“Não é possível apagar a dimensão política da atividade em sociedade, que é um contexto típico de polarização. Mesmo se quiséssemos, não poderíamos deixar de ser “animais políticos”, no sentido de estarmos sempre influenciando e sendo influenciado, num vaivém que especifica a sociedade como contexto de conflito dialético, prenhe de complementariedades e antinomias, na unidade de contrários. É por isso que se ausentar é uma forma de estar presente, como muitas vezes se faz a cena saindo dela. Ou muda-se para manter.” (DEMO, Pedro. Ciência, ideologia e poder: uma sátira às Ciências Sociais. São Paulo: Atlas, 1988. p. 84).

Neste ano de 2017 o carnaval teve um pouco de tudo: foram acidentes na Marquês de Sapucaí e prefeito que não apareceu para coroar o Rei Momo, no Rio, recorde de pessoas nas ruas atrás de milhares de blocos, e um coro que se fez ouvir de Norte a Sul, na montanha ou a beira mar, no asfalto ou fora dele; me refiro aos inúmeros momentos que, em meio aos festejos momesco, ouvia-se o já famoso: “FORA, TEMER!”.

Muito se diz por aqui (Brasil), que o brasileiro nunca reclama, que não corre atrás dos seus direitos, que é um povo passivo, e que só gosta de farra. É, ouve-se isso sim, e muito mais. Não sem razão (digamos), mas com um certo exagero, haja vista que a população brasileira, mesmo antes de se entender como povo brasileira, promoveu várias revoltas contra o que achavam ser desmando e/ou abuso de poder por parte do governo. Isso nos é apresentado pela história oficial deste país.

De uma forma mais intensa do que de outros anos, de 2013 pra cá a população brasileira esteve sempre envolvida em protestos, manifestação, atos contra alguma coisa, ou alguém. Seja de forma eletrônica ou mesmo ocupando as ruas, sempre se via uma parcela da população se manifestando (e por vezes uma parcela bem significativa). Essas manifestações sempre estiveram presentes em vários momentos do ano, mas no carnaval não se divulgava tanto.

Em 2013, ativistas ocuparam a Esplanada dos Ministérios (Brasília - DF) e centenas deles subiram a rampa e no teto do Congresso Nacional.

Em 2013, ativistas ocuparam a Esplanada dos Ministérios (Brasília – DF) e centenas deles subiram a rampa e no teto do Congresso Nacional.

Lembro do carnaval de 2014, quando eu e uns amigos estávamos no bloco “Boi Tatá”, em um domingo de carnaval pela manha, na cidade do Rio de Janeiro. Algumas pessoas estavam fantasiadas de “vigas de sustentação da Perimetral”, fazendo alusão as vigas que de fato sustentavam parte do antigo elevado que fora demolido por canto das obras de revitalização da zona portuária da cidade, e que simplesmente desapareceram, sem deixar rastros. Essas vigas, segundo palavras de um especialista no assunto, eram a “fina flor da siderurgia”, tendo sido avaliado um alto preço por elas.

Foliões ironizaram o sumiço das vigas da Perimetral no Rio de Janeiro.

A época, o prefeito do Rio, o senhor Eduardo Paes, não soube explicar o sumiço das vigas, e hoje, três anos depois, e já tendo saído da prefeitura, o senhor Eduardo Paes até agora não deu uma explicação para a população do Rio de Janeiro, cidade a qual ele governou como chefe do executivo por 8 anos consecutivos. Se alguém entende que ele não deve explicações, paciência, eu acho que ele deveria responder na justiça pelo sumiço das vigas.

Bom, como mencionei acima, o carnaval já teve seus momentos de protestos sim, mas isso não era muito divulgado pela imprensa (que, cá pra nós, sabe muito bem desestabilizar um governo, quando abre o som de um microfone). No carnaval deste ano, o som estava amplamente aberto para o grito do povo, e não foram poucas as ocasiões que os espectadores puderam ouvir, sentados mesmo no sofá da sala de casa: “FORA, TEMER!”

Foram muitas as cidades em que, entre um agito e outro do carnaval, ouvia-se o “FORA, TEMER!” Salvador, Olinda, Rio de Janeiro, Recife, João Pessoa, Natal, São Paulo, Niterói, Cabo Frio… Ufa, outras mais gritaram a mesma palavra de ordem, fazendo deste carnaval o mais unido de todos os tempos. É, sabemos que há uma rivalidade entre as cidades, para saber quem promove o melhor carnaval. Concorrência à parte, todas as cidades se uniram em uníssono coro: “FORA, TEMER”, “FORA, TEMER”, “FORA, TEMER…”

Ironias a parte, a imprensa soube aproveitar este momento de protesto da massa para veicular notícia e ter o que falar para além dos acontecimentos típicos do carnaval. Foi bom ter havido este movimento em pleno carnaval, para que algumas pessoas entendam que não há tempo certo para protestar, se há o que protestar!

O trecho que iniciei este texto vai ao encontro ao que penso sobre uma sociedade que se queira ser respeitada como tal e encontra-se no livro que terminei de ler há pouco. Não dá para simplesmente achar que a política é uma opção; não dá, gente! Somos naturalmente animais políticos, e fugir dessa realidade é negar-se a si mesmo.

Todos nós, quer queira quer não, somos influenciados e influenciáveis. Eis o cerne da política! Quando defendemos um ponto de vista diante de outros, estamos fazendo à pura e sã política; quando vamos cobrar que nossos direitos sejam respeitados, estamos agindo politicamente; quando nos indignamos com notícias (por exemplo), de escândalo de corrupção por parte de algum agente político… bingo, estamos fazendo política.

Infelizmente se confunde a política meramente com os acordos e tramas entre os agentes políticos, que em nosso caso (para ser mais específico), estão reunidos em agremiações partidárias. A política está para além disso, muito além. Antes de existir partidos políticos, já existia a política.

Uma onda de movimentos vem tomando conta do país desde as jornadas de junho de 2013 e até presidente da República já perdeu o cargo por conta dessa onda. Pessoas de todas as classes dentro da sociedade já se manifestaram, ou foram representadas por pessoas que foram aos atos. Isso eu vejo com bons olhos; efervescência política é salutar para a sociedade. Assistir a tudo sem nada fazer, é coisa de “vaquinha de presépio”.

Todavia, eu gostaria de ver mais hombridade por parte das pessoas que vestiram verde e amarelo no ano de 2016, alegando que um partido apenas era o causador do mal da corrupção. Ora, o partido foi praticamente varrido do mapa político nas últimas eleições, mas as acusações de corrupção não pararam, pelo contrário, estão sendo ampliadas e chegando aos “peixes muito graúdos” do cenário político nacional.

Gostaria de ver a cara de quem bateu panela nas varandas gourmet contra um partido, e que agora, diante de escândalos e mais escândalos envolvendo os integrantes do governo federal, e do legislativo federal (para não citar municipal e estadual), escondem-se atrás da moralidade, alegando que fez porque todo mundo estava fazendo. Me poupe!

E assim vamos nós levando nossa humilde vidinha. De fato o ano de 2017 começou no dia 6 de Março (como se costumam dizer que o ano só começa depois do carnaval), e já começam com declarações bombásticas, temidas listas do Procurador Geral da República para o STF. Estados quebrados, prefeitos mostrando quem de fato são… Espero que o ano seja bom, e que não se pare de ouvir pelas ruas, becos e vielas, asfalto, campos e favelas: “FORA, TEMER!!!”

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