Conhecida por todo o globo terrestre como a mais famosa “Rainha do Crime”, a inglesa Agatha Christie aposta no sobrenatural para compor os contos de “O Cão da Morte” (original The Hound of Death, tradução de Alessandro Zir, editora L&PM, 2013, págs. 256). A coletânea traz doze contos que envolvem espíritos, metafísica, misticismo, magia e o temido “rastro da morte”. Agatha deixa de concentrar sua narrativa no famoso lead jornalístico do “o que? quem? quando? onde? como? por quê?” para perscrutar a alma e todos os enigmas que separam o mundo humano de outras dimensões.
Adentrando o universo das crenças espiritualistas, a autora britânica invade o campo do psíquico e das contradições com os excelentes contos sobre paranormalidade e mediunidade. De longe, a coletânea de “O Cão da Morte” é uma das minhas obras preferidas de Agatha Christie justamente por ter a audácia de caminhar por trilhas diferentes do famigerado recurso narrativo “whodunit” (quem matou?).
Destaco todos os contos, sem preferência. “O Cão da Morte” fala de uma mulher, sobrevivente de guerra, visitada por imagens de colônias em outras dimensões, além de ser atormentada pela visão de um cão. Nesse conto, Agatha abre espaço para a interferência de outras crenças na concepção de mundo, com o famoso jargão “abrir a mente para a mente”.
Em “O sinal vermelho“, o dom da premonição auxiliará o jovem protagonista a fugir das incansáveis perseguições da morte. Já em “O quarto homem“, a teoria da metempsicose – trabalhada por Edgar Allan Poe no conto Metzengerstein – é colocada em discussão por um grupo de viajantes. Um quarto homem aparece para contar sua história e abalar tanto teorias científicas quanto crenças religiosas.
“A Cigana” e “A lâmpada” falam de espíritos que não descansam e ressurgem para transformar presente em passado. “O receptor de rádio” e “O mistério da jarra azul” enveredam pelo confronto das evidências com os sentidos. O conto “Testemunha da acusação” ficou conhecido pelos desmembramentos que acabou provocando, dentre eles uma peça escrita por Agatha e a adaptação para as telas de cinema – a atriz Marlene Dietrich estrelou o filme como a Senhora Vole, conquistando uma indicação ao Globo de Ouro. Na história, um respeitável advogado de defesa precisa provar que seu cliente não é culpado pelo assassinato de uma senhora rica e, para isso, ele tenta driblar sua falta de confiança, colocando à prova até mesmo o que seus olhos acham que veem.
Em “O estranho caso de sir Arthur Carmichael“, a autora narra um caso de metempsicose e bruxaria, causando calafrios ao aproximar o leitor do desfecho final. “A última sessão” fala de contatos mediúnicos levados à última consequência e “S.O.S” conta a história de uma família excêntrica que recebe um homem estranho em casa; o sujeito é capaz de revelar – e revirar – muitos segredos. Em “O chamado das asas“, Agatha Christie escreve uma história lindíssima e tocante, seguindo a linha do clássico “Um Conto de Natal“, de Charles Dickens.
Nessa coletânea, a “Rainha do Crime” se transforma em “Investigadora da Paranormalidade” e escreve contos surpreendentes, instigantes e mapeados por enigmas. Recomendadíssimo!
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