A censura no Brasil é coisa das mais antigas, chegando certamente com os portugueses no século XVI. Razão do surgimento tardio da imprensa no Brasil, com a publicação continuada de livros, jornais e revistas acontecendo apenas a partir de 1808, com a vinda da família real para a colônia. Na música, a censura também se fez presente em vários momentos históricos do país, sendo uma das medidas de repressão às ideias mais usada nos períodos autoritários.
No governo de Getúlio Vargas, principalmente no Estado Novo (1937-1945), houve um amplo controle sobre as artes e a cultura, com destaque para aquele exercido sobre o samba. Posteriormente, a Ditadura Militar herdaria a legislação da censura moral exercida pelo governo Vargas, usando-a como ferramenta de controle político e da manutenção do status quo.
Recentemente, temos visto uma crescente onda repressora, com traços ideológicos similares aos que pairavam no governo militar, resultando em ataques às manifestações artísticas e literárias sob a desculpa da preservação da moral e dos bons costumes e também a partir da sensibilidade de um governo que não pode se ver criticado. Se configurando em um movimento que acorda o fantasma da censura e novamente volta a ameaçar a cultura e consequentemente a música nacional.
No governo Vargas a vadiagem e aversão ao trabalho presente na vertente musical chamada samba-malandro foi amplamente combatida. Pois, ao alçar o samba à condição de ícone cultural da nação, era necessário lapidar e polir aquilo que não condizia com o projeto de governo. Visto que, a partir do processo de industrialização e da consolidação das leis trabalhistas, a imagem desejada pelo Estado era de um Brasil constituído de trabalhadores de todas as classes, onde não era bem quista a celebração à malandragem.
Um exemplo desta condição é a censura exercida pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) na música Bonde de São Januário, composta por Wilson Batista em 1940, que na versão original dizia: “O Bonde São Januário / leva mais um otário / que vai indo trabalhar”, e que teve que ser modificada para “O Bonde São Januário / leva mais um operário / sou eu que vou trabalhar”.
Além da malandragem era proibido também tratar da luta de classes, já que a propaganda governamental falava de apaziguamento nacional nesse sentido. Por isso, foi censurada a música Poleiro de pato é no chão, de Rubens Soares e Mário Lago, que apesar de já ter aparecido no filme Céu Azul, na hora da gravação teve os versos “ai, ai, ai/ a vida do pobre é penar/ ai, ai, ai/ a vida do rico é gozar” cortados pelos censores.
A censura no governo Vargas, no entanto, não se atinha apenas as questões que desafiavam ou contrastavam com a proposta política varguista, mas também tinha outros caprichos. Por exemplo, geralmente era vetado o uso da palavra Deus nos títulos das canções, assim como foi vetado o uso do nome próprio daquela que encomendou a canção Botões de Laranjeira, composta por Pedro Caetano em 1952. A moça que se chamava Maria Madalena de Assunção Pereira viu seu nome ser adaptado para a música por conta da censura, aparecendo como Maria Madalena dos Anzóis Pereira.
Na Ditadura Militar, assim como no Estado Novo, as músicas que eram contrárias às políticas desenvolvimentistas do governo eram censuradas. Como exemplos desta abordagem da censura temos as músicas: Tiro ao Álvaro, de Adoniran Barbosa e Uma vida só (pare de tomar a pílula), de Odair José, ambas de 1973.
A primeira, pelos seus erros de português e linguagem coloquial, podia de alguma forma ser vista como contrária à proposta governamental de aumento das taxas de alfabetização por meio do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), sendo considerada pelos censores como uma música de mal gosto por usar as palavras “tauba”, “revorve” e “artormove”. Já a segunda ia de encontro com a campanha governamental para controle de natalidade.
Durante o governo militar foi intensa a censura política às músicas de protesto, ocasionando em canções proibidas e músicos perseguidos, presos e exilados. A música Geléia Geral, de Gilberto Gil e Torquanto Neto, de 1968 foi proibida pelos censores por seu conteúdo retratar o contexto político brasileiro de forma equivocada, na visão dos censores, levando Gil a ser preso naquele mesmo ano.
Já a música Calabouço, de Sérgio Ricardo, de 1973, fazia referência à censura que o artista vinha recebendo, presente nos trechos: Cala a boca moço/ cala a boca moço/ Eis o lixo do meu canto/ Que é permitido escutar/ Cala a boca moço. Fala! Enquanto ao mesmo tempo em seu título e na letra a palavra calabouço era citação direta ao nome do restaurante na cidade do Rio de Janeiro, onde o estudante secundarista, Edson Luís, havia sido assassinado por policiais militares durante manifestação estudantil.
Chico Buarque, Gonzaguinha e Taiguara estão entre os artistas que tiveram muitas das suas canções censuradas. O primeiro teve inclusive que criar um pseudônimo, Julinho da Adelaide, para tentar burlar a censura, após algumas de suas músicas, como Cálice e Apesar de você terem sido proibidas. Gonzaguinha teve 54 músicas suas vetadas, entre elas Comportamento Geral, que foi proibida de radiodifusão, gerando uma curiosidade nos ouvintes que alavancou as vendas do álbum. Já Taiguara teve 68 canções censuradas.
Apesar de menos comentada no contexto musical, também houve muita censura moral às canções, na Ditadura Militar. Pois, este tipo de censura era a especialidade da Divisão de Censura de Diversões Públicas, para onde as letras das músicas deviam ser enviadas para análise. De modo que, neste órgão oficial de censura havia uma listagem com as palavras consideradas obscenas que eram proibidas, servindo de orientação aos cortes em nome da moral e dos bons costumes.
A censura moral atingiu principalmente o rock dos anos 1980, se mantendo até mesmo após o fim do regime em 1985. Caso emblemático deste tipo de perseguição foi o veto feito às músicas Cruel cruel esquizofrênico blues e Ela quer morar comigo na lua, da banda Blitz, por apresentar as palavras “peru” e “bundando”. Ambas foram prensadas riscadas no álbum As aventuras da Blitz, de 1982. Ou seja, elas estavam presentes no LP, mas não podiam ser ouvidas por causa dos riscos.
Em 1986 a música Rubens, da banda Premeditando o Breque (Premê) seria censurada por falar de uma relação amorosa entre pessoas do mesmo sexo, e em 1987 a Legião Urbana teria a música Faroeste Caboclo censurada por apresentar “expressões empregadas por viciados” e “expressões vulgares” como: “tem bagulho bom aí”, “o Jeremias, maconheiro sem vergonha, organizou a rockonha…”, “comia todas as menininhas da cidade”, “com o cu-na-mão”.
Recentemente temos visto uma onda crescente de conservadorismo no país que tem se traduzido na censura de cunho moral e político de algumas manifestações artísticas. Assim como o samba foi perseguido enquanto manifestação cultural vindo da periferia, com temas relacionados à realidade do contexto social de sua origem, hoje vemos o funk questionado a partir de um viés moral, estigmatizado como música de apologia à violência e que induz à sexualização precoce de crianças e adolescentes.
Nesse sentido, na cidade de Itabirito-MG o prefeito publicou decreto que proibia que fossem tocadas no carnaval de 2020, em blocos, trios e palcos, “músicas definidas como funk e, de quaisquer estilos, que incitam a violência, façam apologia a drogas, ao sexo, a injúrias raciais e que contribuam para a alteração do comportamento humano”, sendo o funk o único estilo musical descrito expressamente.
Também no carnaval de 2020, em Recife-PE, a banda Janete saiu para beber denunciou que policiais militares invadiram seu show e questionaram as músicas que a banda estava tocando, exigindo o encerramento da apresentação e ameaçando o vocalista de prisão por desacato a autoridade e injúria. Esse comportamento dos policiais aconteceu após a banda tocar a música Banditismo por uma questão de classe, de Chico Science e Nação Zumbi, de 1994, onde há um trecho que diz “Em cada morro uma história diferente / que a polícia mata gente inocente”. A banda ainda relatou que o grupo Devotos e o cantor China passaram por situações parecidas, ambos no dia 25 de fevereiro de 2020.
Todas as músicas mencionadas no texto e outras mais fazem parte de uma playlist com 42 músicas censuradas no Estado Novo, Ditadura Militar e em 2020. A pedido do bibliotecário Raphael Cavalcante, criador do Biblioteco, podcast progressista de Biblioteconomia [acesse o podcast], eu selecionei essas canções no intuito de divertir o público do canal e ao mesmo tempo manter a memória da censura musical no país. Afinal, não existe papo de boteco sem música!
Apesar de estar longe de ser uma lista completa sobre censura no país, ela foi pensada em atingir um público diversificado, com a reunião de exemplares de diversos estilos musicais, como o samba, a MPB e o rock nacional [acesse a playlist no Spotify clicando aqui ou no Deezer clicando aqui]. Espero que curtam e que se mantenham atentos e combatentes ao autoritarismo! Abaixo a lista completa das músicas censuradas durantes os períodos das ditaduras Vargas e Militar, acompanha de importantes referências sobre o tema.
O bonde de São Januário (1937), Wilson Batista
Diante da política do Estado Novo de exaltação do trabalho como forma de engrandecimento moral e social, muitos dos sambas que tratavam do ócio e falavam mal do trabalho eram censurados. Originalmente a letra desta canção dizia: “O bonde de São Januário/leva mais um sócio otário/só eu não vou trabalhar”. O DIP determinou que a letra fosse modificada, ficando esse trecho: “O Bonde de São Januário leva mais um operário/Sou eu que vou trabalhar”.
Poleiro de pato é no chão (1941), Rubens Soares e Mário Lago
Como o Estado Nacional alardeava o estancamento da luta de classes, tudo que sugerisse o contrário não seria tolerado. Desta forma, esta canção foi censurada na hora da gravação, mesmo já tendo aparecido no filme musical Céu Azul. Os versos “ai, ai, ai/ a vida do pobre é penar/ ai, ai, ai, a vida do rico é gozar” foram vetados pelos censores.
Botões de Laranjeira (1942), Pedro Caetano
No Estado Novo o uso da palavra Deus na letra ou no título das músicas não era tolerado, por equivaler ao uso do santo nome em vão. Neste mesmo sentido, também proibiam o uso de nomes próprios e por isso esta canção, que foi feita sob encomenda, não pôde falar o nome de Maria Madalena de Assunção Pereira. Para a gravação, o compositor modificou a letra para Maria Madalena dos Anzóis Pereira, passando assim pela censura.
Opinião (1964), Zé Keti
A canção foi censurada por ir contra a ideia do governo de derrubar as favelas, virando palavras de resistência. O compositor a regravou em 1970.
Letra: “Podem me prender / Podem me bater / Podem, até deixar-me sem comer / Que eu não mudo de opinião / Daqui do morro / Eu não saio, não”
Acender as velas (1965), Zé Keti
A canção foi censurada por fazer uma denuncia das más condições de vida nas favelas na década de 1960.
Letra: Acender as velas/ Já é profissão/ Quando não tem samba/ Tem desilusão […]/ O doutor chegou tarde demais/ Porque no morro/ Não tem automóvel pra subir/ Não tem telefone pra chamar/ E não tem beleza pra se ver/ E a gente morre sem querer morrer
É proibido proibir (1968), Caetano Veloso
Durante a eliminatória paulista do Festiva Internacional da Canção de 1968 a música que trazia o slogan do movimento estudantil francês, foi desclassificada e recebeu vaias da plateia, que virou as costas para o palco.
Geléia Geral (1968), Gilberto Gil e Torquato Neto
A canção foi proibida, pois os censores alegavam que seu conteúdo contestava a política da época e retratava de forma equivocada a situação do Brasil naquele momento. Esta parceria entre Gil e Torquato Neto acabou provocando a ira dos censores e fazendo com que Gil fosse preso naquele ano.
Pra Não Dizer que Não Falei das Flores (1968), Geraldo Vandré
Esta canção que se tornou hino de resistência contra a Ditadura Militar foi censurada de várias formas. Foi proibida de ser apresentada em programa da TV Globo, além de não receber o prêmio de melhor canção no Festival Internacional da Canção de 1968, a mando do governo, sendo proibida definitivamente por trazer “ofensas” ao exército.
Apesar de Você (1970), Chico Buarque
Em um primeiro momento a música foi liberada, mas após a Tribuna da Imprensa comentar o seu caráter político, ela foi censurada. Apesar de Chico ter dito que ela era sobre uma mulher mandona, o significado escondido foi decifrado, fazendo com que a polícia invadisse a gravadora e destruísse todas as cópias. Porém, esqueceram da matriz.
Letra: “Hoje você é quem manda / Falou, tá falado / Não tem discussão / A minha gente hoje anda / Falando de lado / E olhando pro chão, viu / Você que inventou esse estado / E inventou de inventar / Toda a escuridão / Você que inventou o pecado / Esqueceu-se de inventar / O perdão / Apesar de você / Amanhã há de ser / Outro dia”
Comportamento geral (1972), Gonzaguinha
Filho de Luiz Gonzaga, Gonzaguinha causou revolta nos jurados do programa de Flávio Cavalcanti, por causa do conteúdo contestatório da música. A canção foi proibida de execução nas rádios, fato que ajudou a alavancar a venda dos LPs em que ela saiu. Ao todo o artista teve 54 músicas vetadas pela ditadura militar.
Calabouço (1973?), Sérgio Ricardo
A canção faz referência ao assassinato do estudante secundarista Edson Luís em 1968 pelos militares, no restaurante Calabouço, na cidade do Rio de Janeiro. Além, de tratar das censuras que o autor vinha recebendo. Por estes motivos a obra foi censurada.
Letra: Cala a boca moço/ cala a boca moço/ Eis o lixo do meu canto/ Que é permitido escutar/ Cala a boca moço. Fala! […]/ Cala o peito, cala o beiço/ Calabouço, calabouço/ Olha o vazio nas almas/ Olha um brasileiro de alma vazia.
Cálice (1973), Chico Buarque e Gilberto Gil
A música foi composta para o festival musical Phono 73, promovido pela Phonogram (atual Universal). A censura havia recomendado que a música não fosse cantada, pois o refrão fazia uma denúncia sobre a mordaça do governo, com “afasta de mim esse cálice (cale-se)”. Gil e Chico cantaram apenas a melodia da canção e pontuaram a palavra cálice e por isso tiveram os microfones desligados. A música só seria liberada em 1978.
Check up (1973), Raul Seixas
A canção foi censurada por fazer referência a tranquilizantes que resultam em dependência física, sendo seu conteúdo inconveniente. Por isso, Raul teve que substituir as palavras “Diempax” por “Quilindrox”, “Valium 10” por “discomel” e “Triptanol 25” por “ploct lus 25”. Provavelmente a censura interferiu tanto na letra, que o cantor só a gravou quinze anos mais tarde.
Deus e o diabo (1973), Caetano Veloso
O trecho “dos bofes do meu Brasil” foi trocado por “os pulmões do meu Brasil” devido ao sentido pejorativo da sentença, conforme anotação manuscrita do censor.
Eu quero é botar meu bloco na rua (1973), Sérgio Sampaio
A música foi censurada por incitar o povo contra os militares, por levar o “bloco na rua” para confrontá-los.
Jorge Maravilha (1973), Chico Buarque
Como todas as músicas de Chico eram censuradas automaticamente, ele enviou esta canção à censura sob o pseudônimo de Julinho da Adelaide. A princípio foi liberada, mas depois foi censurada a partir de uma matéria que saiu no Jornal do Brasil. A partir de então, as composições submetidas à censura deviam vir com RG e CPF do compositor. A parte que diz “você não gosta de mim, mas sua filha gosta” foi interpretada por alguns como uma provocação ao Geisel, pois sua filha havia declarado publicamente amar o Chico. Contudo, o músico disse que foi por causa de uma vez que foi levado ao DOPS e um policial o pediu um autógrafo para sua filha.
Hoje É Dia de El-Rey (1973), Milton Nascimento e Dorival Caymmi
O censor julgou a música com “conteúdo nitidamente político”, motivo do seu impedimento.
Letra: “Filho, meu ódio você tem / Mas El Rey quer viver só de amor / Sem clarins sem mais tambor/ Vá dizer: nosso dia é de amor / [Filho:] Juntai as muitas mentiras / jogai os soldados na rua / nada sabeis desta terra / hoje é o dia da lua / Leva daqui tuas armas / então cantar poderia / mas nos teus campos de guerra / hoje morreu poesia.”
Óculos escuros (1973), Raul Seixas
Óculos escuros tinha na sua versão original várias críticas ao governo militar, presentes nos trechos: “quem não tem presente se contenta com o futuro”; “quem não tem papel dá o recado pelo muro”; “Já bebi daquela água e agora quero vomitar”, “uma vez a gente aceita, duas tem que reclamar”; “Vim de longe de outra terra pra morder seu calcanhar” e “tanto pé na nossa frente que não sabe como andar”. O parecer dos censores dizia: Gênero: protesto social; Linguagem: direta, como veículo de mensagem subversiva; Tema: sóciopolítico; Mensagem: negativa, induz flagrantemente ao descontentamento e insatisfação no que tange ao regime vigente e incita a uma nova ideologia, contrária aos interesses nacionais… Posteriormente a música foi gravada com o título de Como Vovó Já Dizia, com a letra totalmente modificada.
Que as crianças cantem livres (1973), Taiguara
Taiguara foi um dos músicos mais perseguido pelo governo militar, teve 68 músicas de sua autoria censuradas. Esta canção foi censurada pela preocupação do compositor com o futuro das crianças, diante do momento político que viviam.
Letra: E que as crianças cantem livres sobre os muros/ E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor/ E que o passado abra os presentes pro futuro/ Que não dormiu e preparou o amanhecer
Um Samba no Bexiga (1973), Adoniran Barbosa
Censurada por fazer uma citação aos militares que não agradou a ditadura. Do mesmo disco ainda foi censurada Samba do Arnesto.
Letra: “Domingo nois fummo num samba no Bexiga / Na Rua Major, na casa do Nicola / À mezzanotte o’clock / Saiu uma baita duma briga / Era só pizza que avuava junto com as braciola.”
Tiro ao Álvaro (1973), Adoniran Barbosa
Segundo o parecer da censura a música tinha uma “falta de gosto o uso das palavras “tauba”, “revorve” e “artormove”. É preciso lembrar que na época o governo militar investia no programa de erradicação do analfabetismo por meio do Mobral.
Letra: “Meu coração até parece/ Táuba de tiro ao álvaro […]/ Teu olha mata mais/ Que atropelamento de automover/ Mata mais que/ Bala de revorve.”
Uma Vida Só (Pare de Tomar a Pílula) (1973), Odair José
A música foi censurada por ir contra pois contrariava o programa do governo militar de distribuição de anticoncepcionais.
Murungando (1974), Raul Seixas
A letra sugere que as pessoas levantem a cabeça e resistam aos desmandos da Ditadura, além de fazer uma crítica ao movimento hippie e seu lema de paz e amor. A música foi liberada para compor trilha sonora de novela, apesar do parecer contrário do censor, mudando a palavra hipão, para irmão.
Letra: Levanta a cabeça mamãe/ Levanta a cabeça papai/Levanta a cabeça hipão/ E tira seus olhos do chão/O chão é lugar de pisar/Levanta a cabeça vovó/Levanta a cabeça povão/Levanta a cabeça vovô/Pá turma do amor e da paz/Levanta a cabeça rapaz/Não tenho outra coisa a dizer/Que eu sou mais eu que você
Herói do medo (1975?), Carlos Lyra
Os trechos “odeio a mãe por ter parido”, “com altivez eu dou e tomo”, “o passatempo estéril dos covardes” e “para que eu me ressuscite em liberdade” foram o motivo para a música ser censurada. O compositor se exilou por recusar a alterar a canção.
Os doze pares da França (1978), Toquinho e Belchior
Para os censores, a música fazia o Brasil parecer um país ruim, de segunda linha, pois valorizava muito a França.
Cruel Cruel Esquizofrenético Blues e Ela Quer Morar Comigo na Lua, (1982), Blitz
Foram censuradas por usarem as palavras “peru” e “bundando”.
Letra: “Esse vazio idiota que te consome/E some com a tua paz / Que se foi como aquela empregada radical / Que você mandou embora numa cena feia / Depois da ceia na noite de Natal / Só porque ela pegou no peru do seu marido” (“Cruel Cruel Esquizofrenético Blues”)
“Ela diz que eu ando bundando” (“Ela Quer Morar Comigo na Lua”)
Miséria e Fome (1983), Inocentes
Além desta canção, outras oito também foram censuradas, por negar a religião e por fazer críticas contundentes à sociedade e aos governantes. Pelo seu conteúdo as músicas poderiam influenciar negativamente o grande público e também estimular inquietações de ordem social, conforme alegavam os censores.
Sônia e Cobra Venenosa, (1983) Leo Jaime
A música fazia referência a uma suruba com direito a masturbação, sexo anal e trenzinho (“Sônia, vamos nessa festa fazer um trenzinho / Você na frente e eu atrás / E atrás de mim um outro rapaz”). “Cobra Venenosa” foi vetada pelo duplo sentido da letra: “Eu sou uma cobra venenosa, que pica, que pica”…
Mamãe eu não queria (1984), Raul Seixas
A canção foi censurada pelas críticas que fazia ao Exército. Por isso não podia ser executada publicamente ou nas rádios, sendo necessário comprar o LP para ouvir a música.
Letra: […] Mamãe, eu não queria/Servir o exército/Não quero bater continência/Nem pra sargento, cabo ou capitão/Nem quero ser sentinela, mamãe/Que nem cachorro vigiando o portão/Não![…]/Desculpe, vossa excelência/A falta de um pistolão/É que meu velho é soldado/E minha mãe pertence ao exército de salvação/Não! […]/Mas não tenho a menor vocação/Se fosse tão bom assim mainha/Não seria imposição/Não!
A vida não presta (1984), Léo Jaime
Por apresentar a palavra “bosta”, a música não foi liberada para as rádios. O censor achou “grosseiro, chulo e nefasto à boa educação da coletividade”. O compositor tentou mudar o trecho para “a vida é uma aposta”, mas a censura recusou a nova versão.
Revoluções por minuto (1985), RPM
Foi censurada pelo trecho “Aqui na esquina cheiram cola”, pois podia despertar “curiosidade nefasta no ouvinte infanto-juvenil”, conforme alega o censor. Nesse sentido a música foi proibida de ser tocada nas rádios, sendo liberada apenas com a modificação do trecho para “Aqui na esquina jogam bola”.
Bete Morreu (1986), Camisa de Vênus
A música foi censurada por ter expressões grosseiras como “gostosa, era o tesão da escola” e “chute no saco”, além de ter termos chulos “para descrever sadicamente a história macabra de uma jovem violentada e morta”. Com a música censurada Marcelo Nova decidiu não enviar o álbum à apreciação da Censura. Com cerca de 40 mil cópias vendidas, “Viva” foi recolhido pela Polícia Federal.
Bichos escrotos (1986), Titãs
O trecho “vão se fuder” foi vetado para ser veiculado nas rádios e cantado nos shows. Nas rádios era feito um ruído nessa parte e nos shows, apesar dos músicos não cantarem, o público cantava.
Ro Que Se Da Ne (1986), Lulu Santos
Essa música foi vetada pela censura provavelmente pela parte que fala: “O cara fuma, bebe e cheira / Fuma e quer pegar no meu pau / Cheira a noite inteira / Fala sem parar / E quando chega o dia / Não quer mais me contratar”. Ficou decidido que o público não podia ouvir isso.
Rubens (1986), Premê
A canção foi censurada por falar sobre o amor entre pessoas do mesmo sexo.
Veraneio Vascaína (1986), Capital Inicial
Por falar mal da polícia militar a canção foi vetada e o disco para menores de 18 anos. Contudo, a censura atraiu a curiosidade do público e vendeu mais de 100 mil discos.
Censura (1987), Plebe Rude
Por criticar a censura oficial, a música foi vetada para radiodifusão, conforme atesta o recurso negado no Conselho Superior de Censura.
Letra: A censura, a censura/Única entidade que ninguém censura/ Hora pra dormir, hora pra pensar/ Porra meu papai, deixa me falar/ Contra a nossa arte está a censura/ abaixo a cultura, viva a ditadura/ Jardel com travesti, censor com bisturi/ corta toda música que você não vai ouvir/ Nada para ouvir, nada para ler/ nada para mim, nada pra você/ nada no cinema, nada na TV/ nada para mim, nada pra você”
Conexão Amazônia (1987), Legião Urbana
Na capa do álbum Que país é este consta um adesivo com a informação: Faroeste Caboclo e Conexão Amazônica interditadas à execução pública e radiodifusão.
Faroeste Caboclo (1987), Legião Urbana
A música foi censurada por apresentar “expressões empregadas por viciados”, tais como “tem bagulho bom aí” e “o Jeremias, maconheiro sem vergonha, organizou a rockonha…”, além de “expressões vulgares”: “comia todas as menininhas da cidade”, “com o cu-na-mão” e “olha prá cá, filho da puta sem vergonha”. A música foi proibida para radiodifusão, como saiu na capa do LP. Mas posteriormente a gravadora apresentou uma versão com os cortes das frases mencionadas pela censura para que pudesse ser vinculada nas rádios, sendo liberada.
Banditismo por uma questão de classe (1994), Chico Science e Nação Zumbi
A banda Janete saiu para beber denunciou que policiais que passavam pelas ruas pararam e ficaram observando seu show na Rua do Apolo, em Recife, durante o carnaval de 2020. Ao tocarem a música Banditismo por uma questão de classe, de Chico Science e Nação Zumbi, os policiais foram questionar a produção do evento sobre o teor das músicas. Os policiais ameaçaram prender o vocalista por desacato a autoridade e injúria e pediram o encerramento imediato da apresentação. A música tem um trecho que diz “Em cada morro uma história diferente / que a polícia mata gente inocente”. A banda ainda relatou que o grupo Devotos e o cantor China passaram por situações parecidas – o primeiro no Polo Várzea e o segundo na Lagoa do Araçá, ambos no dia 25 de fevereiro de 2020.
Referências:
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BRASIL. DCDP. Parecer da censura da música Censura. No fundo da Divisão de Censura de Diversões Públicas, da Coordenação Regional de Brasília do Arquivo Nacional, com código de arquivamento: br dfanbsb ns cpr mui lmu 31023.
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*Esse artigo é o resultado de uma parceria entre a Biblioo e o Podcast Biblioteco, uma produção da Liga Bibliotecária.
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