RIO – Renato Cinco, sociólogo e ativista político, fala sobre a ocupação na Cinelândia e da discussão de temas que ainda são tabus na sociedade brasileira, como a legalização da maconha, por exemplo.

Rodolfo Targino: Renato, em manifestações como essa, qual a importância em se discutir temas que ainda são tabus na sociedade?

Renato Cinco: Eu acho muito importante. Esse acampamento deliberou duas bandeiras fundamentais: uma é a luta contra o capitalismo e a outra é a luta por uma democracia real. Ambos os casos a discussão, sobre a maconha e sobre as drogas, está intimamente ligada. A proibição das drogas é um instrumento do capitalismo para perseguir determinados grupos. A história da proibição das drogas começa com a história da perseguição dos mexicanos e dos chineses nos Estados Unidos e com a perseguição dos negros no Brasil. Até hoje, se analisarmos como funciona efetivamente a guerra as drogas, você observa que não existe uma guerra as drogas, existe uma guerra aos pobres que é disfarçada de guerra as drogas. Porque os crimes de drogas são entre, os ricos, os pobres e a classe média, mas a classe média e os ricos no máximo sofrem a extorsão da polícia. Quem vai para a cadeia e para o necrotério são os pobres; efetivamente são presos ou mortos.  Não podemos interpretar dessa maneira, porque se pensarmos a guerra às drogas do ponto de vista e nos objetivos de quem defende essa guerra para a proteção da saúde das pessoas, é um fracasso total. Temos que encontrar outra explicação, por que esse fracasso total continua sendo uma política dominante e o porquê os principais estados do mundo e os Estados Unidos fazem questão de manter a proibição. Não vamos encontrar a resposta na questão da proteção da saúde das pessoas. A resposta vai ser encontrada quando percebemos que a guerra às drogas é um pretexto para a guerra aos pobres. Um instrumento de criminalização. Então esse debate certamente tem que estar presente em qualquer discussão na construção de uma sociedade que seja anticapitalista e democrática.

R. T: O filme Cortina de Fumaça do Rodrigo Mac Nivem está contribuindo para que esse debate seja mais efetivo. Você foi candidato a Deputado Federal nas últimas eleições. Como você enxerga essa discussão na Câmara dos Deputados e no meio político?

R. C.: Aqui no Brasil a situação ainda está muito ruim. Tanto a opinião pública, como a opinião dos parlamentares é amplamente contrária a mudança da lei. O Instituto Gallup todo ano faz a pesquisa de opinião dos americanos sobre a legalização. Em 1969, 84% dos estadunidenses eram contrários a legalização, hoje 52% das pessoas são a favor da legalização. Isso prova que a mobilização e o debate podem mudar a opinião pública aqui no Brasil também. Mas acho que está virando… Se compararmos a situação desse debate hoje com a situação do ano de 2002 quando aconteceu a primeira marcha da maconha, já podemos considerar que nessa década pelo menos conseguimos fazer a sociedade discutir esse assunto. Acredito que não em muito tempo conseguiremos reverter à opinião da população brasileira. Mas não é só uma questão de reverter à opinião, temos que mobilizar, lutar, fazer manifestações e a marcha da maconha, agora aqui no Rio, em 18 de novembro vamos fazer uma segunda manifestação: o dia pela legalização da maconha.

R. T.: Atualmente o senso comum e a grande mídia afirmam que a juventude está cada vem mais alienada e despolitizada. Manifestações como essa comprovam o contrário. Qual a sua opinião sobre isso? Como você enxerga a juventude atualmente?

R. C.: A última década no Brasil pode ter sido a década com menos mobilização social; talvez desde o início da república, ou antes até, da época da luta pela libertação dos escravos. O que estamos vendo hoje, aqui na Cinelândia, as greves das obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), dos correios, dos bancários, lutas estudantis, acredito que seja uma sinalização de que estamos começando a sair da situação anterior. Eu ainda não sou otimista a ponto de achar que agora vamos ter no Brasil aquilo que está acontecendo nos Estados Unidos e na Europa. Por uma simples razão o olhar, a percepção da população dos Estados Unidos e da Europa sobre os governos é muito pior do que a população do Brasil tem do governo da Dilma. Nos Estados Unidos o presidente Obama tem 30% de aprovação, a Dilma tem 70% de aprovação. Isso dificulta que o movimento de contestação daqui tenha a mesma abrangência de lá. Isso acontece não porque o povo brasileiro esteja vivendo bem ou pelo fato de o governo está distribuindo renda. Não é nada disso! A situação do povo brasileiro chegou a um ponto tão ruim, em que as medidas assistencialistas ganham as pessoas para o governo. Você ter 11 bilhões de reais para bolsa família. Isso não significa nada perto dos 650 bilhões entregue para os bancos. Mas para aquela população pobre e sofrida que ganha em torno de R$ 70,00 a R$ 100,00 por mês do bolsa família, é uma mudança muito grande na vida delas. Então faz com que acabe apoiando o governo de uma maneira muito apaixonada. Espero que o povo brasileiro possa avançar em sua consciência sem sofrer reveses econômicos, mas é difícil isso acontecer. Em geral o que coloca o povo na rua são os problemas econômicos. Na África foi à hiperinflação, nos Estados Unidos e na Europa são os problemas de crédito da classe média, os problemas das pessoas perdendo suas casas. Isso coloca efetivamente as pessoas na rua, até hoje tem sido assim.

R. T.: Qual a mensagem que você deixa para a juventude que está saindo às ruas e indo a luta?

R. C.: O caminho é esse: é a mobilização. O Brasil só muda de baixo para cima na porrada, sem nenhuma dúvida disso. Quem está em cima não quer mudar e vai usar de todos os meios, inclusive a violência, para se manter no poder, para manter as coisas como estão. Então o povo tem que aumentar o seu nível de organização e de consciência para ele poder lutar a luta de classes e entender as contradições entre o capital e o trabalho, lutar ao lado do trabalho e da grande solidariedade dos trabalhadores do mundo.

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