Biblioo

“Biblio… o quê”?

“Biblio… o quê”? É assim que as pessoas costumam reagir ao questionar-me sobre a minha formação profissional. Sim! Bi-bli-o-te-co-no-mia! Com orgulho! Tenho o prazer de falar que trabalho no ramo profissional que escolhi e no qual me sinto feliz. E tenho mais orgulho ainda quando verifico o resultado do meu trabalho nos processos julgados no TRF1. Pretensão a minha? Não! Somos nós bibliotecários que colocamos a doutrina e a legislação publicada e organizada à disposição de nossos usuários. Vamos às explicações.

O bibliotecário jurídico é o profissional especializado em informação na área do Direito com conhecimento das fontes doutrinária e legislativa, do vocabulário jurídico e da estrutura do Poder Judiciário. As atividades desse profissional incluem: planejamento orçamentário, seleção para novas aquisições, catalogação, classificação, análise do conteúdo para indexação, atendimento de pesquisa, desenvolvimento e uso de novas tecnologias para serviços e produtos (em parceria com os profissionais de tecnologia, claro!), entre outras.

É comum ouvir falar que a profissão do bibliotecário está no fim. O bibliotecário jurídico, ainda mais. Afinal de contas tudo está online! E, por isso, a maioria dos usuários sente-se independente em suas pesquisas. No entanto, as bases de dados de informações jurídicas não são gerenciadas automaticamente.  Alguém precisa fazer a negociação de aquisição, analisar as funcionalidades, tornar possível a disponibilização para o usuário e, o mais importante, incluir, organizar e gerenciar as informações do sistema seja no catálogo online da biblioteca ou em outra base de dados.

As habilidades para desempenhar tudo isso foram adquiridas há centenas de anos, com a organização de materiais que evoluíram dos tabletes de argila, rolos de papiro, pergaminho até o livro impresso. A diferença é que agora falamos de informações em outros tipos de suporte, mas os princípios de organização são os mesmos. Não vale a pena, neste artigo, nomear as similaridades de organização de antes e de agora, pois se trata de informações técnicas. Mas, acreditem: as técnicas de organização da informação são bem antigas. Não é preciso retomar tanto tempo atrás, como no tempo da Biblioteca de Alexandria da Antiguidade, mas as bibliotecas constituídas pelos primeiros bibliotecários formados em universidades – como no final do século XIX, nos Estados Unidos e início do século XX no Brasil – já possuíam as técnicas de organização que usamos ainda hoje e aplicamos o mesmo modelo em sistemas de informações.

Mesmo que as tecnologias de informação tenham alterado a forma de trabalho do bibliotecário, os suportes de informações e os hábitos de leitura, escrita e pesquisa dos usuários, isso não significa o fim da biblioteca. Pelo contrário! Os livros impressos continuam vivos e os bibliotecários precisam continuar a manter o acervo físico e, também, o digital para preservação e disseminação do conhecimento.

E o Google? É uma ferramenta maravilhosa para acessar informações pontuais e rápidas. Mas é preciso saber usá-lo nas pesquisas para fins profissionais e acadêmicos. Um profissional da área do Direito não quer um resultado com um milhão de itens. Quem garante que a informação mais adequada é aquela encontrada na primeira página e não a outra que está na centésima página? O magistrado quer a informação exata que lhe permitirá tomar a decisão mais acertada, o mais rápido possível. O tempo urge. E o bibliotecário detém as fontes de informações corretas, técnicas de pesquisas adequadas e contatos com outras bibliotecas que tornam o resultado da pesquisa mais confiável.

A Biblioteca Ministro Adhemar Maciel, sob a direção da bibliotecária Márcia Mazo e sua brilhante equipe, está totalmente imbuída do novo contexto da profissão. Em julho de 2014, o Acordo de Cooperação Técnica entre o Tribunal e a Imprensa Nacional para publicação dos atos judiciais encerrou-se. O Tribunal precisava publicar suas matérias judiciais. Em julho de 2013, a Biblioteca, utilizando-se do software DSpace, desenvolveu sua biblioteca digital para armazenar, atualizar e manter em uma única base todos os atos administrativos do Tribunal. Foi um projeto de sucesso, o que fez com que fosse convidada para, junto com a Secretaria de Tecnologia da Informação, desenvolver um sistema de publicação de atos judiciais, cujo produto foi o Diário de Justiça Eletrônico da Primeira Região, resultando numa economia considerável para a instituição.

Estamos sempre em treinamento para melhorar o desempenho de nossas atividades. Particularmente, estou numa busca constante de aperfeiçoamento profissional, especificamente em países desenvolvidos. Quero saber como esses bibliotecários, com salários que variam de $60,000 a $150,000 mil dólares ao ano, agem com os novos usuários e usam as novas tecnologias no desenvolvimento de serviços e produtos das suas bibliotecas.

Em setembro do corrente ano fui a Berlim, na Alemanha, para a conferência anual de bibliotecários jurídicos (IALL’s 34th Annual Course), promovida pela International Association of Law Libraries. Minha participação foi financiada pela Federal Association of German Library and Information Associations, depois de uma avaliação de currículo e cartas de recomendação.

Ouvi experiências profissionais diversas de bibliotecários jurídicos de empresas privadas e universidades da Alemanha, Estados Unidos, Filipinas, Austrália e até de Istambul. Foram discutidos diversos temas do Direito Alemão e da Biblioteconomia. Considero que a melhor palestra do evento foi a da pesquisadora Hannah Birkenkotter, da Humboldt University Berlin. Ela abordou o impacto dos blogs jurídicos na comunidade científica para compartilhamento de ideias. É claro que muitos blogs têm informações duvidosas, que podem influenciar erroneamente uma determinada comunidade. Por outro lado, se os blogs forem de instituições e de profissionais reconhecidos, por que não considerar a informação publicada para pesquisa e tomada de decisões? Os artigos publicados em revistas científicas deixaram de ser o único canal de informação.

Outro tema abordado no evento foi a acessibilidade em bibliotecas. Assunto extremamente importante que deverá ser considerado no espaço da biblioteca do novo prédio do TRF1, previsto para 2019.

A visita à Biblioteca do Bundestag, o Parlamento Alemão, foi uma experiência memorável, já que a biblioteca não é aberta ao público externo. Os dados estatísticos apresentados mostram que as bibliotecas brasileiras ainda estão longe dessa realidade. Vamos aos números: 1,5 milhão de dólares de orçamento anual, 85 bibliotecários, 15.000 itens adquiridos por ano, 8.000 assinaturas de periódicos, 100 assinaturas de jornais eletrônicos, 4.100 usuários, 600 solicitações de pesquisa ao ano, 30 mesas individuais com notebooks e impressoras para os usuários e 60 mesas de leitura. É claro que os profissionais têm o seu papel de agir proativamente e com inovação, mas, não há como mover-se rumo ao futuro sem apoio político e financeiro.

Ao refletir sobre a viagem, fico desanimada com a profissão por uns minutos, pois as comparações são inevitáveis, ao mesmo tempo, me empolgo em continuar persistindo em busca de melhores serviços e produtos para os magistrados e servidores do TRF1. O objetivo é: melhorar sempre!

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