Biblioo

Desisti da biblioteconomia

Lembro-me de um bibliotecário que desistiu da Biblioteconomia. Digo, um bibliotecário, já com certa experiência e relativo sucesso na carreira. Um belo dia, ele simplesmente desistiu de ser bibliotecário e foi seguir outra profissão. Estava infeliz. Foi ser feliz.

As pessoas entram na Biblioteconomia porque é fácil. O que é fácil normalmente não promete grandes compensações financeiras. Ninguém entra na Biblioteconomia pensando em ficar rico.

A Biblioteconomia é uma profissão de apaixonados. Quem entra e fica não se imagina fazendo qualquer outra coisa diferente do que faz, embora nunca tenha se imaginado fazendo o que faz antes de optar pelo curso de Biblioteconomia, simplesmente porque foi uma escolha fácil.

São muitos os relatos de “estou de saco cheio” das bibliotecas, bibliotecários e biblioteconomia, embora poucos se concretizem como uma efetiva separação da área. Mas esses casos de desistência da nossa profissão são reais. Na maior parte dos casos os bibliotecários largam as bibliotecas e vão trabalhar como vendedores de softwares ou com qualquer coisa relacionada à computação.

Salário é um motivo. Imagino que um vendedor da Elsevier ganhe mais do que alguém que trabalhe em uma biblioteca pública. Abrir uma consultoria dá trabalho, mas a pessoa certa, com a competência certa, pode se dar bem, construindo para si a flexibilidade no trabalho que normalmente não encontra em bibliotecas.

Desistentes reclamam que alguns salários pagos a bibliotecários são menores do que salários pagos a pessoas sem ensino superior. Um salário de R$ 3 mil pode parecer interessante para um bibliotecário de cidades pequenas ou do interior, mas não sustenta um bibliotecário e sua família em uma cidade como Rio ou São Paulo. Afinal, quatro anos de faculdade precisam se justificar.

A outra maneira de olhar para a desistência é que as pessoas que saem da profissão obviamente possuem habilidades relacionadas a outras áreas. Um arquiteto da informação é um arquiteto da informação, seja trabalhando em uma biblioteca ou em uma empresa de desenvolvimento web.

Mas ainda assim, em maior ou menor efeito, as empresas que contratam ex-bibliotecários costumam oferecer salários bastante similares ao que as bibliotecas oferecem para alguém com formação em Biblioteconomia.

A grande questão é: vale a pena tentar convencer as pessoas a não largar a Biblioteconomia? Acho que não.

De cara, pessoas frustradas vão continuar sendo pessoas frustradas. No caso das bibliotecas públicas, os salários baixos e a péssima estrutura de trabalho não vão melhorar no curto prazo. Se uma pessoa consegue desbravar melhores opções, bom pra ela. Espero sinceramente que seja feliz.

Claro que podemos nos perguntar: será que estamos perdendo talentos? Talvez sim, mas talento é o que não falta nos cursos de graduação. A cada ano, hordas de futuros bibliotecários aparecem e, dentre eles, muitos serão destaque. Cada vez mais pessoas interessantes leem sobre Biblioteconomia, sobre o mercado de trabalho, a oferta de concursos e decidem tentar a sorte na área.

Se essas pessoas desistirem da “Biblio” três anos depois de formadas, elas serão substituídas por outros jovens idealistas e, sobretudo, levarão alguma experiência da nossa área para as outras. É uma situação onde todos ganham.

E essas pessoas que desistem, elas amam as bibliotecas? Me parece que não. Algumas pessoas podem realmente gostar do conceito da biblioteca, da função social da profissão, até mesmo ser usuários de bibliotecas, mas tudo isso é bem diferente de trabalhar em uma biblioteca.

Porém, se elas são realmente apaixonadas por bibliotecas, elas tem a opção de não desistir e buscar algum trabalho relacionado à bibliotecas que lhes agrade. A gama de atividades é imensa e pessoas competentes com experiência tem grande chance de conseguir esses trabalhos.

Se as pessoas querem desistir da profissão, não faz muita diferença. A verdade é que existe uma longa lista de espera de outras pessoas que irão substituí-las. Em geral, muito mais pessoas estão buscando trabalho em bibliotecas do que pessoas desistindo desses trabalhos.

[tradução adaptada de Leaving the profession]

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