A história do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca de São Paulo (PMLLLB/SP) começou a ser construída no ano de 2012 por profissionais e militantes da área. Este não é um mero detalhe, mas indica a sua essência e peculiaridade. O caráter popular do PMLLLB/SP mostrou mais uma vez a dimensão e a importância da participação na elaboração de políticas públicas.

Foram debates, formulações, disputas (algumas acaloradas) que envolveram os diversos atores dos segmentos do livro e leitura. Para muitos foi a primeira oportunidade de encontrar e poder trocar impressões e informações com agentes de uma área afim. Bibliotecários, professores, editores, livreiros, mediadores de leitura, ativistas, escritores e pesquisadores enriqueceram as plenárias, ocupando um papel central na redação do Plano que envolveu também o Executivo e o Legislativo municipais.

Durante o período de 2012 a 2015, foram promovidos encontros, plenárias, reuniões, audiências públicas, seminários, rodas abertas e democráticas de discussão pelos diversos cantos da cidade. Todas as dificuldades e a complexidade de colher as contribuições e os subsídios para confecção do Plano foram sustentadas pela sociedade civil. A oportunidade de participar diretamente da elaboração de uma lei não é peça vulgar numa democracia nova e cheia de interrupções autoritárias como a brasileira.

O PMLLLB/SP virou lei em dezembro de 2015, depois do projeto de lei do vereador Antonio Donato  (PT) ter sido aprovado por unanimidade na Câmara Municipal e sancionado pelo, então prefeito, Fernando Haddad. Em 2016, foi criado o Conselho do PMLLLB formado pelo Executivo, Legislativo e sociedade.

Os representantes da sociedade civil foram eleitos de forma direta, o que corroborou com o caráter popular de todo processo. Os conselhos representativos são uma reivindicação histórica dos movimentos sociais, que ganharam força no período pós-ditadura, ainda que a maioria deles esteja longe de sua consolidação.

Uma lei escrita e aprovada com a participação direta é um grande passo no aprofundamento da democracia representativa. Um Conselho eleito de forma direta e independente do Executivo aperfeiçoa a relação de um governo com a sociedade civil. Parece claro, não? Há, no entanto, gente que não pensa assim.

Em outubro de 2016, João Dória Júnior foi eleito em primeiro turno, vitória legitima e indiscutível. O prefeito eleito nomeou o produtor e cineasta André Sturm para a Secretaria Municipal de Cultura.

De pronto, o Secretário mostrou grande entusiasmo pela área do livro e leitura que gerou uma expectativa nos diversos segmentos e, sobretudo, no Conselho que tem como principal função o acompanhamento das políticas do livro e leitura por meio do estabelecimento de diretrizes e metas constitutivas do PMLLLB/SP.

O fato é que a Secretaria Municipal de Cultura, desde o início da atual gestão, não demonstrou muita simpatia pela composição do Conselho. Ficou clara a má vontade pelo fato de que em seis meses de gestão foi realizada uma única e conflituosa reunião, além da falta de comunicação entre Conselho e Secretaria e a ausência de respostas sobre o cumprimento das metas estipuladas no Plano. Simpatias e antipatias a parte, é bom lembrar que o PMLLLB e o Conselho não dependem da vontade do Secretário de plantão, é uma lei aprovada e regulamentada, com todos os trâmites respeitados.

Na última sexta feira (dia 21), a antipatia virou decreto e a democracia se transformou em autocracia. Explico: um decreto do prefeito Dória fez modificações no decreto anterior do prefeito Haddad e singelamente colocou nas mãos do secretário de Cultura o poder de nomear os representantes da sociedade civil no Conselho.

Através de um único ato, o prefeito desqualificou a luta por um Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca diverso e abrangente e a construção de cinco anos de profissionais e militantes do livro e leitura de diferentes instancias (sociedade civil, Legislativo e Executivo). Não foi mero detalhe, foi uma verdadeira subversão. De representantes eleitos diretamente, o Conselho passou a ter uma composição biônica, no velho estilo dos senadores e governadores biônicos nomeados pelo Executivo na época da ditadura militar.

Os tempos mudam, mas os métodos são os mesmos. A velha disputa e o conflito por uma cidade mais democrática e inclusiva estão reabertos.

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