Antes de iniciar esse texto dei uma olhada mais atenta sobre a aplicação da palavra estimular para ter certeza de estar usando o melhor termo que definisse o que vem fazendo o Instituto Ler para Crescer no estado do Amazonas. Procurando, encontrei uma série de sinônimos que me fez avaliar que sim, a palavra é mesmo adequada e possibilita compreender as ações do Instituto e seu impacto na vida das pessoas.
Foi em 2006 que o projeto seguindo inspiração na Pedagogia de Paulo Freire, teve início na cidade de Manaus e, ao longo dos anos, foi crescendo até se transformar em 2011 no Instituto Ler para Crescer.
Idealismo de sonhadores? Talvez sim, pois foram as amigas Elaine Elamid e Antonia Merllik, que pensaram os primeiros passos para criar oportunidades de incentivo a leitura para crianças carentes em um dos bairros de Manaus. Uma feliz providência, tendo em vista que um ano depois, a população, como um todo, passaria a viver sem a Biblioteca Pública Estadual do Amazonas.
Sem o apoio do poder público, o Instituto vem realizando um trabalho que já lhe rendeu prêmios e distinção numa cidade em que o acesso ao livro ficou por muito tempo relegado ao esquecimento. Interessante observar que por quase todo seu tempo de existência, o LPC seguiu o seu caminho em paralelo ao fechamento da Biblioteca Pública Estadual, que só foi reaberta em janeiro de 2013.
Parte do trabalho que o Instituto realiza, consiste numa visão mais simplista do que vem a ser uma biblioteca comunitária, contudo suas ações vão além, já que oportunizam por meio de outros projetos o encontro com o conhecimento e a leitura através de formação de voluntários; ações do Barco do Ler para Crescer; parcerias com o projeto Fazendo Minha História; atividades na Casa Comunitária e Projeto Bambini di Strada.
Mesmo contando com tantas ações, o elemento que deu o norte ao que seria o Ler para Crescer foram suas bibliotecas comunitárias. Firmando a criação de bibliotecas-brinquedotecas, era pensamento de Elaine Elamid que a tônica do encantamento vinculando leitura e brincadeiras seria a parceria ideal para a formação do público alvo. E assim, surgiu à primeira experiência na Colônia Terra Nova, um dos inúmeros bairros carentes da cidade de Manaus.
Hoje o Ler para Crescer está presente em cinco bairros da cidade e tem também um núcleo em um dos 62 municípios do Amazonas – em Iranduba. Suas atividades são realizadas com o apoio de voluntários e o esforço dos dirigentes da organização que não recebem nada em termos material para realizar o trabalho (em alguns casos, até precisam tirar do próprio bolso os recursos para dar seguimento às atividades), mas que realizam ações significativas que fazem a diferença na vida de inúmeras pessoas.
Nos seis espaços onde foram instaladas as bibliotecas/brinquedotecas do LPC, a comunidade passou a compreender o ambiente como lugar de oportunidades. A maioria desconhecia o acesso ao livro, contudo onde as bibliotecas foram implantadas, a comunidade firmou parceria oferecendo o local e apoio com despesas de água, luz e merenda para as crianças.
Bonito dizer que a construção dos espaços do LPC tem a participação direta da comunidade. A pintura das paredes das sedes, os personagens que marcam o ideário do projeto inicial e até a arrumação dos acervos recebem ampla participação, talvez por isso, muitos se percebem personagens engajadas no processo.
Estimular a leitura é preciso…
Deve (ria) ser missão das bibliotecas públicas gerar condições de acesso informacional à população de forma democrática. Bibliotecas dispondo de bons acervos, bons serviços, tecnologia e profissionais qualificados. Contudo, em várias cidades do Brasil, as bibliotecas públicas são espaços culturais que vivem ainda condições de precariedade.
Em Manaus, mesmo com a Biblioteca Pública Estadual do Amazonas tendo reaberto suas portas em janeiro de 2013 (após quase sete anos fechada), ainda não oferece serviços eficientes já que dispõe de acervos defasados e poucas ações do ponto de vista de mobilizações culturais.
Também a Biblioteca Municipal João Bosco Pantoja Evangelista, que reabriu em espaço provisório em março de 2013, vem se ressentindo da falta de usuários, provavelmente por falta de serviços que atraiam atenção especialmente da juventude e das crianças. Um dado relevante é que essa biblioteca atualmente está localizada em um dos espaços de principal foco de visitantes, especialmente turistas na cidade de Manaus. Possivelmente, não deve estar disponibilizando o tipo de serviço ideal para atrair a população.
Em diversos municípios do estado do Amazonas, não existem bibliotecas públicas, tampouco outros equipamentos culturais. Creio que por isso, periodicamente, sabemos de casos isolados de pessoas apaixonadas por cultura que começam a fazer algo semelhante ao que o Ler para Crescer vem realizando, porém percebem que prosseguir não é tão fácil, e desistem no meio do caminho.
Dessas experiências, posso falar com certeza que o Instituto Ler para Crescer tem sido persistente e feito um trabalho relevante em todos os sentidos. Com o pensamento voltado para a mediação, assim como a utilização de estratégias metodológicas voltadas para os aspectos motivacionais, o LPC cresce e faz crescer não apenas os pequenos usuários e beneficiários dos projetos, mas também os apaixonados voluntários que se orgulham do que dão e do que são a partir das novas vivencias ali desenvolvidas.
E o governo do Amazonas, o que tem feito?
Criou em 2012 o Programa Mania de ler, justamente no período em que a cidade se inquietava com o fato da Biblioteca Pública do Amazonas permanecer fechada numa reforma que não tinha fim. Por isso quando o Programa foi anunciado, perguntávamos: Ler aonde? Ler o quê?
Com um orçamento de R$ 17.818.990,00, esse programa envolve 46 projetos e subprojetos e se justifica, por ter por fim, despertar o hábito da leitura em diversos gêneros literários e estimular a circulação de edições locais, bem como o contato com escritores no estado do Amazonas.
Penso que com esse recurso, a Secretaria de Cultura do Estado (SEC) deveria viabilizar mecanismos para apoiar instituições que têm se empenhado em realizar ações de incentivo a leitura de fato. Quem sabe criando parcerias… Acredito que encaminhamentos dessa natureza poderiam trazer consideráveis benefícios para a cidade e seus habitantes.
Reconhecimento
Em 2012 o Instituto Ler para Crescer foi agraciado com o Prêmio Anu por ser uma das melhores iniciativas de ação cultural no ambiente periférico do norte do país. O prêmio, criado pela Central Única das Favelas (CUFA), no Rio de Janeiro, foi entregue no Theatro Municipal do Rio de Janeiro e trouxe grande satisfação para todos os que têm acompanhado, apoiado e acreditado nesse trabalho.
O certo é que nas sedes do Instituto Ler para Crescer não faltam crianças. Talvez por que já contam sempre com as contações de história, teatro e brincadeiras.
O pessoal do Ler para Crescer compreende que a educação tem ligação direta com as práticas de leitura e essa, quando bem mediada, oferece mudanças, especialmente na autoestima dos envolvidos e se constitui como uma moeda de troca, pois, conforme apontou Paulo Freire: “Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”.
Conforme apontei no início desse texto, pesquisei o sinônimo da palavra estimular e descobri que quem estimula também excita, aguilhoa, incentiva, anima, encoraja, incita… E é realmente isso que o Instituto Ler para Crescer vem fazendo. E fazendo muito bem!
Para saber mais sobre o Instituto Ler para Crescer.
Para conhecer a “Pedagogia da Autonomia”, leia:
Editora: Paz e Terra
Ano: 2011
Edição: 43ª
Páginas: 144
Comentários
Comentários