Nesta terça, 01, o debate no curso “Livro tributado: o que está em jogo?” teve como tema motivador “Repercussões da reforma tributária para o sistema do livro e da leitura”. Organizado pela Escola do Parlamento, em parceria com a Biblioo, a formação tem como um dos seus objetivos localizar a reforma tributária, em tramitação no Congresso Nacional, como parte do conjunto de estratégias de (re)ordenação da economia brasileira identificando seus principais vetores e suas consequências para as políticas socais de modo geral e, particularmente, para as políticas públicas de cultura, com foco no subsistema livro e leitura.
O debate deste segundo dia de curso ficou a cargo de Bernardo Gurbanov, presidente da Associação Nacional de Livrarias (ANL); Frederico Indiani, livreiro e editor com atuação na economia do livro e da leitura e Allan da Rocha, professor da UFRRJ e consultor jurídico. A mediação foi feita por Antonio Freitas, responsável pela livraria e espaço cultural Tapera Taperá e pelo Instituto Diplomacia para a Democracia.
Para Frederico Indiani, “os profissionais do segmento do livro e a sociedade de uma forma em geral precisam se organizar para decidir o que queremos. Tomar as rédeas deste destino e fazer política. Aproveitar este momento de efervescência em relação as discussões em torno do livro, caso contrário vamos ser engolidos”. Assumindo seu otimismo, Frederico lança aos alunos do curso a responsabilidade de tomar para si este momento, fazendo frente, enquanto sociedade, ao que ele traduziu como o “tributo que é um flerte com a censura”.
Segundo ele, a crise do livro já estava em curso mesmo antes dessa pesada investida contrária ao seu acesso, repercutida por meio da reforma tributária. Para o editor, a deflação de preços, até então a solução desta crise esteve associada aos chamados “arranjos de sobrevivência”, que salvariam empresas específicas e maiores e levariam a uma maior concentração do mercado do livro, sobretudo no varejo do livro. Diante dessa nova ameaça, a da tributação, a possibilidade de mobilização de todos os atores envolvidos impulsionaria novas soluções.
Por sua vez, o professor Allan Rocha, respondendo à pergunta feita por uma das pessoas que acompanhava o debate, indagou: “e quando falta arroz e feijão, como convencer as pessoas que o livro é importante?”, associando a ela a questão da falta de mobilização pública sobre o tema. Em consonância com os palestrantes que até agora participaram dos dois dias de debates, Allan argumentou que o valor do livro é muito maior que seu valor econômico.
“É justamente nesses momentos de crise que o elemento cultural faz uma enorme diferença nas possibilidades que se tem de sair desse momento”, disse ele, lembrando que é por meio do livro que surgem possibilidades de superar as limitações materiais e estruturais que são impostas. Ele destacou que o livro é um prazer “barato” e uma fonte de liberdade mental. “É também um elemento cultural que oferece o escapatório das condições que estão dadas e com isso é possível imaginar ‘outros mundos’ e romper com a realidade dada”.
Allan destacou que o desenvolvimento da leitura envolve muitos atores, desde o Estado, agentes e indústrias do livro. Ao falharem nesse sentido, acabam por não motivarem a mobilização pública, dado que não são “criados” leitores assíduos que sejam tocados e mobilizados pelo momento vivido.
Outra contribuição trazida pelo professor Allan Rocha durante o debate é a compreensão do acesso ao livro como parte dos direitos culturais. Embora historicamente a não taxação de livros, que ocorre desde 1946 no país, tenha sido atrelada à lógica individual da liberdade de expressão, essa discussão se enquadra no guarda-chuva mais abrangente, que são os direitos culturais, garante. O que permite se classificar certos direitos como direitos culturais, para o professor, é o seu “objeto”, ou seja, não o objeto em si, mas o elemento simbólico que eles carregam.
Estes elementos simbólicos, segundo ele, são veículos de comunicação, interação abstrata com o outro e com a coletividade e de construção de identidades. Estes direitos alcançariam um espaço maior no Brasil na Constituição de 1988, se tornando foco de atenção a partir do final da década de 1990. E, na contramão de normativas que vinham sendo consolidadas, sobretudo desde 2010, a reforma tributária cerceia, no julgamento do professor, este rol de direitos taxando os livros.
Nesse sentido, Bernardo Gurbanov, presidente da Associação Nacional de Livrarias, alega que estamos diante de uma “gambiarra tributária”, se referindo ao impasse sobre o fato de que a taxação imposta sobre o livro pela reforma tributária, apesar de não ser um imposto (em termos tributários), tem os mesmos efeitos práticos, entre eles a alienação da escolha, pelo indivíduo, do livro que deseja ler.
Ao encarecer os livros, diminuir os acessos e afirmar que aos pobres serão oferecidos livros gratuitamente pelo governo, está, segundo o livreiro, se impondo ao cidadão a condução sobre sua leitura, interferindo diretamente em sua formação e impedindo-o de “sonhar”, imaginar e construir outros mundos possíveis. Abaixo você pode assistir a integra do seminário e no canal da Biblioo no YouTube você pode ver as demais aulas.