Por Clarissa Stycer de O Globo

Uma confusão envolvendo manifestantes que tentam ocupar o Museu do Índio, em Botafogo, desde quarta-feira e seguranças da instituição acabou em pancadaria na noite de domingo. Integrantes do movimento “Aldeia Rexiste”, nome que faz referência à antiga Aldeia Maracanã, acusam funcionários do museu de tê-los espancado com pedaços de pau. Ontem, a Justiça atendeu a um pedido de reintegração de posse do imóvel feito pela Funai na madrugada de quinta-feira. Com a medida, o grupo, que já foi intimado, tem 24 horas para deixar o local.

O tumulto aconteceu por volta das 21h30m de anteontem. Os manifestantes, que estavam acampados do lado de fora do museu numa barraca, pularam o muro da instituição. Na última quarta-feira, eles participaram de uma série de eventos do seminário “Dimensões das Culturas Indígenas” e tentaram ocupar o espaço. Mas acabaram impedidos de permanecer no museu depois de terem feito uma fogueira. Uma das lideranças do movimento, o índio Ash Ashaninka diz que, na ocasião, os seguranças já agiram com truculência.

— A gente fez uma fogueirinha. Um segurança veio e chutou, não entendendo a nossa cultura — disse Ashaninka, afirmando que eles saíram do museu, mas teriam sido ameaçados depois. — Na sexta-feira, um indígena funi-ô que trabalha como terceirizado no museu nos ameaçou, falando que iria nos retirar com violência.

FERIDOS NO CONFLITO

Entre outras reivindicações, eles exigem a devolução da Aldeia Maracanã, prédio do antigo Museu do Índio que fica em frente ao estádio, de onde foram expulsos em 2013. O lugar hoje está vazio e sob vigilância policial.

De acordo com José Carlos Levinho, diretor do Museu do Índio, a fogueira era uma ameça ao prédio. Ele afirmou ainda que funcionários da instituição também foram agredidos, sendo que um chegou a ser hospitalizado porque foi atingido por uma pedra no peito.

— Isso nunca aconteceu antes no museu. O prédio é tombado e guarda o maior acervo etnográfico de índios do Brasil, documentos considerados Patrimônio da Humanidade pela Unesco e que só existem ali. Um dos funcionários apagou a fogueira e foi hostilizado — disse Levinho, acrescentando que índios funi-ô que trabalham na instituição também tiveram cocares quebrados pelo ocupantes.

No sábado à noite, o clima já era tenso. Ash Ashaninka contou que sua mulher, que carregava um bebê, teve o celular arremessado no chão, e outros dois aparelhos do grupo teriam sido retidos por funcionários. O caso foi registrado na 10ª DP (Botafogo).

Na noite do dia seguinte, durante a tentativa de reocupação, parte dos manifestantes, entre eles mulheres e crianças, pulou o muro do museu.

— Os capangas da Funai nos atacaram com bordunas (arma indígena) e pedaços de pau pontudos, que os seguranças também usaram. Tinha um índio com facão. Ele tacou a faca em cima da gente, mas ela caiu no chão — relata Mônica Lima, da etnia manaós, professora da rede estadual e bióloga do Hospital Universitário Pedro Ernesto.

Para Fernando Tupinambá, que ainda ocupa o museu, houve uma agressão à cultura indígena:

— As bordunas eram usadas em rituais de antropofagia, de morte em guerra, em ocasiões específicas, espirituais, jamais desta forma banalizada, vil e cruel. Jamais poderia ter sido usada contra outro parente.

Um vídeo publicado nas redes sociais mostra que o confronto de domingo durou cerca de 20 minutos. De acordo com Mônica Lima, indígenas e manifestantes tiveram braços e dedos quebrados na pancadaria. Ash Ashaninka se feriu na cabeça e precisou levar pontos.

Já Levinho diz que, além de ter um vigilante ferido, a propriedade foi danificada. Os prejuízos chegariam a R$ 160 mil:

— Eles têm o direito de reivindicar, mas estão contra quem? Defendemos as terras indígenas, garantimos os acervos. É uma ação política em um contexto altamente delicado — disse.

José Urutau Guajajara, um dos líderes do movimento, afirma que o grupo vai tentar na Justiça derrubar a decisão sobre a reintegração de posse.

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