Um decreto publicado no diário oficial do município de São Paulo, edição do último dia 22, pode limitar a participação da sociedade civil na execução do Plano Municipal de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas (PMLLLB/SP). De acordo com o regulamento, os representantes da sociedade civil no Conselho, que tem por finalidade acompanhar a execução do Plano, “serão escolhidos pelo titular da Secretaria Municipal de Cultura”, ou seja, o secretário municipal de Cultura, cargo hoje ocupado por Andre Sturm, cuja relação com os coletivos culturais tem sido bastante conturbada.
O decreto editado pelo prefeito de São Paulo, João Dória, revoga um outro decreto, editado no ano passado pelo então prefeito Fernando Haddad, segundo o qual os representantes da sociedade civil deveriam ser eleitos dentre cidadãos residentes no município de São Paulo que atuam nas áreas do livro, leitura, literatura e biblioteca. Por este regulamento, a eleição dos representantes da sociedade civil seria conduzida por Comissão Eleitoral, que elaboraria o regulamento para a realização do processo eleitoral.
Inclusive o primeiro processo eleitoral para o Conselho do PMLLLB/SP, que agora pode ser destituído, já havia ocorrido, sendo os representantes empossados no final do ano passado, conforme noticiou a Biblioo. Vale destacar que além dos oito representantes da sociedade civil, o Conselho do PMLLLB/SP também é composto de duas pessoas oriundas da Secretaria Municipal de Cultura, duas da Secretaria Municipal de Educação e mais duas da Câmara Municipal de São Paulo, totalizando quatorze membros.
Para Ricardo Queiroz, bibliotecário e representante da Câmara Municipal junto ao Conselho do PMLLLB/SP, o novo decreto altera o grande diferencial do PMLLLB/SP, que é a participação popular na construção do Plano. “Uma coisa são os membros da sociedade civil escolhidos por uma eleição aberta a quem quiser concorrer, outra coisa é a escolha desses membros ser feita pelo titular da Secretaria Municipal de Cultura […] A mudança altera a essência do PMLLLB e empastela a participação popular”, reclama Ricardo.
Segundo o bibliotecário, que defendeu recentemente uma dissertação de mestrado acerca do tema da participação social na construção do PMLLLB de São Paulo, os diversos segmentos do livro e leitura estiveram sempre acostumados a lutar num espaço próprio, mas a construção do Plano propiciou a esses segmentos uma luta conjunta. “Além de expor contradições, deixou claras as convergências. Quanto à relação Estado e sociedade civil ela sempre vem carregada de contradições e conflitos, mas o PMLLLB mostrou que é possível e salutar o diálogo”, defendeu.
De acordo com Ruivo Lopes, que atuou no grupo de trabalho que elaborou o PMLLLB/SP, mais do que limitar a participação da sociedade civil no Plano, o decreto de Dória anula a participação social na gestão das políticas públicas. Para ele, a gestão municipal subestima a capacidade dos representantes da sociedade civil em propor, melhorar ou acompanhar as decisões tomadas unilateralmente pelo governo.
“O decreto do atual prefeito que revoga a eleição democrática dos representantes da sociedade civil para o Conselho do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca é prova disso [da forma truculenta do PSDB governar São Paulo]. O decreto autoriza o secretário de Cultura escolher unilateralmente representantes para o Conselho como cartas marcadas. É um golpe no processo democrático de elaboração do PMLLB em São Paulo!”, desabafa Ruivo.
Como a participação social está prevista na Constituição Federal, Ruivo considera que qualquer iniciativa contrária, a exemplo desta adotada pelo prefeito paulista, é anticonstitucional.
A Biblioo procurou a Prefeitura de São Paulo e indagou sobre a possível limitação que a medida pode trazer a participação da sociedade civil no processo de construção das políticas públicas das áreas de livro, leitura, literatura e bibliotecas. Em resposta por meio de sua assessoria de imprensa, a administração pública municipal informou que o objetivo do decreto “é impulsionar o Conselho para que [ele] seja efetivamente ativo e contribua para a implantação ampla do PMLLB. Por este motivo, ele abre, ainda, a possibilidade de pessoas especializadas nos assuntos relacionados à finalidade do Conselho e representantes de órgãos e entidades públicas e privadas, tornando-o mais participativo.”
*Esta reportagem foi atualizada as 20h36 de 25 de julho de 2017 para acrescentar a resposta da Prefeitura de São Paulo.
Comentários
Comentários