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Porque a melhor coisa do mundo além do amor, é cantar

Jards Macalé. Foto: José de Holanda

Os tempos mudam o tempo dos encontros. Hoje em dia, uma rápida conversa por Whatsapp com um amigo num fim de sexta-feira, pode musicar uma semana de silêncios.

Em 11 de setembro de 1978, Jards Macalé se apresentou para os detentos do Presídio da Papuda, em Brasília (DF). O show foi registrado e ficou perdido 40 anos, até ser lançado pelo garimpeiro Marcelo Fróes (selo Discobertas),numa caixa de shows inéditos, em 2018.

Macalé havia sido preso dias antes desse show, após uma outra apresentação com Moreira da Silva, em Vitória do Espírito Santo, dentro do lendário Projeto Pixinguinha. O motivo: cantou duas músicas “fora do combinado” com a censura federal.

Acabou a noite detido e o episódio ficou  marcado na história com uma das maravilhas realizadas pela ditadura civil-militar-empresarial. A apresentação começou com uma bela canção que dizia assim:

“A melhor coisa do mundo além do amor é cantar

Cante, cante, cante”

A resposta de Macalé foi certeira: cantou para os aprisionados em protesto à grande prisão que a ditadura impunha ao país. Uma resposta de libertação que a arte permite diante de qualquer treva.

Mas, vou voltar à amizade, que tem a tudo a ver com Jards Macalé, com a ditadura, com a canção que liberta…

…meu camarada, Antonio, contava ontem à noite no Whatsapp, sobre o dia que eu apresentei Jards Macalé a ele, e ai desandou a falar sobre artistas e obras que jamais morrem. Nas palavras dele:

“Dias desses eu assisti ao Macalé, e lembrei-me de que foi você quem o me apresentou. Na hora eu pensei na longevidade das coisas, como conhecer alguém com tanta estrada e ainda vê-lo como um iniciante. E penso então o quanto esse lance de idade é engraçado e nem um pouco entendível. Uns parecem não ter fim, outros vivem com um selo de validade estampado. No fim das contas estão todos com as datas já marcadas..

…o Macalé nunca vai morrer, mesmo quando estiver sob a fria lápide do sono.”

Daí, desandamos a falar dos discos, dos músicos, das composições, dos trechos de letras e de todo esse prazer, refúgios e história que a trajetória do compositor da música popular nos oferece. Assim, a vida fica mais leve, mesmo numa sexta-feira exausta.

É o prazer de ainda viver nesse mundo dos horrores das ditaduras, das censuras, das noites longas e de que, num outro lado, em contraponto, nos concede a poesia, a música, os compositores que jamais morrerão, mesmo diante das situações mais dolorosas.

Viva Jards Macalé, viva a música que encanta os desencantados, e vivam os amigos que não nos deixam esquecer que a melhor coisa do mundo, além do amor, é cantar.

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