Parece óbvio pensar que as pessoas sempre vão querer algo de positivo associado à sua imagem, e no afã de conquistar isso, reivindicam métodos com forte estrutura técnica, cuja finalidade é a satisfação de quem contrata tais métodos. Este texto pretende chamar a atenção para dois casos que ocorreram há pouco tempo no Brasil, cujo desfecho que se vislumbra beira ao escárnio público de boa parte da população. Já explico para onde pretendo levar esta discussão!
Não é segredo, pelo menos para boa parcela da sociedade brasileira, que a emissora de maior apelo popular, e que detém boa parte da audiência nacional, está veiculando diariamente um programa chamado Big Brother Brasil, sendo esta sua vigésima primeira edição. Contam-nos os especialistas nesse tipo de programa, que o Brasil já superou em número de edições desta atração, até mesmo o país que criou o programa. Não se quer aqui fazer juízo do mérito do programa, mas sim debruçar-se em um episódio desta edição para traçar um paralelo com outro episódio ocorrido na seara da política nacional.
Pelo burburinho das redes sociais, pode-se dizer que esta edição do BBB está com uma rotatividade de assuntos polêmicos em alta. A análise que se pretende fazer neste texto destaca a participação da participante Carol Conká. Karoline dos Santos Oliveira, natural de Curitiba/PR, despontou para o cenário artístico brasileiro no ano de 2011, há exatos 10 anos. Conhecida por suas letras que afirmam independência, força e protagonismo da mulher, Conká logo ganhou as paradas de sucesso e de lá não deixou de estar.
Logo após completar 35 anos, no último dia primeiro de janeiro, Carol e mais 19 participantes, entre “camarotes” e “pipocas”, entraram na dita casa mais vigiada do Brasil, situada na Central Globo de Produções, na cidade do Rio de Janeiro. E foi aí que a carreira da Carol Conká começou a sofrer alguns reveses, o que nem ela e nem a equipe que faz parte da sua produção imaginaram.
Com força no que falava e alta personalidade, Conká começou a montar uma espécie de grupo, que logo ganhou a alcunha de “grupo do mal”. Contando com a presença de outros participantes como: Lumena, Projota e Nego Di, o tal grupo começou, na linguagem dos analistas de BBB, a espalhar medo e terror pela casa, elencando alvos e apontando oponentes, ao ponto de “forçar” a saída voluntária de um participante do programa.
Semanas foram se passando sem que o tal grupo pudesse de fato impor sua tática, melhor dizendo, sem que pudesse angariar vitórias sobre seus oponentes. Tão logo os membros do grupo foram ao paredão, saíram da casa com recordes de rejeição. Nossa personagem principal até aqui neste texto bateu todos os recordes de rejeição das vinte edições anteriores, saindo da competição com 99,17% dos votos; um recorde mundial deste programa.
Carol perdeu patrocínios, apoio, publicidade. Um programa já gravado em um canal de televisão por assinatura, e que estava programado para ir ao ar inclusive, foi suspenso por tempo indeterminado. Sua imagem foi vilipendiada por todos os lados. As redes sociais em polvorosa traziam diversas postagens sobre a artista, muitas das quais de forma pejorativa. A cultura do cancelamento (algo que já discuti em outro texto aqui na Biblioo) foi largamente propagada em detrimento a imagem da Conká.
Logo após a saída da artista da casa, sua equipe de produção buscou uma estratégia que pudesse “limpar” sua imagem. Muitos profissionais que lidam com imagens no meio social (principalmente nas redes sociais), elaboram planos para alavancar a artista, traçaram projetos de imersão, construíram metas comportamentais para ela. Tudo isso visando recuperar a positividade da imagem, “likes” nas redes e, acima de tudo, retorno financeiro em patrocínios, shows etc.
Não se quer entrar aqui no mérito da questão. Não se está julgando neste texto reflexivo os atos da Carol no programa supracitado. Acredita-se que com um porcentual de quase 100%, os espectadores do BBB já julgaram e condenaram à participante. A questão que se coloca aqui é outra, e espera-se deixá-la clara nestas poucas linhas.
Como o título do texto deixa claro, abordar-se-á o assunto sobre a relação entre arte e política, no que tange a criação de narrativas e reconstrução de imagens, sendo assim, faz-se necessário pelo menos para justificar o título do texto, apresentar-vos uma personagem do campo da política, o que se fará doravante.
Com uma trajetória antagônica da artista repetidamente mencionada neste texto, Flávio Nantes Bolsonaro (ou 01 para o pai), natural de Resende, cidade que fica ao Sul do estado do Rio de Janeiro, empresário, advogado e atual senador da República pelo mesmo estado, já figurou diversas vezes no noticiário nacional sob a pecha de cometer crime de peculato, apelidado de “rachadinha”, esquema denunciado pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, e que gerou uma ação penal em curso.
Flávio Bolsonaro, como é comumente conhecido, vez ou outra aparece no noticiário. Se bem que está mais para noticiário policial do que político propriamente dito, algo que não é exclusividade do parlamentar em questão, para se fazer justiça. Definitivamente, são muitos os casos ainda não explicados em que o senador está envolvido direta ou indiretamente. Diferentemente do que ele e seus familiares estão acostumados a fazer com oponentes, aqui não se condena ninguém sem provas, nem se faz ilações do que não foi largamente publicado na imprensa.
Segundo denúncia do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, Flávio comandava um esquema de posse de recursos públicos que serviria para o pagamento de funcionários que prestaram serviços ao mandato do parlamentar, quando este era deputado estadual no Rio. De acordo com a peça de acusação, Flavio ficava com uma significativa parte dos salários dos funcionários de fato, além de “empregar” os ditos funcionários fantasmas, ficando com os vencimentos.
Baseados em informações obtidas no COAF, Fabrício Queiroz, braço direito de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio (ALERJ), movimentou mais de dois (2) milhões de reais, sendo que a renda declarada por ele era incompatível com o montante movimentado. Consta na mesma peça acusatória do MP/RJ que Fabrício Queiroz pagava constas pessoais do senador (até então deputado estadual) com dinheiro vindo deste esquema. Insisto em afirmar que tudo o que está sendo retratado neste texto já fora divulgado à exaustão em veículos de imprensa.
Com 39 anos de idade, e com salário de político, Flávio tem cerca de vinte imóveis, parte deles comprados dando uma significativa entrada em dinheiro vivo. A última compra feita por Flávio está até agora dando o que falar. Ele, com salário de senador e sua esposa com salário de dentista, não somam juntos mais do que 35 mil reais por mês. Mas a casa adquirida pelo casal equivale a cerca de seis (6) milhões de reais. Ele pegou empréstimo em um banco estatal, mas, de acordo com o simulador do próprio banco, a renda mensal do casal não dava para conceder o crédito para a compra de uma casa no valor mencionado.
Além de informação referente à movimentação suspeita de dinheiro, Flávio também já foi apontado em envolvimento com milicianos na cidade do Rio de Janeiro. O episódio mais célebre sobre esse assunto foi à homenagem feita ao ex-capitão da polícia militar do Rio de Janeiro, Adriano da Nóbrega, que foi expulso da corporação e estava preso na ocasião. E olha que para ser expulso da PM/RJ, o cidadão precisa ter feito muita coisa errada, muito mesmo!
O curioso é que Flávio não foi “cancelado” nas redes, pelo contrário, ele e os familiares mais bloqueiam as pessoas do que fazem propagandas para angariar mais seguidores. A imagem do senador não parece ter sofrido nenhum abalo, mesmo vindo à tona tudo o que já veio.
Bom, não sei se você já percebeu onde eu quis chegar com este texto. Se ainda não, eu falo. Duas foram às pessoas que, diante das suas realidades de vida (e elas são bem distintas) figuraram nas mídias de maneira geral. Uma por ser considerada maléfica e sem sentimento, outro por ser considerado corrupto e ladrão. Uma luta para ter sua imagem de volta, reconquistar o carinho e atenção que tinha, outro parece não dar a mínima atenção para sua imagem, numa espécie de impunidade garantida.
Entre refazer imagem e construir narrativas, Carol Conká corre para que tudo fique bem e receba uma segunda chance de quem a cancelou. Em contra partida, Flávio dá umas declarações bem nada a ver, com discursos soltos, sem ter um cadeamento no pensamento e no que diz, acreditando que está falando para beócios.
A reconstrução da imagem para quem se reivindica arrependido torna-se válido, faz parte do jogo neste mundo de relações líquidas, mas, como parece que vivendo em um país surrealista, muitos agentes apostam na construção de narrativa fora da realidade, apostando que quem as recebe não percebe, ou quem constrói tais narrativas acredita tanto nelas, que a realidade já lhe foi sucumbida.
Comentários
Comentários