Nos últimos tempos em nosso país vivenciamos uma grande efervescência política causada pela abertura do processo de impedimento da presidente da República, a senhora Dilma Vana Russef, pelo presidente (até o presente afastado) da Câmara, o deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ). Nesse período, presenciamos uma série de manifestações acaloradas por conta de boa parcela da população brasileira, motivada pelos acontecimentos políticos.
As redes sociais transformaram-se em arenas por muitas vezes, gerando inclusive discussões acima dos níveis aceitáveis para uma boa convivência. Não raro, algumas pessoas se estranharam por conta de correntes de pensamentos que eram expressos em comentário, posts, vídeos, dentre outros. A polarização entre quem apoiava a permanência da presidente no cargo e quem defendia a sua imediata saída por meio do Impeachment era vista e sentida em vários setores da sociedade, algo que fez com o que o país experimentasse um caldeirão de discussões entre pobres e ricos, negros, brancos, índios e mestiços, brasileiros e estrangeiros, os que gostam e os que não gostam de política…
É bom relatar que o objeto deste ensaio não se baseia tão somente nessa polarização que se inaugurou no país, motivada pelas disputas político/partidário que se travou nos últimos meses, mas nos desdobramentos que surgiram devido às emoções dos defensores de ambos os lados. Antes de continuar a discorrer sobre o assunto, gostaria de deixar claro que havia outros lados a serem defendidos nessa polarização, os quais acabaram sendo incorporados nos lados predominantes, quais sejam: impeachment (coxinhas) vs não impeachment (petrálias).
Mantendo a minha posição ideológica sadia durante este turbilhão de ideias que sobreveio ao país, fiz as minhas análises sobre o pensamento das pessoas, me baseando majoritariamente em discursos, vídeos, textos que tive contato através de jornais, revistas, telejornais, redes sociais (basicamente). O que pude constatar é que um misto de agressividade generalizada, ódios rançosos, xenofobia, misoginia, homofobia, racismo, dentre outras mazelas, estavam na vitrine das manifestações de opinião, revelando (pelos menos a mim) a face dissimulada de um país que não se assume tradicional, preconceituoso, hetero normativo, xenófobo, misógino, racista!
Nunca se ouviu tanto xingamento gratuito como se ouviu nestes tempos. O que mais me causou preocupação foi a forma que muitos cidadãos acharam de expressar a sua raiva, desapontamento, revolta etc. Os ataques contra a presidente foram os mais diversos, e me reservo no direito de não entrar no contexto do processo de impedimento contra ela, mas sim da forma baixa, de uma pobreza de argumentos que resulta em palavras de baixo calão, com que muitos utilizaram para atingi-la.
As revista e jornais mantiveram um pouco de sobriedade em seus textos, abordando de forma mais ampla o processo de impedimento e seus desdobramentos. A maioria manteve um padrão aceitável (embora com vícios e parcialidade editorial) de se fazer jornalismo, salvo a revista Época (do grupo O Globo), que por um infeliz e grosseiro texto do seu editor João Luiz Vieira, que há 26 anos é jornalista, publicou que a crise política que assolava o Brasil tinha uma de suas causas associadas a “falta de sexo e de erotismo da presidente”.
Em contra partida, nas redes sociais o nível foi realmente baixo e lamentável de se ver. Pessoas se xingando de forma gratuita, sendo acusadas e acusando os que possuíam pensamentos contrários. Um verdadeiro circo dos horrores foi armado e certamente visto por milhões de brasileiros.
Nesta altura do campeonato você deve estar se perguntando: o texto não era sobre questão de gênero?! Eu respondo que sim, mas eu queria abordar a questão de gênero desencadeada pela crise política que vivemos, embora não se precise da crise política para debater o assunto.
Bom, ainda na linha de raciocínio da crise, eu vi pessoas destilarem ódio e promoverem atitudes que vão de encontro a “boa conduta dos brasileiros”. A gente gosta de se enganar as vezes, achando que o ser humano é bom por excelência. Isso cai por terra quando passamos por momentos como os que estamos vivendo no país. Nunca se viu tanto ódio, tanto ressentimento, tanta vontade de eliminar quem pensa diferente, pelo simples fato de pensar diferente.
Assisti a um vídeo em que cidadãos paranaenses foram receber a senadora Gleisi Hoffman (PT/PR) no aeroporto de Curitiba sob os gritos de: “ladrona, vai morar em Cuba, vagabunda, safada, safada véia…”. Podemos discordar das atitudes da senadora enquanto parlamentar, e até mesmo como pessoa, mas isso não nos dá o direito de chamá-la de “safada, vagabunda, safada véia…” ou qualquer outro impropério, só por que eu não concordo com ela.
A forma que muitos usam para atingir o outro é ofende-lo em sua honra ou moralidade. De forma vil, muitos acham que para ofender alguém do sexo feminino é preciso atingi-la de igual forma, quer dizer, temos a mania de associar ao homem viril, másculo, heterossexual, apelidos associados a animais masculinos como algo positivo: tigrão, garanhão, galo, macho alfa, e de forma pejorativa e grosseria, associamos as mulheres (quando se quer ofender) aos animais femininos como: galinha, piranha ou vaca. Leandro Karnal, em uma palestra sobre o ódio do brasileiro, fala-nos que aprendeu com feministas que a nossa sociedade é voltada para o masculino, que pensa deus pelo masculino, que constrói obelisco e não monumentos femininos, uma sociedade “falocentrica”.
A mulher ainda hoje é vista como um ser que precisa estar submissa as vontades dos homens ou, como sugeriu a revista Veja, deve se pôr na sociedade como: “recatada e do lar”. Imagine você, em pleno século XXI, uma revista que, cá pra nós, vive cometendo desfavores à sociedade, quis passar a imagem de uma primeira dama para o Brasil. A Veja (que dispensa comentários), reafirmou o que muitas mentes mentecaptas ainda pensam: “que lugar de mulher é em casa!”
O assunto é deveras longo, mas é preciso abordá-lo sem medo. Não mencionei a questão da comunidade LGBTT, que tive a oportunidade de abordar em dois textos em anos passados. Todavia é uma questão que nunca pode sair da pauta, devido a diversidade de pessoas, condições sexuais que há na sociedade.
Sem disfarçar a sua real intenção, o presidente da República em exercício anunciou a sua equipe de ministros no dia 12 de maio, e isso repercute até hoje na mídia nacional e internacional, pois não havia nenhuma mulher, como também não havia nenhuma pessoa negra. Em tempos em que a imagem é fundamental e difundida em uma velocidade sem precedentes, na questão responsabilidade social o governo Temer já começa “dando um tiro no pé”, pois vem logo depois de um governo em que uma mulher foi a líder, e que contava com outras mulheres, além de pessoas negras. Tudo bem que o Temer já deixou claro que não pretende ser popular, mas poderia disfarçar um pouquinho.
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