Galos brigavam ruidosamente no quintal. Galinhas entusiasmadas com a disputa voavam e gritavam histericamente de um lado para o outro. No pequeno cômodo da casa, seis redes estavam armadas e carregadas de corpos cansados de mais um dia de escola e trabalho.
No quintal, a mãe recolhia os ovos do galinheiro improvisado e laranjas da árvore frágil, encostada no muro com a ajuda de galhos amarrados. O almoço seria servido em poucos minutos: apenas omelete e chá de casca de laranja. A primeira refeição do dia.
Deitada no único colchão da casa, uma peça puída, coberta por retalhos e sem qualquer firmeza, Maria contava os pequenos santos de sua coleção. “Santo Expedito, Santa Ana, São Benedito, Santa Rita, Santo Afonso…”. Um por um, Maria os guardava meticulosamente na saboneteira antiga, improvisada para ser um relicário.
Aqueles santinhos eram a companhia de Maria. Quarto rebento de sete, a menina criava amigos imaginários e, ao mesmo tempo em que rezava para as miniaturas de santos, ela conversava, desabafava, sonhava. Contava sobre as dificuldades da vida – e como poderiam ser difíceis e dolorosas -, sussurrava sobre a ausência do pai, que tinha saído de casa por não tratar corretamente a mulher e os filhos, passando a maior parte do tempo embriagado, e falava sobre solidão. Maria se sentia só, mesmo entre tantos irmãos. Mas no meio do terreno árido dos sentimentos, a garotinha puxava do fundo da alma uma esperança inabalável. Com as mãos unidas em forma de concha, fazendo uma capela protetora para os seus minúsculos santos de gesso, Maria sussurrava confiante:
– A vida é muito mais do que dor e tristeza, meus amiguinhos. A vida também é beleza, alegria, contentamento e felicidade. Se, por alguma razão, minha existência se recusar a evoluir e ser melhor do que é, eu modelarei uma nova. Construirei meu próprio caminho.
Depois de contar todos os santos, Maria beijava-os e, fechando os olhos, agradecia a Deus por ter amigos tão especiais, sempre dispostos a ouvir tudo com um sorriso no rosto. Naqueles preciosos momentos do dia, ela não sentia o poder da solidão. Era apenas uma criança que tagarelava, sonhava e acreditava.
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