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Entre a conivência e a conveniência: reflexões sobre o caso Waack e o racismo à brasileira

Os comentários racistas de William Waack, durante a preparação para uma transmissão ao vivo, resultou no afastamento do jornalista da programação da Globo. Imagem: reprodução

Por me assumir e ser reconhecida como pesquisadora das questões étnico-raciais, sinto uma mini pressão para que eu me posicione sobre todo ato de racismo publicizado pela mídia. Se por um lado isso pode parecer positivo, por outro, me sinto um tanto desconfortável e tento manter a firme proposição de só falar algo quando eu realmente esteja apta a contribuir, pois não tenho embasamento teórico para tratar de todas as nuances e consequências do racismo.

Alguns vêm até a minha página esperando encontrar a minha opinião sobre o assunto do momento (agradeço pelo interesse, mesmo que seja apenas para rechaçar os meus argumentos ou pra comentar com colegas em comum que eu vejo racismo em tudo). Em respeito a alguns colegas queridos que me perguntaram sobre o caso do William Waack, pontuo as minhas reflexões:

  1. Racismo é crime e injúria racial também;
  2. A Globo não afastou William Waack por ele ser racista, a emissora apenas teve que se posicionar publicamente a respeito de uma fala que foi tornada pública (o seu caso deixa claro uma marca das relações sociais e raciais no Brasil: pode até fazer errado, mas não se deixe apanhar publicamente);
  3. William Waack pode até cultivar um pensamento racista, mas como homem público, não tem o direito de usar o seu lugar de fala para transparecer o que o “cidadão” Waack acredita;
  4. Poucos prestaram a atenção no colega que dialoga com Waack e sorri conivente com os comentários (a conivência e a conveniência são marcas bem típicas do racismo à brasileira);
  5. Incrível a rapidez com que muitos “cidadãos de bem” tentaram desqualificar o debate criando hastags de apoio como #écoisadebranco #semwaacknumdá;
  6. A branquitude tem um corporativismo que vem a tona rapidamente: são brancos todos os jornalistas que tentaram minimizar a fala do Waack evocando seu currículo e dizendo que a divulgação do vídeo é no fundo, fruto da inveja;
  7. Para transformar o culpado em vítima, houve uma cassada rápida para descobrir quem deixou o vídeo vazar. Em menos de 24h o rapaz (que é negro) foi encontrado e tem sido acusado de tentar se promover. Já há quem diga que ao divulgar o vídeo ele enterrou de vez sua carreira no meio jornalístico (oi? quem mesmo que cometeu o crime?);
  8. Os comentários de Waack não refletem um pensamento isolado. Ao longo da minha vida ouvi inúmeras vezes a expressão “é coisa de preto”, e quando eu repreendo ou convido alguém do meu convívio que falou algo assim a pensar sobre a carga negativa que essa expressão carrega… a situação fica pior quando o indivíduo me fita e dispara: “mas você num é preta!”;
  9. Apesar de alguns continuarem tentando manter o véu da pretensa democracia racial, em épocas de redes sociais, a pisada de bola de racista enrustido não passa mais despercebida (estamos avançando!);
  10. Muitos têm medo de fazer o enfrentamento do racismo por receio de se perceber como portador de discursos e práticas racistas, mas fingir que o problema não existe, não cola mais meeeesmo. Migos, vamos sair da zona de conforto. Não dá mais para calar, temos que falar, dialogar, desconstruir, mas, sobretudo, temos que estar dispostos a pensar estratégias de mudanças;
  11. Ao tentar fazer caça as bruxas e polarizar o debate entre “bons e maus” estamos perdendo – mais uma vez – a possibilidade de refletir seriamente sobre as causas e desdobramentos do racismo estrutural que permeia mentes e ações neste pais;

Sempre aberta ao diálogo respeitoso, vivendo um dia de cada vez, me preservando quando possível, sigo sobrevivendo nesse país que se recusa a reconhecer e refletir sobre suas contradições. Geralmente as minhas postagens sobre questões raciais não são muito “curtidas”, mas me dou por satisfeita de se a leitura desse texto te fizer pensar sobre a realidade a sua volta.

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