O documentário Leitores sem fim dirigido por Beto Seabra (jornalista), realizado pela Câmara dos Deputados, apresenta relatos de pessoas que tiveram suas vidas modificadas pelo hábito da leitura e o poder transformador das bibliotecas como espaços públicos para esse fim. O filme de 39 minutos estreou em fevereiro de 2016 e trata das bibliotecas-parque instaladas na cidade do Rio de Janeiro desde a criação da primeira em Manguinhos em 2010.

Leitores sem fim foi premiado como Melhor Documentário da I Mostra de Documentários das TVs Legislativas da Astral (Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas).

As bibliotecas-parque eram bibliotecas que ofereciam, além de livros, internet, filmes, cursos, exposições, espaço para dança etc. Tais bibliotecas foram inspiradas nos projetos bem-sucedidos como espaços culturais nas cidades de Medellín e de Bogotá, na Colômbia, e eram instaladas em locais estratégicos da cidade, com alto índice de violência e baixa renda, oferecendo à população cultura, convivência e serviços de qualidade.

O documentário deu vozes a várias pessoas humildes que contaram a sua relação com as bibliotecas, desde trabalhadores e moradores de ruas a profissionais das unidades. Também contribuíram com depoimentos o próprio autor, Emir José Suaiden (Diretor da Biblioteca da Universidade de Brasília), Vera Schroeder (então superintendente de Leitura e Conhecimento da Secretaria de Cultura do Estado do RJ), os deputados Alex Canziani (PTB-PR) e Lobbe Neto (PSDB-SP e autor da Lei de Bibliotecas em escolas até 2020), abordando a situação da leitura no Brasil e políticas públicas de promoção à leitura.

Os relatos mostram como as bibliotecas-parque, em 6 anos de sua existência, contribuíram para a dignidade de cada um dos depoentes, ganhando o respeito e a admiração da população. As bibliotecas se tornaram lugares especiais para aqueles que as frequentavam, pois todos eram respeitados como cidadãos, no que resta hoje a frustração após a crise que resultou no fechamento das unidades.

Uma das histórias que mais me comoveu foi a de Elizabeth Gomes de Moraes. Elizabeth nos conta que sempre amou ler e que foi trabalhar como auxiliar de serviços gerais antes da inauguração da biblioteca e que pela sua paixão pelos livros acabou sendo convidada a trabalhar como organizadora de acervo. Elizabeth não havia concluído o ensino médio e sentia vergonha por isso. Quando ela passou a trabalhar naquele ambiente rodeada de livros, ela resolveu voltar a estudar numa escola próxima à biblioteca para realizar o seu sonho de ser escritora.

Em 2016, Elizabeth era estudante de graduação em Letras. Assim como Elizabeth, o vídeo também traz a história de um gari que se apaixonou pelos livros, hoje é escritor e grava áudio livros. Outra história comovente é de uma adolescente e moradora de rua que apesar de ainda ser analfabeta, diz que aprendeu muito com a biblioteca e estava sempre na biblioteca-parque.

O filme nos mostra exemplos claros dos ensinamentos de Paulo Freire apresentados no livro Pedagogia da Autonomia. O ser humano como um projeto inconcluso capaz de mudar a sua própria história. Através do espaço da biblioteca, a pessoa passa a ter uma consciência mais crítica, pois dentro dela há diálogo entre o conhecimento e o mundo, onde um interfere no outro. É notável que os frequentadores e os usuários das bibliotecas-parque passaram a ter mais cidadania, mais cultura e mais informação, pois lá eles ensinavam/aprendiam/pesquisavam/liam o mundo.

Infelizmente, neste mesmo ano de 2016 as bibliotecas-parque foram fechadas devido à crise financeira do governo estadual do Rio de Janeiro.  Sabemos que as bibliotecas ainda não são prioridade nos governos no Brasil. Paulo Freire também aborda em seus textos que “toda educação é política e não é neutra”. Após ver o documentário, fiquei me perguntando: como estes personagens da vida real estão vivendo sem as bibliotecas-parque? Triste realidade.

Concluo com um trecho da fala de Beto Seabra: “Existe um equipamento que une educação e cultura, esse equipamento é a biblioteca. […] Não haverá desenvolvimento no Brasil sem investimento na leitura”

Assista abaixo o documentário:

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