Como já é tradição, a Biblioo divulga a lista dos fatos que sua equipe considera como aqueles que marcaram a cultura informacional em 2021. Como não poderia ser diferente, num ano marcado pela devastadora segunda onda da Covid-19, que já matou quase 700 mil brasileiros, as políticas públicas de livro, leitura e bibliotecas continuaram pífias. Some-se a isso o negacionismo que tomou conta da Cultura, onde, dos diversos setores da área, como Fundação Palmares, Ancine, Cinemateca Brasileira, Funart etc., se multiplicam notícias de desmonte e descaso.
Conforme mostramos, a Lei Rouanet (Lei nº 8.313/1991), que institui o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), que tem sido um espécie de saco de pancadas do bolsonarismo desde a campanha que elegeu seu mestre, continua sendo muito atacada. Em 2021 as instituições culturais continuaram agonizando não só porque não têm recursos, mas porque se sentem cada vez mais asfixiadas por uma política, uma “guerra cultural”, que pretende destruir tudo que não esteja de acordo com os desmandos de Bolsonaro.
Veja abaixo a lista que preparamos:
1) Sai uma bibliotecária, entra um bacharel em Direito na direção do Arquivo Nacional
No Arquivo Nacional, órgão subordinado ao Ministro da Justiça e Segurança Pública, a bibliotecária Neide de Sordi cedeu, em novembro, lugar ao bacharel em Direito, sem nenhuma experiência no ramo, Ricardo Borda D’agua de Almeida Braga. Conforme mostrou a Biblioo, a troca indica mais um capítulo que coloca o órgão central do Sistema de Gestão de Documentos de Arquivo (SIGA), da administração pública federal do Brasil, no centro de uma disputa política que remete ainda ao governo da então presidenta Dilma Rousseff.
2) ABL elege o médico Paulo Niemeyer Filho e ignora o escritor indígena Daniel Munduruku
Em novembro, a Academia Brasileira de Letras (ABL) elegeu o novo ocupante da cadeira 12, antes ocupada por Alfredo Bosi, falecido no dia 7 de abril deste ano. O vencedor foi o médico Paulo Niemeyer Filho, que praticamente não tem nenhuma produção literária. A eleição de Niemeyer Filho frustrou as pretensões do escritor indígena, Daniel Munduruku, que pleiteava a cadeira fundada por Urbano Duarte e que tinha como patrono França Júnior. Munduruku era apoiado por mais de 100 escritores, que assinaram um manifesto a seu favor e sua indicação fazia parte de um movimento crescente que cobra maior diversidade na instituição.
Além de Niemeyer Filho, os novos imortais eleitos em 2021 foram: a atriz Fernanda Montenegro, para a cadeira 17, que foi do jurista Afonso Arinos de Mello Franco; o compositor e ex-ministro da Cultura Gilberto Gil, para a cadeira 20, ocupada anteriormente pelo jornalista Murilo Melo Filho; o romancista e advogado José Paulo Cavalcanti, para a cadeira 39, do ex-vice-presidente da República, Marco Maciel, e o escritor, professor e economista Eduardo Giannetti, para a Cadeira 2, na sucessão do Acadêmico Tarcísio Padilha.
3) Fundação Palmares cria “acervo da vergonha” para obras que considera “comunistas”
Em agosto, o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, anunciou a criação do “acervo da vergonha” para reunir as obras que considera de esquerda. Em de junho, o presidente da instituição havia publicou o documento “Retrato do Acervo – a dominação marxista na Fundação Cultural Palmares- 1988-2019”, que cataloga itens como “militante”, “não militante” e “francamente marxista”, foto que gerou uma grande repercussão política e jurídica.
4) Mapeamento mostra poucos estados e municípios comprometidos com as políticas de livro e leitura
Em todo o país, 12 estados e 153 municípios possuem planos de leitura ou estão em fase de construção. É o que apontou o Mapeamento dos Planos de Leitura no Brasil produzido pela Rede LEQT– Leitura e Escrita de Qualidade para Todos, divulgado em junho deste ano. A iniciativa contou com a consultoria de José Castilho Marques Neto e Renata Costa, especialistas e referências reconhecidas no tema e que ocuparam a secretaria executiva do PNLL entre 2006 e 2011 e 2017 e 2019, respectivamente. A pesquisa foi conduzida com o apoio dos integrantes da Rede LEQT e de seus Grupos de Trabalho, em especial o GT Territórios.
Entre os 18 estados respondentes, seis deles afirmaram que possuem planos estaduais de leitura: Ceará, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Tocantins. Destes, apenas o Ceará está com sua lei em tramitação. Outros seis estão em processo de construção, em direção ao fortalecimento de suas políticas estaduais: Acre, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraíba, Rio Grande do Norte e Sergipe. Entre os estados que não possuem plano e não estão em fase de construção estão: Goiás, Alagoas, Bahia, Maranhão, Piauí e Espírito Santo.
Sobre a participação da sociedade na construção dos planos, 61,1% dos respondentes informaram que seus estados realizaram audiências públicas ou indicam que há intenção de que elas aconteçam, o que permite supor que as assembleias legislativas também estão acompanhando esses processos.
5) Bibliotecas prisionais são incluídas em resolução do CNJ sobre remição de pena pela leitura
Uma Resolução, aprovada pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em maio, prevê que terão direito à remição de pena pela leitura as pessoas privadas de liberdade que comprovarem a leitura de qualquer obra literária, independentemente de participação em projetos ou de lista prévia de títulos autorizados, considerando-se que a atividade de leitura será realizada com as obras literárias constantes no acervo bibliográfico da biblioteca da unidade de privação de liberdade.
A Resolução foi fruto do grupo de trabalho responsável pela elaboração de Plano Nacional de Fomento à Leitura nos Ambientes de Privação de Liberdade (Portaria CNJ 204/2020) e de Plano Nacional de Fomento ao Esporte e Lazer no Sistema Prisional (Portaria CNJ 205/2020), que contou com a participação de organizações da sociedade civil, como a Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários (FEBAB), representada pelas bibliotecárias Cátia Lindemann e Adriana Ferrari.
6) Escritores e demais intelectuais mortos em decorrência da Covid-19
Os escritores e outros intelectuais não passaram incólumes à devastação promovida pela pandemia de Covid no ano de 2021. Dentre as vítimas estão: Alfredo Bosi, escritor e ensaísta, que morreu na quarta-feira, 7 de abril, aos 84 anos, em São Paulo; Nani, escritor e cartunista, que morreu na sexta-feira, 8 de outubro, aos 70 anos, em Belo Horizonte; Roberto Romano, escritor e filósofo, que morreu na quinta-feira, dia 22 de julho, aos 75 anos, em São Paulo; José Antônio Severo, escritor e jornalista, que morreu na sexta-feira, dia 24 de setembro, aos 79 anos.
7) UFRJ concede título de Doutora Honoris Causa à escritora Carolina Maria de Jesus
A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) concedeu, postumamente, em fevereiro, o título de Doutora Honoris Causa à escritora Carolina Maria de Jesus. A honraria Honoris Causa, que significa “por causa de honra”, é concedida independentemente da instrução educacional a quem se destacou por suas virtudes, méritos ou atitudes. O agraciado passa a desfrutar dos mesmos privilégios daqueles que concluíram um doutorado acadêmico convencional. A reitora da UFRJ, Denise Pires de Carvalho, parabenizou a Universidade pela decisão. “Com muito júbilo, tenho a satisfação de ser a reitora neste momento histórico da concessão deste título. Ter o meu nome associado ao de Carolina de Jesus de forma indelével é uma grande honra”, afirmou.
8) Incêndio destrói galpão da Cinemateca Brasileira
Um incêndio destruiu, em julho, um galpão da Cinemateca Brasileira em São Paulo. O prédio continha cerca de 2 mil cópias de filmes e o incidente foi considerado por profissionais do audiovisual uma “tragédia anunciada”. O assunto foi tema da edição 79 da Revista Biblioo por ter se constituído como uma espécie de síntese do crescente descaso do governo Jair Bolsonaro com as políticas culturais no Brasil.
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