Bibliotecária, professora e pesquisadora, Francilene do Carmo Cardoso morou por 10 anos no Rio de Janeiro, o que lhe fez perceber que muito da produção literária abundante em terras cariocas não chegava à sua terra natal São Luís, capital do Maranhão. Somou-se a isso sua militância à favor das causas negras e feminina, resultando na criação da Lekti, livraria e sebo voltada para as mulheres e para as temáticas raciais, africana, afro-brasileira, indígenas etc.

Inaugurada no último dia 22 de junho, a “Lekti Sebo Livraria” fica localizada na Feira do João Paulo, em São Luiz, “uma encruzilhada em termos geográficos e políticos”, onde são encontrados livros novos e usados, consultoria e assessoria de trabalhos acadêmicos, normalização, cursos de formação continuada para a área dos direitos humanos, questões raciais, biblioteconomia e da  literatura preta feminista.

“A Lekti mulheres, livros, normalização e relações raciais surgiu da vontade de seguir contribuindo com a renovação do pensamento crítico. É um espaço para valorizar a produção de mulheres em toda sua diversidade e das questões raciais, negros, árabes, imigrantes, africanos, indígenas, ciganos, quilombolas”, diz sua idealizadora que é doutora em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A Lekti, cujo nome é inspirada numa palavra em crioulo, língua do Haiti que significa “leitura”, também oferece o espaço para cursos e oficinas, lançamento de livros e rodas de conversas. “O Haiti teve uma das revoluções pretas mais importantes da história mundial aonde pretos  tomaram o poder naquele país. A Lekti vem pra tornar mais acessível a nossa história preta ainda silenciada pelo epistêmicidio, isto é, silenciamento, banimento de autores negros e negras no espaço escolar e acadêmico”, garante.

Francilene do Carmo Cardoso. Foto: Facebook

Ainda sobre a sua militância à favor das causas negras e feminina, Francilene explica que desde a graduação, e mais ainda no doutorado, teve a oportunidade de acessar muito da produção das intelectuais negras, “várias delas silenciadas nas ementas dos cursos da graduação, causado pelo epistêmicidio, ou seja, banimento das suas contribuições”. Segundo ela, a empreitada é também uma forma de “repaginar” sua atuação profissional, sobretudo após passar por uma tentativa de impedimento para assumir cargo de professora efetiva na UFMA, caso que ainda tramita na Justiça.

“Aqui no Maranhão, contraditoriamente já que somos o segundo estado mais preto do país, com 80 % da população preta e parda. Mesmo assim ainda elas [intelectuais negras] são poucos debatidas. Nesse sentido, nós colocamos do outro lado, daqueles que pretendem descolonizar as mentes, construir para produção de conhecimento crítico desde a periferia”, diz ela explicando que a Livraria já tem parceria com várias editoras do Rio e SP como a Malê.

Livrarias no Brasil

Um levantamento feito pelo Jornal Nexo no ano passado mostra que dos 5.570 municípios do Brasil, apenas 1.527 contam com livrarias. O total nacional de estabelecimentos é de 3.095, que são distribuídos irregularmente: enquanto a região Sudeste tem 1.715 livrarias (55% do total), o Norte apresenta apenas 105 locais do tipo (4%). Isso significa que no país existe uma livraria para cada 64 mil habitantes, enquanto nos Estados Unidos existe um estabelecimento para cada 14 mil pessoas.

Um levantamento da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), realizado no ano passado a partir de dados do Ministério do Trabalho, mostra que o número de livrarias e papelarias em funcionamento no Brasil encolheu 29% em 10 anos. No final de 2017, eram 52.572 estabelecimentos – 21.083 a menos do que o país reunia em 2007. Das mais de 21 mil lojas que fecharam as portas em 10 anos, metade delas encerraram as atividades de 2013 para cá. Somente em 5 anos, o número de papelarias e livrarias encolheu 22%.

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