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Leituras atuais para bibliotecários: o que é empoderamento e lugar de fala?

Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver ocorrida em Brasília, em 2015. Foto? Marcello Casal Jr/Arquivo Agência Brasil

“O que é empoderamento” (Letramento e Justificando, 2018), da Joice Berth, é um livro difícil, mas necessário. Eu disse a mim mesma que não escreveria sobre livros teóricos, apenas sobre livros de literatura. Escrever sobre livros teóricos é não só um risco como um desafio. Especialmente porque, nesses textos, pretendo escrever para instigar a leitura, não para discutir conceitos, debater teorias, ou entrar em polêmicas.

E a polêmica em torno desses livros é por demais delicada. Então, começo pedindo licença e, de antemão, peço a compreensão das teóricas, caso escorregue em algum conceito ou no modo de expressar meu entendimento sobre eles. Estou aberta às trocas e diálogos sobre os textos aqui expostos, como sempre estive.

Ao contrário de “O que é lugar de fala” (Letramento e Justificando, 2017), da Djamila Ribeiro, que também faz parte da coleção denominada “Feminismos plurais”, “O que é empoderamento” não é uma leitura que flui. É uma leitura que dói. Que precisa de pausas, de reflexões, de “digestão”. Que precisa de estudo. Uma leitura que, já ao começar, notamos que precisará ser refeita.

Igualmente relevantes, as autoras possuem estilos muito diferentes. Djamila parece palestrar nos textos. A leitura é embalada facilmente, apesar das muitas notas e referências teóricas que a gente marca ou anota e dá vontade de sair correndo atrás na mesma hora. Berth escreve um texto para instruir, com referências densas e um discurso pesado. Um peso necessário.

Talvez porque, apesar de ambos os conceitos estarem sendo amplamente mal-utilizados e jogados nas redes sem nenhum critério, “lugar de fala” é sobre romper silenciamentos que já estão sendo rompidos, não sem custo, mas estão. “O que é empoderamento” fala de exclusões que estão longe de serem rompidas. E mostra como a banalização do termo empoderamento é perigosa, mas também que não é a primeira vez que essa mesma palavra, e tantas outras ligadas ao movimento negro, foram massivamente esvaziadas de sentido e de potência de luta. Tentaram.

A autora repete em suas falas e entrevistas que “empoderamento” não é autoajuda, não é página de rede social e não é só sobre autoestima. A autoestima é importante, é parte do processo de empoderamento, mas não se reduz a isso. Empoderamento não é colocar um cabelão, uma roupa fashion e ir pra balada. Empoderamento é um modo de ver o mundo, um tipo de resistência, uma forma de mudar como encaramos as opressões e os opressores e é sempre, sempre coletivo. Basicamente, não há empoderar-se, há empoderar-nos.

“Lugar de fala” não é sobre silenciar o outro, é sobre entender que cada um fala de um lugar e que esse lugar influencia esse discurso e essa percepção de mundo. Empoderamento não fala de ter poder ou de dar poder a alguém, mas é sobre o processo coletivo de fortalecimento do povo preto, em todos os âmbitos: estético, financeiro, psicológico, social, político, e todos os outros direitos que foram tirados desde os processos escravagistas até a reprodução racista de naturalização de inferioridades.

É preciso compreender nosso lugar de fala para entender nosso lugar no mundo e sermos capazes de lutar, coletivamente, pelo empoderamento do nosso povo. Esse entendimento deveria ser pré-requisito para nos tornar adultos. Recuso-me a inserir aqui trechos do livro, porque trechos não literários fora de contexto são um perigo. E porque é necessária uma leitura atenta, possivelmente mais de uma, de um texto como esse.

Por que eu estou dizendo tudo isso num site para bibliotecários, não é mesmo? Bem, às (aos) colegas de profissão, deixo a minha recomendação dos livros, não só para que entendam o mundo a sua volta e tudo que se tem discutido a respeito, como para uma compreensão do significado dos conceitos tão invocados recentemente, evitando equívocos de indexação, por exemplo.

Afinal, esses termos não tardarão a compor os vocabulários controlados e listas de assunto, e será uma gafe enorme indexar com o termo empoderamento, por exemplo, um livro de autoajuda ou similar que tenta se promover comercialmente em cima da visibilidade do conceito, induzindo pesquisador@s a erro. Nossa responsabilidade passa, também, por entender os contextos em que as obras que indexamos são criadas.

Apesar de terem esgotado rapidamente, ambos os livros foram republicados em nova editora recentemente e são vendidos a preços populares, então não há desculpa para ficar desatualizado. A hora é agora.

Fichas técnicas

Título: O que é empoderamento?

Autora: Joice Berth

Editora: Letramento e Justificando

ISBN: 978-85-9530-069-9

Ano: 2018

Páginas: 161

 

 

 

Título: O que é lugar de fala?

Autora: Djamila Ribeiro

Editora: Letramento e Justificando

ISBN: 978-85-953-004-08

Ano: 2017

Páginas: 112

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