Há uma máxima confuciana que diz: “O homem virtuoso é movido pela responsabilidade, e o homem sem virtude é movido pelo lucro.” No entanto, o que fazer quando o peso do compromisso é tão imenso como uma âncora de 36 toneladas, digna de um Titanic?
Essa é a vida do jovem Moon Gang-tae (Kim Soo-hyun), que vive e cuida sozinho de seu irmão autista, o talentoso Moon Sang-tae (Oh Jung-se). Sem ter a chance de concluir os estudos ou ter qualquer tempo livre, Moon Gang-tae coloca as necessidades de seu irmão à frente de sua própria existência, buscando oferecer as melhores condições para que Sang-tae viva com qualidade. Traumatizado por uma terrível violência que presenciou na infância, Sang-tae precisa mudar de cidade toda vez que a estação das borboletas chega, inseto do qual ele tem horror.
Nessas mudanças, os irmãos vão parar em uma cidade do interior, onde Moon Gang-tae encontra vaga de trabalho em um hospital psiquiátrico como cuidador e assistente. As reviravoltas da vida trazem a famosa escritora de livros infantis Ko Moon-young (Seo Yea-ji) para a vida dos irmãos, gerando inúmeros problemas, conflitos e, como veremos mais tarde, grandes mudanças e soluções.
Essa é o fio condutor de “Tudo bem não ser normal” (It’s Okay to Not Be Okay – 2020), série sul-coreana assinada por Jo Yong e dirigida por Park Shin-woo. O drama fez um sucesso estrondoso no ano de seu lançamento, carregando até hoje bons números de audiência por seu potencial cativante e dramático.
Sofrendo de transtorno de personalidade antissocial, a escritora Ko Moon-young, que também leva na mente fortes abalos psicológicos, sente o coração aquecer e balançar por Moon Gang-tae, tomando a iniciativa de encontrá-lo e, por meio de ações dominadoras, conquistá-lo. Mas o que começa com cenas de sangue, brutalidade e raiva, vai deslizando para reencontros e processos de cura, tanto dos protagonistas quanto dos personagens secundários, que tem seu próprio universo desenvolvido.
Apaixonado por dinossauros e ilustrações, Moon Sang-tae é profundamente hábil e talentoso. Seus desafios aproximam o público de algumas vivências e sensações de uma pessoa com autismo, o que pode ser observado também no mais recente drama sul-coreano “Uma Advogada Extraordinária” (Extraordinary Attorney Woo – 2022), lançado na Netflix. É incrível a entrega do ator Oh Jung-se ao papel, o que acabou resultando no prêmio de melhor ator-coadjuvante no Baeksang Arts Awards 2021.
Não são poucas as cenas que provocam a emoção do espectador. Uma delas – e vou me esforçar para não dar spoiler – surge com uma briga homérica entre os irmãos. É de partir o coração, ainda que ele possa ser feito de Adamantium.
Outro ponto interessante é o universo fantástico, que surge a partir dos contos de fadas escritos por Ko Moon-young. Os livros, por sinal, existem. “O cão alegre”, “O menino que se alimentava de pesadelos” e “Criança Zumbi” são obras da autora Jae hyung Woo. “O menino que se alimentava de pesadelos” é o meu preferido, narrando a história de um garoto atormentado por consecutivos pesadelos. Desesperado, ele percorre uma floresta soturna e faz um pacto com uma bruxa. Ela promete apagar todas as lembranças ruins de sua mente, mas o preço a pagar é muito alto.
“Tudo bem não ser normal” é um drama bonito, poético. Uma espécie de colcha de retalhos que já foi remendada inúmeras vezes, mas que precisa de uma nova chance. Hoje e sempre.
