Há alguns anos ler estava vinculado ao papel. Era inimaginável pensar na leitura sem pensar no manuseio das folhas. No século XV, Gutenberg ficou reconhecido pela invenção da imprensa a qual possibilitou mudanças e evolução na forma de estudar, disseminar conhecimentos e consequentemente na forma de ler, pois tornou disponível à população livros e materiais impressos a preços acessíveis. Com a chegada da pós-modernidade, ligada ao surgimento de uma sociedade pós-industrial, o conhecimento tornou-se a principal força econômica da produção.
A crescente urbanização ocorrida na transição do século XVIII para o século XIX, o contexto social, assim como as práticas sociais passaram por transformações que possibilitaram, no mundo pós-moderno, uma infinidade de mudanças provenientes da globalização, onde se iniciou uma tendência unificadora das sociedades, corroborando para o desenvolvimento e intensificação nos processos de produção e troca de informações.
Observa-se que a informação é um instrumento essencial aos estudantes e pesquisadores, pois flui explicitamente nos processos de construção de novos conhecimentos. Porém, é necessário criar mecanismos de disponibilização e acesso a estes para que possam tomar as decisões no prazo necessário, esclarecer dúvidas, fomentar novas pesquisas e o desenvolvimento científico, entre outros.
A prática da leitura, bem como a forma de realizar pesquisas no ambiente acadêmico transformaram-se em conjunto com a sociedade.
Nesse contexto, com a propagação das ferramentas de busca e recuperação de informações proporcionadas por meio das Tecnologias da Informação e Comunicação – TICs – ocasionaram mudanças na dinâmica da leitura, tendo em vista que estas passaram a corroborar para o acesso a informações e outros materiais para leitura.
O relato pauta-se numa pesquisa aplicada com estudantes do curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Amazonas – UFAM, com o intuito de conhecer a realidade da aplicabilidade das TICs no espaço acadêmico. Partindo do pressuposto veiculado em diversos meios, sobre a possibilidade do fim do livro e sobre a desmaterialização das bibliotecas a fim de conhecer os hábitos efetivos e o que é veiculado na mídia.
Investigou-se 56 acadêmicos selecionados aleatoriamente, cursando entre o 5º e 7º períodos, respectivamente, no ano de 2012. Adotou-se um questionário semiestruturado com perguntas abertas, semiabertas e fechadas; divididas em três blocos, a saber: a) questões referentes ao conhecimento e manuseio das ferramentas disponibilizadas por meio das TICs; b) práticas de leitura dos acadêmicos; e c) sobre as fontes de informação utilizadas, considerando as preferências por impressas e/ou eletrônicas.
Conhecimento e manuseio das ferramentas
Nota-se que 68% dos acadêmicos possuem habilidades intermediárias para manuseio de computadores. Considerou-se como nível básico habilidades de leitura e envio de e-mails, navegação na Internet e digitação de textos. Como nível intermediário, soma-se às habilidades do básico, a utilização de mídia removível (pendrive), edição de fotos, elaboração de planilhas e download de arquivos.
Portabilidade de computador e acesso à internet
Dos respondentes, 95% possuem acesso à internet. Destes, 93% afirmaram possuir computador em casa. Intui-se que o acesso à internet facilita a busca e manuseio de diversas fontes informacionais disponibilizadas on-line, e, possivelmente implica no número de materiais lidos.
Quanto ao local de acesso à internet mais utilizado, destaca-se que 48% dos acadêmicos acessam em casa; 25% no local de estágio; e 19% no laboratório de informática do Departamento de Arquivologia e Biblioteconomia – DAB. Logo, para este caso, Descarta-se considerar que a população pesquisada possua dificuldades no acesso à informação disseminada pelos veículos eletrônicos em formato digital ou virtual.
Barreiras ao uso das tecnologias
Mais da metade (54%) dos acadêmicos apontaram a falta de conhecimento de outros idiomas como fator limitante para manuseio das tecnologias e ferramentas disponibilizadas, além do excesso de conteúdos recuperados (28%) no momento da busca. Essa premissa nos faz considerar que existe acessibilidade, mas não usabilidade das informações recuperadas.
Práticas de leitura dos acadêmicos
Aferiu-se que 86% da amostra possui o hábito de leitura. Entre os que possuem o hábito da leitura, 54% relataram fazê-lo por obrigação enquanto 46% o fazem por iniciativa própria. Apesar de ser uma diferença sutil, intui-se, que a leitura, mesmo na universidade, ainda está vinculada a obrigação, não demonstrando desta forma a leitura como fonte de prazer e desejo pelo conhecimento. Seria o momento de reformular os projetos pedagógicos ou trata-se de uma questão cultural?
Outro ponto observado foi a preferência pela leitura em materiais impressos (63%); impresso e digital (35%), e somente material digital (2%). Dessa forma, apesar da presença de meios que possibilitem a desvinculação do papel migrando para o formato digital, o formato impresso ainda se torna majoritariamente presente.
Motivos da preferência por materiais em formato impresso
Em relação à questão da confiabilidade das informações veiculadas 16% apontaram a preferência pelo meio impresso; seguida pela abrangência e cobertura dos assuntos tratados (9%), bem como a acessibilidade 7%. Destes, 11% consideram que os formatos se complementam.
Reflexões
As práticas de leitura encontradas na pesquisa apontam que apesar dos avanços das TICs e maior disponibilização de conhecimentos e conteúdos por meio da internet, ainda predominam práticas de leitura em formato físico, alegado como mais confiável e acessível.
Evidenciando desta forma, que apesar da atualidade das informações serem apontadas como uma característica do meio virtual, o comodismo e a corporalidade do ato de tocar no livro, mesmo que desatualizados, ainda transmite maior segurança ao leitor.
Um ponto interessante foi a acessibilidade no meio virtual que não promove a busca e acesso ao conhecimento, necessariamente, segundo os dados encontrados, pois, a maior parte dos entrevistados possuem computadores com acesso à internet, usam sites de buscas, mas preferem as bibliotecas convencionais e livros impressos.
Podemos refletir sobre algumas questões: 1) a preferência pelo formato impresso em decorrência da leitura no formato digital (geralmente na tela do computador ou outro dispositivo móvel) ocasione fadiga rápida dos olhos além do apego à prática da leitura em papel? 2) Seria a não desvinculação de um hábito criado na infância – durante a educação formal?
Vale lembrar que leitura e navegação não são sinônimos, como afirma Dulce Maria Baptista em seu artigo intitulado “Internet e livro: uma falsa dicotomia”, justamente pelo fato de que as mídias não destruirão o poder dos livros, mas provocarão mudanças na dinâmica sendo, portanto, as TICs uma agregada aos livros e ao fomento das prática de leitura. Isso porque comportamento é cíclico, e, por conseguinte, estão implícitos nas pessoas e serão reproduzidos no cotidiano delas.
Portanto, é possível intuir que diferentemente do previsto, onde uma forma de vinculação do conhecimento substituiria o outro, o mundo contemporâneo vem demostrando o caráter complementar que um desempenha ao outro.
Contudo, a disponibilização e facilitação do acesso à informação não garante sua usabilidade, principalmente em uma sociedade que apesar de combater o analfabetismo e aparentemente investir na educação, ainda se apresenta distante de uma educação com qualidade que preze pelo conhecimento e hábito de leitura.