Deu vontade de escrever uma carta pra você e para quem, assim como eu, tem um desejo profundo por dias sem ódio, descaso, desmanche, distopias.
Vivemos em tempos de extremos. E sabemos disso em tempo real, pois temos na ponta dos dedos o acesso a um portal imenso de dados. Ao mesmo tempo, sabemos que no dia a dia a vida é feita de miudinhos que nos constituem no pouco a pouco e que nos levam até aqui e lá, onde só a imaginação alcança. Esses miudinhos também estão em nossas mãos, no fazer e desfazer – principalmente no fazer melhor.
Então eu acho que a minha vontade de escrever pra você é para dizer que o Pessoa estava certo: “o valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis”.
Sobre o valor da vida, não nascemos sabendo. Aprendemos. Tudo o que somos é esculpido no tempo do vivido, e é o que dá sentido e forma à nossa vida. E é também o que nos dá o poder de fazer de nós o que há de melhor em nós.
Se aprender é o verbo, a ação só pode ser a educação. Daí a pergunta: qual educação precisamos para chegar cada vez mais perto de outras galáxias e, ao mesmo tempo, mergulhar profundamente em nossa humanidade? Bernardo Toro, a meu ver, traz uma resposta bastante conectada com nossa necessidade:
“(…) parece-me óbvio que a primeira coisa que uma pessoa tem de aprender é saber cuidar. Cuidar de si, do próximo, do distante, dos que não conhece. Saber cuidar das transações, dos planos. Isso se faz sabendo conversar, sabendo respeitar a todos sob uma perspectiva ética. Nessa concepção, há algumas coisas que são básicas e que se mantêm. O mundo do paradigma do cuidado, por exemplo, vai requerer pessoas com alta capacidade de comunicação. Nesse sentido, a comunicação será fundamental em qualquer modelo educacional nesse mundo em transformação. Dentro disso, a leitura e a escrita desempenham um papel fundamental”.
Estamos então numa seríssima encruzilhada a ser vencida para que crianças e jovens tenham plenas condições de ingressar, mergulhar e emergir de jornadas educacionais significativas, como postula Bernardo Toro: há 10 anos a posição do Brasil está estagnada, segundo dados do Pisa, em matemática, Leitura e ciências.
Justamente porque dados do mundo inteiro podem ser acessados facilmente com um simples touch (como alerta o relatório do Pisa 2019) é preciso, mais do que nunca, preparar adequadamente esta geração para que possa discernir dentre esta enorme diversidade de dados divulgados por múltiplas fontes quais refletem a realidade.
E mais. É preciso também saber qual é a palavra de concertação a ser empenhada para promover diálogo e direitos, para banir a injustiça e a desigualdade, para abraçar a vida, para saber com convicção que nenhuma história é banal – lembre-se disso!
Tenha certeza de que não importa quem você é ou quem é a pessoa que você conhece, se você for educador/a ensine e se você for estudante, aprenda: a resposta à pergunta célebre “o que você quer ser quando crescer” não se restringe, jamais e em tempo algum, à qual ocupação pretende exercer na vida, porque trabalhar é um pedaço importante, é fato, como estudar, mas só traz sentido e agrega valor à vida se faz de nós menos ilha e mais continente .
E porque estamos nesta esquina entre o presente e o futuro de um tempo de extremos, sigamos de corações dados, empatia em alerta, palavra em punho em favor da educação para a humanidade que é preciso tecer no mundo, onde quer que a gente esteja, para onde quer que a gente vá.
Sejamos o fio invisível de amorosidade que nos conecta no tempo e no espaço. Um fio que só de saber nos resgata de abismos e nos eleva às alturas das estrelas.
“Se ainda a vida é verdade e o verso existe. Se alguém chama à sua porta e você está triste, Abre, que é o amor, amiga minha” (Se alguém bate à sua porta, Gabriel Garcia Marques).