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Sucesso de público, Salão Carioca do Livro garantirá sobrevida às bibliotecas-parque?

Ziraldo foi um dos homenageados do LER. Foto: divulgação

Economista por formação e escritor nos finais de semana, Celso Possas Júnior trabalhou por 32 anos em uma multinacional, mas há 2 resolveu largar o emprego para se dedicar exclusivamente à escrita. Para isso, abriu sua própria editora, a Itapuca, que já publicou 18 livros, dos quais oito são de sua própria autoria. Celso e sua editora são dois das dezenas de escritores e expositores que passaram pelo “LER – Salão Carioca do Livro”, que agitou a Biblioteca-Parque Estadual no Rio durante quatro dias.

“Eu estou surpreso. O evento está espetacular. O último já foi muito bacana. Aqui na Biblioteca tem um ar, uma atmosfera mais bacana ainda. Porque estamos todos numa biblioteca pública, que é uma coisa grandiosa, é uma coisa importante. O evento está um sucesso de público. Uma gente bacana, gente alegre, comprando livros, gente que gosta de livros. Foi muito melhor do que eu esperava”, elogiou o escritor.

Sobre suas obras, Celso explica que estas são sempre em torno de algum mistério. “Um é sobre espionagem na Segunda Guerra envolvendo irmãos brasileiros. O outro, uma trama de mistério ligando a uma antiga profecia. Tem três livros policiais, no estilo ‘quem matou’, que é o [exemplo] do ‘Véu do Diábo’, onde um jovem trans é assinado numa pequena cidade e o investigador tenta descobrir: ‘Será se foi um crime de intolerância? Será se foi um amante secreto? Será se foi outra coisa?’. ‘A Farsa de Ártemis’, meu principal livro, em torno de uma teoria da conspiração, uma jornalista descobre algo que não devia e desencadeia uma trama que não para mais”, descreve o autor.

Celso Possas Junior se dedica à literatura policial e de mistérios. Foto: divulgação

Com dificuldades para vender seus livros, Eberton Ferreira resolveu se dedicar aos quadrinhos criando personagens que dialogam com a cultura e a mitologia brasileira. “Eu tive muitas dificuldades para vender livros, mas quadrinhos a linguagem é diferenciada, ela é escrita, mas ela também é uma linguagem que envolve cenas, desenhos. Isso faz com que as pessoal tenham um pouco mais de vontade e curiosidade de conhcer”, explica Eberton que levou os seus trabalhos para serem expostos e comercializados na LER.

O trabalho com os quadrinhos tem rendido à Eberton retornos positivos. Ano passado, por exemplo, a Academia Brasileira de História em Quadrinhos (ABRAHQ) premiou o artista como melhor roteirista de 2016 com a obra “#Causos 2: A Bruxa da Floresta”, uma releitura do folclore brasileiro cheia de suspense e mistério.

Eberto mostra os seus trabalhos. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

“Eu estou trazendo a brasilidade para o marcado de quadrinhos o máximo que eu posso. Assim, meu carro-chefe é uma série chamada ‘Causos’, onde eu apresento um Bandeirantes, que no período do Brasil colonial, investiga uma série de crimes, mistérios, com aquela pegada que a gente conhece bem do Sherlock Holms [personagem do escritor britânico Sir Arthur Conan Doyle]”, orgulha-se.

A exemplo de Celso, Eberton avaliou o Salão de forma bastante positiva. “Está acima das minhas expectativas. A Biblioteca-Parque estava fechada e reabriu pra esse evento. Espero que ela continue crescendo e nós estamos realmente satisfeitos, pois o público está chegando, autores consagrados, ‘globais’, até, vieram […] Então achei que está sendo um momento importante pro Rio de Janeiro aqui no Salão Carioca do Livro”, avalia.

Quem esteve no LER, que terminou ontem (21), presenciou uma Biblioteca-Parque agitada, com programação para todas as idades e todos os gostos, com palestras, bate-papo com escritores, contação de históricas e muitas outras atividades. Pequenas e grandes editoras, bem como escritores consagrados e postulantes a escritores disputavam espaço nos três andares da BPE.

O público prestigiou escritores e editores no LER. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

A adesão ao evento foi crescente. Na quinta-feira (17), primeiro dia do evento, 10 mil pessoas haviam comparecido ao Salão, chegando a 15 mil pessoas na sexta-feira (18). No sábado cerca de 45 mil pessoas prestigiaram atividades como exposição dos trabalhos de Roger Mello, ganhador do Prêmio Internacional Hans Christian Andersen, dinâmicas literárias, sessões de autógrafos e muito mais. Os números do domingo ainda não haviam sido liberados pela organização até o fechamento desta reportagem.

A exposição dos trabalhos de Roger Mello foi um dos pontos altos do Salão. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

Para o bibliotecário e editor Vagner Amaro, a grandiosidade do evento, a extensão da programação e a participação de celebridades trouxe novamente uma questão já, segundo ele, um pouco antiga para quem atua na área de leitura e literatura, que é a distinção dentro do mercado cultural entre a leitura e a literatura na forma de eventos literários e na forma de atividades sistemáticas e de base para a formação dos leitores.

“Enquanto uma ainda consegue o interesse das empresas patrocinadoras a outra se mantém na margem do interesse dos governos e de empresas. Então, abrir a Biblioteca-Parque para o evento só fortalece a perplexidade pelo fato deste equipamento cultural importante para a formação de leitores e difusão do conhecimento ainda estar fechado, e aumenta a torcida para que o governo do estado retome este serviço, considerando a importância de se ter na equipe, para a gestão do espaço, profissionais qualificados que de fato possam reestabelecer os serviços de consulta, de empréstimos e de mediação da leitura e da informação e de mediação cultural”, defendeu.

Amaro é um dos editores da escritora Conceição Evaristo que oficializou durante o Salão a intervenção de concorrer a uma vaga na Academia Brasileira de Letras (ABL). “Eu quero. É um direito nosso, vou me inscrever na segunda-feira”, prometeu à escritora que conta com uma grande mobilização na internet, com uma petição alcançando mais de 16 mil assinaturas.

Conceição Evaristo anunciou durante o LER a intenção de concorrer à uma cadeira na ABL. Foto: divulgação

A plataforma digital de livros Estante Virtual foi convidada a participar como voluntária de uma ação no LER, arrecadando livros que serão doados ao Sistema Estadual de Bibliotecas do Rio de Janeiro (SEB/RJ). O resultado foi que 1.150 obras foram recebidas e serão direcionados para o Projeto Biblioteca do Quilombo da Tapera (Petrópolis/RJ), Biblioteca Solidária de Manguinhos (Rio de Janeiro/RJ) e Biblioteca Pública Municipal Doutor Maurício de Lacerda (Vassouras/RJ).

Estante Virtual arrecadou 1.150 livros para serem doados à bibliotecas. Foto: divulgação

Articuladas pela Rede Nacional (RNBC), parceira da Biblioo, as bibliotecas comunitárias também estiveram na LER mostrando o seu trabalho, principalmente no que se refere à formação de leitores.

As bibliotecas comunitárias também marcaram presença no LER. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

Foi também como parte da programação do 2º Salão Carioca do Livro que ocorreu a 11ª Plenária do Plano Estadual do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas do Rio de Janeiro – PELLLB/RJ (veja aqui). Durante a atividade, realizada no sábado (19), os membros do grupo de trabalho (GT) do PELLLB explicaram como se constituiu e como se organizar o GT que é formado por representantes dos poderes executivo, legislativo, bem como da sociedade civil nas cadeias criativa, produtiva e mediadora. “Nós fomos eleitos pela sociedade numa votação pela internet”, explicou Bárbara Caldas, escritora e membra do GT. No decorrer da Plenária foram recebidas demandas da sociedade civil para a construção do Plano.

“Palco Aberto” recebeu a Plenária do Plano Estadual do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas do Rio de Janeiro (PELLLB/RJ). Foto: Amanda Ribeiro

Reabertura da BPE

A LER marcou a reabertura provisória da Biblioteca-Parque Estadual, que estava fechada desde o final de 2016. A organização do evento garantiu os reparos necessários na infraestrutura da Biblioteca, como a recuperação dos aparelhos de ar-condicionado e dos elevadores, o que levou os evolvidos a cogitarem a possibilidade de estender a parceria até o final do ano.

“Nós estamos desenhando um movimento literário que ficaria até o final do ano. Estamos nas tratativas com o governo [do estado do Rio]. O governo está vendo de que forma viabilizar isso e estamos relacionando todo o legado que um evento, um movimento literário, que poderia acontecer até dezembro, que legado ele pode deixar mais ainda para essa biblioteca ficar permanentemente aberta”, disse à Biblioo Jerônimo Vargas, produtor do evento.

Vista externa da Biblioteca-Parque Estadual. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

O secretário estadual de Cultura do Rio, Leandro Monteiro, confirmou à Biblioo a intenção de manter a programação do LER na Biblioteca-Parque do Estado até dezembro, o que depende de um parecer da Procuradoria Geral do Estado. “A parceria nós estamos tentando organizar juridicamente. Eu tenho de pegar um parecer do procurador do estado para que a gente estique um pouco este prazo e leve também [a programação da LER] não só aqui para a Biblioteca-Parque do Centro da cidade, mas para Manguinhos e Rocinha”, afirmou.

O que também depende de um parecer da Procuradoria Geral do Estado é a cessão de parte do espaço da Biblioteca para a instalação do Centro de Memória da Eletricidade, uma instituição sem fins econômicos, criada em 1986, e mantida por várias empresas do setor elétrico brasileiro, entre elas a Eletrobras. Em nota enviada à Biblioo, a estatal informou que, ao contrário do que noticiamos antes, a cessão de um dos andares do prédio da instituição à Secretaria não está entre as contrapartidas da negociação.

“O Centro da Memória da Eletricidade no Brasil – Memória da Eletricidade é uma instituição sem fins econômicos, criada em 1986, e mantida por várias empresas do setor elétrico brasileiro, entre elas a Eletrobras. É essa a natureza da relação entre as duas entidades. A cessão do prédio da Biblioteca Parque Estadual (BPE) está sendo negociada entre a Memória da Eletricidade e a Secretaria de Estado de Cultura. O primeiro passo desse processo foi dado com a assinatura, em 17 de janeiro, de um Protocolo de Intenções entre as duas instituições”, diz a nota.

Moradores em situação de rua ocupam escadas de emergência da BPE. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

Ainda sobre a BPE, Monteiro informou que já foi finalizado o processo licitatório de contratação de uma empresa que ficará responsável pelo recrutamento de 56 profissionais que atuarão nas três unidades da rede sob a gestão do estado (A Biblioteca-Parque de Niterói está sob a responsabilidade da Prefeitura local). O quadro será completado por servidores da própria SEC que serão deslocados, conforme já está acontecendo na Rocinha e em Manguinhos.

Mas apesar das promessas do governo, pairam incertezas sobre o processo de reabertura da BPE, o que foi criticado pela presidente do Sindicato dos Bibliotecários do Estado do Rio (SINBD/RJ), Luciana Manta. “Eu faço aqui um apelo para que a biblioteca seja reaberta e reaberta com profissionais à frente e não com professores”, disse Luciana se referindo à uma antiga promessa da governo de reabrir as bibliotecas-parque com profissionais da área da educação, o que acabou não se realizando.

Perguntado sobre a Biblioteca-Parque do Alemão, localizada na Estação das Palmeiras, a última do teleférico do Alemão (unidade que nunca funcionou plenamente), Monteiro confirmou a intenção de reabri-la, mas em um outro imóvel. “A questão da Biblioteca-Parque do Alemão é a questão do Teleférico não está funcionando. Então nós estamos procurando um outro imóvel do estado para que nós possamos transferir para esse novo imóvel, essa nova Biblioteca do Alemão”, esclareceu o secretário.

Independentemente das parcerias (com o LER ou com a Eletrobrás), o governo promete finalizar o processo licitatória de contratação da empresa que recrutará os profissionais e reabrir a BPE até o fim deste mês. E conforme já informamos, a Biblioo indagou à Secretaria sobre a qualificação dos profissionais que serão contratados, mas não obtivemos resposta.

Veja abaixo algumas imagens do evento:

Espaço “a mulher na literatura brasileira”. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

O “Sarau” recebeu dezenas de poetas da Baixada Fluminense. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

No espaço das editoras, a Malê apresentou seu catálogo dedicado à literatura afro-brasileira. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

A Amazon, maior editora do mundo, também esteve no LER. Foto: Chico de Paula / Agência Biblioo

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