento de Marilda López Ginez de Lara, professora e pesquisadora em biblioteconomia e em ciências da informação, ambos da ECA/USP.

Além da vinculação profissional com os temas do departamento para o qual os candidatos concorriam, ou seja, o Departamento de Informação e Cultura (na área de Informação e Cultura), também está sendo questionada a própria previsão estatutária.  De fato, uma portaria da ECA estipula, entre outras coisas, que os candidatos devem ter, no mínimo, 5 anos como livre-docente para pleitear a progressão para professor titular.

Marilda está como livre-docente desde 2009 no Departamento de Informação e Cultura (Curso de Biblioteconomia e Documentação – CBD), enquanto Bucci exerce a livre-docência desde 2014 no Departamento de Jornalismo e Editoração (Cursos de Jornalismo e de Editoração – CJE), ambos na ECA/USP. Pelos critérios Bucci não estaria apto a concorrer ao cargo, pois teria apenas três anos como livre-docente, ao contrário de Marilda, que está há oito anos na função. Mas mesmo sem tempo de atuação que lhe habilitasse a concorrer ao cargo e sem produção na área, o professor ficou com 8,67 pontos, atrás da candidata que obteve 9,33 pontos.

Assim, na decisão da banca Bucci obteve três dos cincos votos, desbancando Marilda, a despeito da maior pontuação da professora. Votaram pela indicação do professor o presidente da banca do concurso, Martin Grosmann, além de Waldomiro Vergueiro, ambos professores do CBD/ECA, e Emir José Suaiden, professor da Universidade de Brasília (UnB). Henriette Ferreira Gomes, professora titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Vera Lucia Doyle Louzada Dodebei, professora titular da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) indicaram Marilda.

Por meio de um manifesto divulgado no Facebook, os alunos de graduação do curso de biblioteconomia demonstraram preocupação com o concurso. “Temos percebido ao longo dos últimos anos a fragmentação do ensino no CBD em disciplinas, cujos conteúdos de aula variam de acordo com a formação dos docentes. Muitos não dialogam com a área de ciência da informação e se tornam irrelevantes para a nossa formação como profissionais da informação. Por isso, nos preocupa a participação no concurso para titular do CBD de docente de outro departamento da Escola, cujo currículo não revela familiaridade com a área, seja pelos projetos de pesquisa ou pelas atividades desenvolvidas no ensino de graduação e pós-graduação”, protestaram os estudantes.

“Queremos que o julgamento de títulos e a prova de erudição tenham como base critérios de mérito pertinentes ao campo de atuação do Departamento […] Contamos com a empatia e apoio de todos os ecanos: discentes, docentes e funcionários. O CBD – Departamento de Informação e Cultura merece professores titulares comprometidos com a área!”, defenderam.

Para Asa Fujino, professora do curso de biblioteconomia e documentação da ECA/USP, o “capital científico ganhou, mas não levou”. “Triste quando os próprios colegas, formados no PPGCI-USP [Programa de pós-graduação em ciência da informação da USP], contribuem para a fragmentação da área. Inaceitável é a traição e mais pavorosa a submissão de um Departamento de ensino e pesquisa”, desabafou ela em sua conta no Facebook.

“É vergonhoso o que está acontecendo no Departamento de Biblioteconomia e Documentação da USP! Como uma pessoa que fica em segundo lugar, que não tem relação nenhuma com a Biblioteconomia, nunca orientou um trabalho ou produziu algo na área ganha de uma professora com uma trajetória exemplar como a Marilda, que é referência na área de Biblio!”, criticou a bibliotecária Luciana Santoni também no Facebook.

Para o bibliotecário William Okubo, que foi estudante da USP, a entrada de um jornalista como professor titular não necessariamente é incorreta.  Mas, segundo ele, nesta situação específica foi um erro histórico. “A entrada de outros profissionais no Departamento não é ruim, é necessária, mas não no lugar onde os profissionais da área devem ter um papel mais importante, ou pelo menos com maior representação”, disse ele.

Procurada pela Biblioo, a professora Marilda preferiu não se pronunciar. Também procuramos o chefe do Departamento de Informação, professor Luiz Augusto Milanesi, para comentar o caso, mas até o fechamento desta matéria não havíamos tido resposta. Não conseguimos contato com o professor Bucci.

*Matéria atualizada em 21 de junho para corrigir informações

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