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Daniel Louzada assumiu a Leonardo Da Vinci após 17 anos na rede Saraiva / Foto: Leo Martins

Por Leonardo Cazes de O Globo

Renovação com continuidade. Essa é a síntese dos planos de Daniel Louzada para a Livraria Leonardo Da Vinci, no Centro do Rio, da qual é o novo dono desde o início de fevereiro. A fachada das três lojas no subsolo do Edifício Marquês do Herval, na Avenida Rio Branco, ainda está coberta por um papel pardo que esconde a transformação que começa a acontecer lá dentro: uma grande reforma que vai devolver a livraria à cidade completamente renovada. Em abril, uma das lojas será reaberta, sem reforma e com acervo limitado, para voltar a gerar receita. Se as obras caminharem no ritmo previsto, em junho a nova Leonardo Da Vinci reabrirá em grande estilo.

— A fama da Da Vinci antecede a própria Da Vinci. A livraria tem um modelo que, se precisa de adaptações e mudanças, ao mesmo tempo é bastante atual, porque responde a necessidades dos leitores e clientes que continuam iguais — afirma o novo dono em entrevista ao GLOBO na legendária mesa de madeira onde dona Vanna recebia os pagamentos de clientes famosos, como Carlos Drummond de Andrade.

Após uma carreira de 17 anos na rede Saraiva, onde começou como vendedor em Porto Alegre e chegou a à gerência da área de maior faturamento na empresa, o gaúcho radicado em São Paulo decidiu investir suas economias na Da Vinci. Assumiu o empreendimento fundado em 1952 pelo romeno Andrei Duchiade e tocado nas últimas décadas pela esposa dele, dona Vanna, e a filha do casal, Milena Duchiade.

Em maio do ano passado, a família anunciou uma grande liquidação do estoque antes de fechar as portas por considerar o modelo de negócios “inviável”. A comoção provocada pela notícia foi seguida por ofertas de investidores. Segundo Milena, entretanto, Louzada foi a única pessoa do ramo que se apresentou e isso pesou na decisão. O empresário Omar Peres, dono do Bar Lagoa, do restaurante Fiorentina e sócio da Boulangerie Guerin, também fez uma oferta. As conversas começaram em julho, mas a negociação só caminhou para o desfecho no fim de 2015.

— Estamos muito felizes com a solução. A Da Vinci precisava de sangue novo, de mais energia para continuar. O nosso sentimento é de torcida para que dê tudo certo — diz Milena, enquanto arruma os últimos papeis da livraria.

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Pelo projeto, livraria ganhará amplitude, com um café, sofás e cadeiras / Foto: Divulgação

No projeto de reforma, apresentado por Louzada, a livraria vai perder o seu caráter quase labiríntico — as três lojas eram interligadas por portas estreitas — e ganhar mais amplitude. As paredes serão derrubadas, o piso será trocado, assim como a iluminação e o sistema de refrigeração. A nova Da Vinci vai ganhar também um café com mesas e sofás para receber melhor os clientes. Outra novidade é uma linha de produtos de papelaria com a nova identidade visual. O “L” em estilo gótico, desenhado pelo próprio Andrei Duchiade, foi mantido. O acervo na loja será de 30 mil livros distribuídos pelos 270 metros quadrados.

— Do jeito atual, a Da Vinci não é um negócio sustentável. Precisa oferecer mais serviço, mais conforto, mais experiência para o cliente. Mas a espinha dorsal se mantém. Não somos uma livraria generalista, não vamos trabalhar com didáticos ou técnicos. Vamos focar nas nossas áreas tradicionais: humanidades, artes, e vamos ampliar a área de literatura, investindo em seleção e acervo — afirma Louzada.

As obras importadas, campo no qual a livraria sempre foi referência, vão demorar um pouco mais para voltar. O livreiro explica que, por contar apenas com capital próprio, precisa trabalhar em consignação com as editoras. No caso dos livros estrangeiros, contudo, não há essa opção, então sua volta deve ocorrer só em 2017. Ainda hoje na Da Vinci há títulos com o preço marcado em pesetas, escudos e francos, moedas que desapareceram após a adoção do euro em 2002. Em compensação, haverá investimentos na área de quadrinhos e até uma seção geek será criada.

LANÇAMENTOS E DEBATES

A proposta é que todo o novo ambiente seja flexível para receber eventos de pequeno porte, como leituras e debates, além do lançamento de livros. A expectativa de Louzada é que a loja absorva parte da energia da cena literária da cidade.

— Vamos oferecer um espaço para essa energia criativa que circula. A vida em torno dos livros é muito maior fora do que dentro das livrarias. Queremos ir além da sessão de autógrafos. Já estamos preparando uma agenda de eventos bastante robusta para retomar e incrementar coisas que a Da Vinci historicamente teve — diz ele, que lembra o texto do ensaísta americano Benjamin Moser sobre a livraria. — No texto (publicado no GLOBO), que me emocionou, Moser diz uma coisa que é essencial e faz sentido para mim como leitor e profissional do livro: “o que distingue uma cidade importante de uma cidade que tem muitos habitantes é a sua vida cultural”.

Investir numa livraria física em um ano de recessão no país parece uma aposta arriscada, mas Louzada demonstra confiança. O novo VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) do Centro terá uma estação na frente do prédio. A pista para carros será fechada e transformada em um passeio com ciclovia. Junto com outros equipamentos culturais, como a Caixa Cultural, a Biblioteca Nacional e o Teatro Municipal, ele espera que um novo polo cultural se articule na região:

— Há uma oportunidade muito grande de que este ponto, fraco nos fins de semana, se torne um local de encontro dos cariocas. Fica entre a Cinelândia e a Carioca, em frente ao VLT. Tudo isso tende a aumentar a oferta de serviços e de comércio qualificados.

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