Por Natália Portinari, da Folha de São Paulo
Todos os meses, 578 crianças de áreas rurais das ilhas de Orkney, no norte da Escócia, aguardam ansiosamente a chegada de uma biblioteca itinerante. Os bibliotecários, Betty, John e Simon, controlam um acervo de 2.500 livros, uma fonte de conhecimento única na vida campestre.
Em março, porém, o conselho regional de Orkney anunciou uma redução de 25 mil libras (R$ 126 mil) no orçamento da biblioteca, ameaçando reduzir as visitas do ônibus. Escritores ingleses se uniram em uma campanha para tentar prevenir o corte.
Orkney não é o único alvo. Cortes de orçamento afetam o investimento em cultura em toda a Inglaterra. Segundo um levantamento recente da BBC, 343 bibliotecas públicas fecharam no Reino Unido desde 2010, 132 das quais eram itinerantes. Cerca de 8 mil empregos foram cortados, um quarto da mão-de-obra nacional de bibliotecários.
O Reino Unido tem, atualmente, 3.765 bibliotecas públicas, 2.940 unidades a menos que o Brasil – o Reino Unido tem menos de um terço da população brasileira, no entanto.
Segundo o bibliotecário Ian Anstice, que coordena o site britânico “Public Libraries News”, o fechamento de unidades é só uma pequena parte do problema. “A maioria fica aberta com equipe e horários reduzidos, com paredes sem pintura e à base trabalho voluntário”, diz, em entrevista à reportagem.
Astice estima que existam, no Reino Uniudo, 416 bibliotecas “voluntárias”, a grande maioria das quais perdeu seu financiamento público, dinheiro que vinha dos conselhos regionais -esses, por sua vez, recebem repasses do governo britânico para a área de cultura.
Em alguns casos, o Departamento de Cultura, Mídia e Esporte do Reino Unido intervém para salvar as unidades de cortes dos conselhos. Em março, nove bibliotecas ameaçadas pelo conselho de West Berkshire foram poupadas pelo governo britânico, que prometeu fundos para mantê-las por dois anos.
“O papel e a tinta ainda são necessários. É uma forma de manter as comunidades remotas ligadas ao centro”, defende a escritora Alison Miller, que cresceu em Orkney e está organizando uma petição para defender sua biblioteca itinerante. O serviço é especialmente importante para quem não pode viajar até a cidade grande, como idosos e crianças -Orkney só tem duas cidades, Kirkwall e Stromness.
O número de trabalhadores voluntários nas bibliotecas triplicou desde 2010. A data não é uma marca aleatória: as bibliotecas começaram a sofrer quando o país passou a ter David Cameron, do partido conservador, como primeiro-ministro. Antes, os cortes não eram tão abruptos, segundo um relatório de 2013 do próprio Departamento de Cultura, Mídia e Esporte.
Os conselhos se justificam indicando que houve uma queda nos usuários de bibliotecas, assim como no número de livros emprestados. Ainda assim, para algumas pessoas, o serviço é insubstituível.
“Sou idoso e não tenho transporte individual”, reclama um morador de Herefordshire em uma petição on-line. “Uso a biblioteca local e pego quatro ou cinco livros por visita. Quem recebe pensão usa a biblioteca também para ler o jornal, cujo custo é cada vez mais alto. Os computadores são usados por pessoas de todas as idades. Não tenho dinheiro para comprar livros o tempo todo.”
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