Por Jéssica Balbino, do Bocada Forte.
Para entender quem são as mulheres da literatura marginal/periférica no Brasil, a jornalista Jéssica Balbino lança o projeto “Margens”. Em formato de site para reportagem multimídia e independente, um formulário para automapeamento está disponível, a fim de permitir que as poetas, contadoras de histórias, romancistas e escritoras possam se autorepresentar na história.
A pesquisa, sobre literatura marginal/periférica e saraus tem foco sobre a produção feminina, que segundo a jornalista, nos últimos 10 anos, aumentou consideravelmente. O trabalho final resultará, além de uma dissertação, em uma reportagem 360 sobre as mulheres nessa literatura periférica e nestes dados levantados pela autora, que mostram que, embora as mulheres, especialmente as de periferia, assumam-se como chefes de família, na literatura – desde 2004 quando as antologias dos saraus se popularizaram até 2015 – o número de mulheres escritoras, que já publicaram seus escritos, ainda é 20% inferior que o número de homens.
Para entender este cenário, o mapeamento das mulheres mostrou-se a ferramenta mais eficaz. Ele está disponível no site do projeto. A ideia é parte do projeto de mestrado da jornalista, que cursa Divulgação Científica e Cultural na Unicamp, mas acredita que o formato participativo é uma forma de ampliar o acesso à academia.
“Fazer a pesquisa em forma de automapeamento e o site são uma chance de ‘derrubar’ o muro invisível que existe entre a academia, o jornalismo e a pesquisa real”, disse Jéssica Balbino.
Ainda de acordo com a jornalista, o projeto pode se tornar um livro futuramente. Jéssica é também autora dos livros Traficando Conhecimento (Aeroplano, 2010) e Hip-Hop: A Cultura Marginal (Independente, 2006) e membro dos coletivos Frente Nacional de Mulheres do Hip-Hop (FNMH²), Hip-Hop Mulher e Mjiba.
Sobre o Margens
Embora esteja em processo de formação e transformação, a literatura marginal/periférica emerge das periferias diariamente e encontra novos locais onde se hibridizar, onde se espalhar e onde se fortalecer.
Apesar do discurso periferia/centro dar sinais de esgotamento, entende-se que é necessário debater a questão enquanto a literatura feita por agentes enunciadores que vem de um local e disseminam a arte por outro. Neste aspecto, entende-se que o subalterno não apenas pode falar, como escrever e declamar suas obras não apenas onde elas foram concebidas, mas para o mundo, segundo o escritor e pesquisador Alejandro Reyes.
“A maioria destas obras reivindicam, na temática e na linguagem, o local, invisibilizado pelos discursos hegemônicos”
O surgimento de antologias literárias marginais apenas femininas pode ser o início da superação da mudez e o recomeço da construção da própria história, já que existe espaço para tal, como forma também de preservação da memória. Além disso, os assuntos discutidos por mulheres e as manifestações expressadas pela voz e pelas declamações nos saraus também apontam mudanças no cenário, já que busca-se o empoderamento feminino e a organização, ao debater-se política através do próprio feminismo, dos relacionamentos e de causas como aborto, misoginia, sociedade, trabalho, etc.
Conforme observa Lúcia Helena Vianna, a ‘poética feminista’ é, quase sempre, política. “Toda discursividade produzida pelo sujeito feminino que, assumidamente ou não, contribua para o desenvolvimento e a manifestação da consciência feminista, consciência esta que é sem dúvida de natureza política”. Ela ainda acrescenta: “poética feminista é poética empenhada, é discurso interessado, é política”.
Desta forma, a construção e o resultado desta reportagem não se dá apenas por meio de leituras acadêmicas da jornalista, mas de vivências entre os autores e autoras, além da vivência nos saraus e acompanhamento da cena literária periférica desde o início dos anos 2000.
Serviço – Para responder ao questionário, acesse o link www.margens.com.br/pelas-margens/margens-mapeadas. Mais sobre o projeto pode ser acessado no site www.margens.com.br.
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