Por mais que estejamos no século XXI, e vivamos na chamada sociedade da informação, as questões que envolvem a organização documental e o acesso à informação em ambientes físicos como biblioteca, por exemplo, ainda geram dúvidas em pesquisadores e usuários das unidades de informação. Mas afinal, o que pode ser um sinal de organização documental em uma unidade de informação?!

Trabalhar em bibliotecas ou em outra unidade de informação que conhecemos exige conhecimentos específicos no que tange a organização documental em vistas ao acesso à informação de forma rápida e com qualidade. Dominar os princípios da classificação, indexação e catalogação são pressupostos básicos para auxiliar o desenvolvimento organizacional de um ambiente voltado para a questão informacional. Como minha área de atuação é a biblioteca e me formei em biblioteconomia, dissertarei daqui em diante sobre a vivência em bibliotecas.

Embora a forma e os meios que lidamos com a informação na atualidade sejam algo nunca visto e nem registrado na história, e que os instrumentos voltados para este segmento sejam abundantes no mercado, o velho e valoroso livro ainda habita um lugar de destaque no imaginário da construção social. Ter livros, por mais que já ocorreram discursos evidenciando o seu fim, imprime um valor social bem sólido sobre um indivíduo ou sobre uma instituição.

Na atual conjuntura pandêmica, em que as relações de trabalho e sociabilidade foram ganhando espaço em ambientes virtuais, ter um cenário com livros ao fundo, fala muito sobre a pessoa que vocaliza ou a entidade que se está representando. Bibliotecas das mais variadas formas e tamanhos que antes eram exclusivamente da esfera privada, passaram a ser vistas por um sem número de pessoas, bastando que essas estivessem online e acessando os canais de transmissão das chamadas lives.

Livros são valorados na sociedade, e ter uma biblioteca particular, por exemplo, agrega um capital cultural e intelectual a quem a possui, para ficarmos com uma das teorias de Pierre Bourdieu. Essa mesma lógica valorada dos livros em uma biblioteca particular estende-se às bibliotecas que estão em outros ambientes, que têm frequentadores em geral, sejam elas públicas, especializadas, escolares, especiais, universitárias etc.

Quando se trabalha em uma biblioteca, em que pessoas de diferentes posições sociais, com entendimentos diversos sobre a vida, migraram para esse espaço, o profissional que atua nesse ambiente precisa, antes de tudo, abandonar suas subjetividades pessoais, para não haver ruídos entre a informação e o consulente. Posições políticas, crença religiosa, ausência de fé, regionalismo, dentre outro aspectos que devem permanecer na esfera privada, não podem influenciar na tomada de decisão que visa organizar a informação. 

Destarte, é fundamental que uma biblioteca tenha sua política de formação e desenvolvimento de coleção estabelecida, um documento bem elaborado por uma equipe que traga, não apenas o profissional da informação, mas também outros profissionais que atuam na instituição associado à expertise de quem lida com a informação com os que constroem o nome da corporação em outros ambientes.

Um documento que possa orientar as funções de cada colaborador(a) da biblioteca, sem que o(a) bibliotecário(a) precise estar presente. Um documento que fica de pé, para usar um jargão acadêmico. É fundamental ter um manual que possa nortear as tomadas de decisões dentro de uma biblioteca, visando melhor atender quem a procura para sanar suas necessidades informacionais. Não se deve esquecer que a biblioteca é um organismo em crescimento, como já bem salientou Hanganathan, e como tal é preciso promover o movimento das publicações que a biblioteca abriga. 

Mover livros nas estantes é uma forma de contribuir com a higienização das publicações, além de ter conhecimento do estado das mesmas, seja físico, seja de temporalidade no acervo (para fins de desbaste e descarte), contribuindo assim com a avaliação do acervo. Uma estante cheia de livros não necessariamente reflete a qualidade do acervo, nem a funcionalidade da biblioteca. Às vezes uma biblioteca com estantes abarrotadas de livros, nada mais é do que uma biblioteca cheia de livros, caminhando para se tornar um depósito, algo que é inadmissível. 

Uma biblioteca viva tem em suas estantes publicações que serão procuradas por consulentes ávidos pelas informações que elas guardam. Para isso, é claro, não se ignora o bom e velho estudo do usuário. A qualidade do acervo será evidenciada quando menos tempo uma publicação ficar nas estantes. Essa deveria ser a principal meta dos que trabalham em bibliotecas: livros fora das estantes e nas mãos dos usuários!

Lembre-se bibliotecário(a): “os livros são para uso”. Reconhece esta afirmação?! Claro que se há de ter todo o zelo e cuidado com as publicações da biblioteca. Não se empresta um livro para que deliberadamente alguém o destrua. O que se afirma neste texto, ancorando-se nas teorias de Hanganathan, é que “para cada livro tem-se um leitor”, e esse leitor precisa das informações contidas naquele livro. Em sete anos como bibliotecário e atuando em bibliotecas, o que mais me orgulha é ver um livro com marcas de uso; digo marcas de uso e não vandalismo!

Muito além de ostentar uma sabedoria imaginada pela presença dos livros, uma estante de biblioteca precisa refletir as intenções de leitura dos que a procuram, sejam leitores de bibliotecas particulares, sejam os leitores que utilizam os serviços das bibliotecas que são abertas ao público.

Livros nas estantes não refletem necessariamente sapiência, embora seja creditado logo a presença dos livros a inteligência. Um exemplo de que ter “livros ao fundo” não diz muita coisa, foi o vereador da cidade do Rio de Janeiro, e filho do atual presidente da República, que colou livros virtuais ao fundo de um vídeo que ele gravou.

Tratar a informação é uma atividade das mais valorizadas na sociedade da informação. Ao dominarmos as técnicas de organização documental em vistas ao acesso à informação, e utilizarmos os instrumentos que nos auxiliam na construção de mecanismos que viabilizam organizar a informação, temos um lastro profissional dos mais importantes da atualidade.

Sou daqueles bibliotecários que atuam fortemente para que publicações classificadas como obras raras sobrevivam muito mais tempo entre nós, da mesma forma que também sou um bibliotecário que quer ver livros nas mãos dos usuários. Uma coisa não está em antagonismo com a outra, é preciso equilíbrio. As obras raras, tratamentos peculiares das obras raras, ao acervo correm às mãos dos usuários! 

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