Inefável é o meu desafio do dia após dia: pescar no lago das palavras, aquelas que serão mais fiéis à tempestade que se dá dentro de mim. Como deixar escorrer toda essa luz, toda essa escuridão, todos os sonhos e todas as esperanças que guardo se as palavras vão torná-las menores? Arrancada dos apoios da linguagem, como chegar à superfície de mim mesma e ao encontro do outro?
Como conseguir colocar em palavras aquilo é demasiadamente inebriante?
Aquele que escreve para não enlouquecer, ainda assim hesita frente a sua folha em branco antes de começar a rabiscar as palavras que vão desbotar o sentimento grandioso prestes a explodir dentro de si. O fugaz momento de hesitação: onde tudo faz sentido, quando as emoções ainda não se converteram em frases.
Aquelas coisas que estão confinadas num território particular, caladas, veladas, secretas aos demais, mas que insistem em ecoar dentro de mim, sem que possam ser esquecidas, porque clamam ganhar a liberdade das palavras. E eu fujo o quanto eu posso porque palavras as diminuem, as tornam ordinárias apenas por serem mencionadas. Não haveria interlocutor possível para compreender coisas tão devastadoras presas em palavras tão pequenas.
Ainda assim, escrevo.
Escrever é como sussurrar os protestos da alma pelos dedos, pela tinta e pelo papel sem nunca conseguir liberta-los por inteiro, mas, apesar disso, ter a certeza de as palavras soltas no papel são a única coisa tão confortável quanto a escuridão dos olhos fechados.
A cumplicidade do amor que não precisava ser declarado, apesar e acima de toda a tristeza; a dor do frio e da saudade; o desespero líquido e venenoso; a fome do novo; a melancolia do antigo; se nenhum deles puder ser livre em toda a sua magnitude, nenhum deles ficará preso em mim também. Serei sempre narradora, mesmo que as palavras se tornem hino ao vento.
Escrever é quanto eu grito.
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