Nascidos das mãos e da mente de um autodidata, os bonecos gigantes de Olinda, Pernambuco, fazem parte de uma cultura mais que difundida, muito embora poucas pessoas conheçam sua origem. Silvio Botelho, conhecido como pai dos bonecos gigantes, é a criatividade por traz desta arte que encanta o mundo inteiro. Em visita recente ao Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular no Rio para fazer o conserto de uma de suas, Botelho se encantou com o respeito que sua arte despertou: “Eu estou muito feliz com isso, meu Deus. Estou felicíssimo. Há 28 anos eu vim aqui trazer uma boneca, a lei de Olinda, a Nordestina, uma boneca que hoje já está completamente diferenciada do que hoje faço, o trabalho de hoje, o trabalho já é outro, com mais aprimoração, com mais realismo e tudo mais. E eu trouxe essa boneca aqui para o Museu do Folclore [Edison Carneiro], tive uma exposição muito legal, foi muito boa a exposição, foi tudo muito bem. Com isso tudo, hoje eu volto porque quando houve uma avaria na peça, o rapaz que estava no comando, o Luiz, que levou para uma exposição, acho que em Fortaleza, houve uma avaria e queria consertar e os técnicos e os diretores disseram: ‘não, vamos pesquisar se o artista que confeccionou está vivo’. Isso é respeito”. Nesta entrevista concedida com exclusividade à equipe da Revista Biblioo, Botelho conta um pouco dos seus mais de quarenta anos de carnaval, dos perigos da mercantilização da maior festa popular do mundo e avalia os incentivos governamentais à cultura em seu Estado.

Como começou esse trabalho? Como surgiram os primeiros bonecos? Eu gostaria que você nos contasse um pouco do começo da sua história.

Olinda sempre teve uma grande tradição de um bom carnaval. Pernambuco, sobretudo. O que divide [as duas cidades] são três quilômetros, só a distância, porque é integrado. Olinda também foi a primeira capital de Pernambuco e só perdeu para Recife por que não tinha o cais do porto, nos anos de 1500, 1600. Mas as duas são como irmãs. E Olinda foi a minha sede, aonde eu nasci. Recife tem uma tradição de carnaval de mais de 100 anos, é um carnaval de tradição, é um carnaval aonde tem fantasias, roupas bonitas, mascarados na rua. E eu, que desci da cidade alta, não podia ser diferente. Eu observava aquele carnaval, com aquele lúdico, aquilo me fascinava.

Eu contava os dias do ano para que chegasse o carnaval e chorava quando acabava o carnaval. Eu chorava quando acabava. Por que aquilo me fascinava. Era uma energia que me tomava à cabeça e o pé, e eu ficava louco. “Meu Deus, o carnaval está chegando”. E quando dava o primeiro dia eu ficava feliz, quando dava o segundo dia eu estava ficando triste e quando dava o terceiro dia eu ficava chorando. “Vai acabar, vai acabar, amanhã não tem mais carnaval”. Ficava agoniado com isso. Mas já com nove anos de idade eu já estava fazendo as minhas primeiras peças de carnaval. Meu pai e minha mãe não tem nenhuma ligação forte com o carnaval, mas sim, são foliões, meu pai mais do que minha mãe. E eu, fascinado com aquilo tudo, por que tudo tem um fascínio, e a habilidade que eu tinha com algumas coisas. Como eu era uma pessoa pobre sem muitos recursos eu brincava de barreiros e fazia meus brinquedos de barro. Minhas caricaturas, meus bonequinhos de barro, e fazia o meu universo ali.

E com isso as pessoas ficaram sempre interessadas em ver eu fazendo aquilo. Na sala de aula, eu fazia os melhores desenhos, até ganhava meu espaço, pois quando tinha um trabalho de pesquisa de grupo eu sempre era de fora, “você não vai fazer”. Eu fazia ilustrações. Eu não sei se ajudou muito na educação, mas eu fazia as ilustrações e ficava por ali, ia para a biblioteca e coisa e tal. Então, com nove anos de idade eu comecei a fazer minhas máscaras e meu primeiro molde foi minha irmã, ela foi meu primeiro molde. E quando eu fiz aquilo ficou bonito e as pessoas ficaram muito felizes. “Olha, Silvio, parabéns!”. Aqueles elogios de família mesmo. E eu fui crescendo. A minha diversão era trabalhar porque era o meu mundo mágico do carnaval. Não no inverno, no inverno eu quase não fazia nada, eu fazia mais no verão, assim tipo julho, agosto e setembro, até os dias de carnaval. E eu fui fazendo aquele trabalho todo e começou a ter pessoas que queriam comprar. “Eu quero comprar”, “quero comprar”, “quero comprar”.

“E quando dava o primeiro dia eu ficava feliz, quando dava o segundo dia eu estava ficando triste e quando dava o terceiro dia eu ficava chorando. ‘Vai acabar, vai acabar, amanhã não tem mais carnaval’”.

Em que período mais ou menos?

Eu tinha 9 para 10 anos. Com 12, 13 anos eu já estava nesse ranking.

E as pessoas já começaram a solicitar seus trabalhos?

Sim, compravam os meus trabalhos. Eu já ganhava, comprava minhas camisas, meus sapatos, minha roupa. Já ia para o cinema com meu próprio dinheiro. Porque eu tinha meu próprio dinheiro.

Mas você já começou a trabalhar com os bonecos gigantes?

Sim. A brincadeira que entrasse. Eu já estava na adolescência quando surgiu a oportunidade de Ernane Lopes, ele era um artesão, me pediu que fizesse um boneco para ele, porque Olinda só tinha dois bonecos. “O homem da meia noite”, que é de [19]32, e “A mulher do dia”, que é de [19]67. E o terceiro boneco de Olinda quem fez foi eu em [19]74 para o carnaval de [19]75. Fiz o terceiro boneco da cidade.

Com menos de cinco anos eu fiz mais de 100 bonecos, porque o primeiro foi aprovado. Ernane Lopes aprovou e disse: “é isso que eu quero, é esse que vai ser o boneco que vai chamar-se ‘Menino da tarde’”. “Com esse boneco aqui você está aprovado e é considerado, pode ficar certo que esse aqui vai ser o boneco”. Logo no outro ano eu fiz mais um, mais um, mais um, mais um, mais um, e começou a surgir pedidos de bonecos.

Todos especificamente para o carnaval?

Para o carnaval… Chegou às Diretas Já.

E aí Silvio…?

Aí pediram o boneco de Lula, pediram o boneco de Tancredo Neves, pediram o boneco de Afif Domingos, Mailson da Nóbrega e alguns mais. Eu sei que eu fiz esses personagens… Que foram pra Brasília. O de Lula eu me contrariei muito, por que quando pediram o de Lula, queimaram em praça pública em Brasília.

Teve algum boneco que você produziu por conta própria e foi censurado? Em algum momento você sofreu censura?

Sofri. Quando foi em [19]88, eu acho que foi isso, em [19]88. Eu fui convidado pela Secretaria de Cultura de Olinda a fazer um presépio. Se faz um presépio no teu estilo, porque se faz de palha, se faz de cabaça, se faz de espiga de milho, se faz de bananeira, cada um tem sua arte e artesanato e faz no seu estilo. “Faça a Sagrada Família”. Aí eu fiz os bonecos gigantes da Sagrada Família: Maria, José e o menino Jesus. Maria sentada. Só que o pedido não foi proposital, o pedido foi: “faça Maria com peito desnudo dando de mamar a menino Jesus”. Eu: “Tudo bem!”. Eu fiz José com o cajado na mão olhando para Maria e Maria olhando para o menino com um ar risonho –  Era um ar risonho porque foi pedido assim – com o menino mamando os peitos de Maria.

E ficou em exposição logo na praça pública, a praça principal da cidade [risadas]. Quando as carolas viram aquilo ali… [risadas]. A polêmica foi grande, a igreja parou.  Padre Waltemilton na pregação dele lá botou meu nome na área, que eu não era filho de Deus, que eu era ateu, que eu era mensageiro do Diabo. As carolas se juntaram a noite, pegaram querosene e atacaram fogo no presépio. “Agora vamos para a casa da herege, vamos pegar ele” [risadas]. Foram para a minha porta fazer panelaço. “Sai herege, saia anti-Cristo. Como é que pode,  uma mulher daquele tamanho com um menino daquele tamanho mamando e rindo pra cara dela?”. Foi uma zona. Isso rendeu matéria de cópia, mais de 500 folhas de papel A4 xerocadas de páginas desse assunto. Isso também teve uma notoriedade muito forte do país, porque eu recebi apoio de muita gente, eu tive que refazer o presépio mas não fiz mais em praça pública, ficou na sede da Cultura na cidade de Olinda. Mas foi muito forte, foi um impacto muito grande.

Você sempre trabalhou de forma independente? Como se dá a sua produção? Você recebe algum apoio?

Não, apoio não. Não sou funcionário de ninguém. Tudo o que eu faço é por esforço próprio. Tenho feito isso com os meus méritos, não tenho apoio de ninguém.

Você trabalha sozinho?

Não, não. Eu trabalho com uma equipe grande desde que comecei a fazer meus serviços. E ninguém faz nada só. Aquele que disser que faz tudo só é mentira. Eu sempre precisei de pessoas e aproveitei as pessoas que tinham vontade, que eram vocacionadas para aquele assunto. Eu recrutava para o serviço, além de remunerá-los razoavelmente. Ensiná-los. É uma produção legal.

Você já realizou alguma atividade a fim de promover e ensinar jovens a fazer este trabalho?

Sim. Quando isso acontece eu achei que aquilo não podia ficar só para mim, eu tinha que fazer oficinas com pessoas, eu precisaria de pessoas práticas. Então eu comecei a fazer um trabalho diferenciado. Uma pessoa chegou e disse: “Silvio, eu tenho um grupo de risco, você não teria vontade de ensinar a sua arte?”. “Tá, por mim tudo bem, agora que traga um psicólogo para ficar acompanhando, por que eu preciso ensinar, mas não posso ser pai nem mãe de ninguém, eu estou aqui para ministrar a aula”. Aí as aulas passaram a ser na minha casa, no ateliê, e assim duas vezes por semana eles iam pra lá e eu fazia a aula, às vezes até pegava alguns cheirando cola dentro do banheiro, era um processo de conversar e tinha as vezes que excluir da aula por que não daria para ficar tomando conta de ninguém por estar cheirando cola dentro do banheiro.

É um risco para os outros, tinha muito objeto cortante, facas, uma vara afiadíssima. Eu não poderia. E então naquele momento eu tinha até alunos com síndrome de Down, porque eu achei que as pessoas com síndrome de Down poderiam trabalhar com argila, então eu botava aquele grupo de 10, 20 alunos trabalhando com as massas, com os barros e era um meladeiro danado. Mas eu estava feliz pelo o que estava fazendo. Então todo esse processo eu fiz… Além de recrutar pessoas. Tem um lá na minha casa que entrou com seis anos de idade, hoje já é pai, já tá pra ser avô, e muito feliz por ter passado na minha casa, por ter aprendido o que aprendeu, todos os esporrros que eu dava, reclamações enormes, até perdia a cabeça às vezes, dizia besteiras com eles, mas eles acham que eu fui um paizão.

Tem um que tem uns dois mil funcionários e trabalhou uma época comigo quando adolescente. Disse: “Silvio, trabalhar com ser humano é muito difícil”. Eu nunca perdi esse equilíbrio. Estou agora tentando retomar a minha casa e tentar fazer pelo menos parecido com o que eu já fiz um dia. Espero acontecer. Tô aí, não vou parar, não vou desistir, tem muita coisa que eu quero fazer. Tem uma nova série de bonecos que eu quero fazer, lançá-los para o próximo carnaval, para que eles venham retomar o seu espaço, por que Olinda é a pátria do boneco gigante. Os bonecos foram muito questionados no início, assim, pelas agremiações que faziam o carnaval e não gostavam de ver o carnaval como estava sendo que feito porque estava tomando espaço do que era tradicional. Aquilo era um fato novo na cidade. Hoje, o principal atrativo da cidade é o boneco gigante, devido a esse trabalho que foi feito com ele.

Como você avalia a importância dos bonecos gigantes para a cultura popular brasileira?

Eu tenho um imenso orgulho de dizer, bater do peito do que tenho feito pela contribuição para a cultura de Pernambuco e para o mundo e além-mar. Tudo começou como uma brincadeira e eu tenho certeza que o meu compromisso e a minha passagem aqui na terra –  eu sou uma pessoa espiritualista –  eu acho que a minha missão está quase toda cumprida. Cada um tem que ter sua missão. Nós temos tão pouco tempo aqui na terra, se eu não vim pra fazer nada, volta, não vem nem fica, por que tem que fazer. É tão rápido isso aqui, tudo aqui é tão rápido, a gente aluga esse lugar por tão pouco tempo que tem que fazer, ou fez ou não fez nada, poxa! Cada um na sua.

Eu acho que estou deixando um legado para a história de Pernambuco e para o Brasil todo, porque quantos Estados copiam o que eu faço? “Eu vou começar a fazer isso aqui porque em Pernambuco deu certo”. As informações se cruzam muito rápido hoje com o advento da internet. É rápido. Então isso aí contribui muito. Eu estou satisfeito do que fiz, eu acho que se eu posso fazer mais é só um acréscimo.

“Eu acho que estou deixando um legado para a história de Pernambuco e para o Brasil todo, porque quantos Estados copiam o que eu faço?”

Como você vê o processo de crescimento do carnaval e de comercialização do carnaval? Você acredita que de alguma forma sofre-se o risco de perder a tradição dos bonecos gigantes?

Eu acho que sim. Porque a corrida atrás do ouro é muito alta e carnaval é um custo muito alto. Mas tem os setores que são de marketing, de comercialização, que orienta, mas não dá para fazer certas coisas sem o marketing exigido pelas empresas que patrocinam, porque se ele vai colocar alguém lá dentro ele quer a imagem dele garantida. E essa imagem às vezes obriga a fazer muita coisa a mais que o necessário, e os bonecos têm sido muito usado com isso tudo. Mas infelizmente eu vou fazer o que? É caro, o custo é muito alto. Para dar passos próprios têm que às vezes sofrer algumas interdependências, e eu não sou diferente. Tenho que aceitar às vezes algumas imposições que o patrocinador tem me colocado, porque eu não tenho o que fazer, ou eu faço isso ou não vai sair o carnaval que eu preciso fazer. Eu peço muitas vezes desculpas ao pessoal: “pessoal, desculpa aí, mas infelizmente não pôde  ser diferente”. Mas tenho feito o carnaval, já tem o Encontro dos Bonecos Gigantes há 28 anos com extremo sucesso. Quer queira quer não queira o carnaval de Pernambuco hoje é uma imagem forte para vender para todo mundo, quando de marketing para a cultura pernambucana, está lá o espaço garantido dos bonecos gigantes.

Ao que se deve sua visita ao Rio de Janeiro?

Eu estou muito feliz com isso, meu Deus. Estou felicíssimo. Há 28 anos eu vim aqui trazer uma boneca, a lei de Olinda, a Nordestina, uma boneca que hoje já está completamente diferenciada do que hoje faço, o trabalho de hoje, o trabalho já é outro, com mais aprimoração, com mais realismo e tudo mais. E eu trouxe essa boneca aqui para o Museu do Folclore [Edison Carneiro], tive uma exposição muito legal, foi muito boa a exposição, foi tudo muito bem. Com isso tudo, hoje eu volto porque quando houve uma avaria na peça, o rapaz que estava no comando, o Luiz, que levou para uma exposição, acho que em Fortaleza, houve uma avaria e queria consertar e os técnicos e os diretores disseram: “não, vamos pesquisar se o artista que confeccionou está vivo”. Isso é respeito.

Aí sim, isso não tem tamanho de respeito, é de tirar o chapéu. “Se está, vivo vamos chamar quem fez para fazer”. Não se tem o direito de mexer em obra de ninguém se o autor da peça está vivo. Não foi diferente. Me chamaram, eu atendi, passou mais de seis meses para que eu pudesse vir porque estava com um compromisso no carnaval, o carnaval me toma e sufoca muito. E quando eu saí do carnaval eu vim aqui como estou hoje, e contente porque encontrei uma turma. Eu não tenho nenhum rótulo, eu sou um artista do povo para o povo. Converso com todo mundo, brinco, tiro ideia, conto os causos, faço brincadeira. Estou felicíssimo porque a diretora do Museu abraçou a causa. “Venha pra cá!”. Restaurei a peça direitinho e volto para o meu  Estado para continuar meu trabalho.

Eu acho que esse respeito com o artista de qualquer instituição, em que cargo estiver, tem que saber respeitar. Respeito é a base de tudo, de tudo, de tudo. Isso dá a qualquer um a dignidade de ser feliz, de viver sobre os olhos de Deus.

Que outros lugares têm peças suas? Você já doou alguma peça para alguma biblioteca?

Não, biblioteca não. Olha, têm bonecos no Norte, Nordeste tem bastante. Aqui no Rio de Janeiro tem os da Lia do Itamaracá, a boneca dela está aqui no Rio de Janeiro. Temos no Rio Grande do Sul. Nós temos em São Paulo, inclusive Os Gêmeos, aqueles rapazes que fazem murais, são muito meus amigos, eles têm peças. Fora do Brasil, nos Estados Unidos, em Cuba, na França e na Argentina.

Qual história de fabricação de um boneco que mais te marcou? 

Eu acho que foi o primeiro, O menino da tarde. Eu acho não, tenho certeza. O primeiro porque eu não sabia como levantar uma estrutura em papel que pudesse tomar uma volumetria de um metro e noventa, não tinha a menor ideia. E foi na primeira. Quando eu fiz a peça disse: “tá certo!”. Eu não, o Ernane Lopes, disse: “Silvio, é isso aí, é isso que eu quero, tá garantido, continue”. Ele carimbou, o resto era comigo. Como é de minha responsabilidade dizer que Olinda é a pátria dos bonecos gigantes, Olinda é a terra dos bonecos gigantes. Cada um com suas características. O Rio tem o seu samba e as suas escolas de samba que são coisas fantásticas. Quem vai ganhar do Rio? Ninguém. A Bahia com seu axé. Quem ganha da Bahia? A Bahia dita, a Bahia importa soluções, ninguém faz melhor do que a Bahia o axé. E ninguém faz melhor que Pernambuco seus bonecos gigantes do carnaval, cada um com sua coisa particular. Quem faz melhor que Bumba-Meu-Boi do que os maranhenses? Não é? Isso é próprio de cada região, é o fortalecimento. As pessoas que são gestoras de setores como o folclore tem que dizer que é ali que tem, não tem que misturar não. Como é que vai provocar o êxito de pessoas para fazer o turismo? Cultura e turismo tem que estar casados, gente. O êxito de você ir até Recife é pra ver os bonecos, porque se aqui tivesse bonecos você não tinha que sair daqui pra canto nenhum. Porque é o marco vitalício. Você tem que viajar, tem que trocar informações, mas não tem que implantar, se não é um invasor. Vamos para um desfile monumental de escola de samba, onde é que vai ser? No Rio de Janeiro. Aí eu venho de lá pra cá. Eu quero ver um axé, quero ver cantar uma Ivete Sangalo, uma Cláudia Leite, vá para a Bahia. Vai encontrar em Pernambuco? Não vai. É na Bahia. Se eu quero encontrar bumba meu boi, cabloquinho, marujada, para onde é que eu vou? Pernambuco. Um forró maravilhoso que é de dar água na boca, vai pra Caruaru, vai pra Campina Grande, não tem melhor. É lá. Então são essas coisas que se fomentam, que tem que ter o respeito, foi o que fez os gestores do Museu do Folclore, a Cláudia [Ferreira, diretora do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular] e a Elizabeth [Pougy, coordenadora do Museu do Folclore], que possibilitaram minha vinda até aqui através de um seguro, claro, alguém tem que assegurar a situação, e me receberam tão bem de braços abertos, a casa estava aberta para mim.

Qual sua opinião em relação aos investimentos do Governo na cultura brasileira? Como é em relação ao seu Estado?

Com relação ao meu Estado posso falar com muita certeza que é um dos Estados do Brasil que tem a maior seriedade com o artista popular, quando se tem uma secretaria chamada AD Diper [Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco],  os secretários de turismo e cultura que trabalham muito. Respeito. Contrata-se, financiam, apoiam. Tem vários projetos que eles contemplam. Os pontos de cultura que recebem verba anualmente para manter-se vivo! O ponto de cultura… Eu  conheço algumas pessoas, o Afoxé Alilinho No, a Casa da Rabeca de Mestre Salu, Dona Selma do Coco, Zeca do Rolete e outros e outros, que mantém-se vivos com os projetos, porque tem que dizer o que vai fazer para receber a verba, prestar conta e seguir. Tem alguns terreiros de Candomblé que recebem máquinas, todo o equipamento para a cozinha para manter o alunado ali, porque é uma forma de dar ocupação aos jovens, além de aprender uma cultura que pode servir amanhã para o currículo de sua vida. Também retira das ruas. Não é gastar dinheiro com que estão fazendo aí não, roubando, isso é uma praga que tem que ser exterminada. O dinheiro que possa passar para a cultura e beneficiar quem faz cultura consequentemente essas pessoas estão educando, ajudando o governo a manter-se calmo, ordeiro, o trabalhador saber as suas funções. E são cidadãos. Não tem mais ensino qualificado nas escolas, o alunato está aí, parece um bocado de bicho em sala de aula. No meu tempo o meu professor era meu segundo pai, segunda mãe, se respeitava. Eu não sei se era tão certo, né, por conta do tempo da ditadura, mas naquela época se cantava o Hino Nacional, amor pela sua pátria, valorização geral. Pernambuco ainda se mantém nesse patamar. O governo tem uma valorização muito forte com a cultura e com o turismo. Estão sempre agregando a mais, a mais, para que o Estado esteja sempre numa situação privilegiada. Em outros Estados eu não vejo tanto, mas Pernambuco, particularmente eu posso lhe garantir, valoriza muito o artista popular. Além de outras coisas. Tem tantos eventos importantes culturais lá. É impressionante.

Se uma pessoa desejar conhecer mais sobre sua história e sobre o seu trabalho, como faz? 

Na integração tecnológica eu sou muito devagar, eu confesso. Eu estou preocupado com isso. Eu não tenho obrigação nenhuma de estar na internet, em site nem nada. Lá em Olinda eu estou fazendo visitas marcadas, além de falar sobre os bonecos eu faço pequenas oficinas, aulas.

Aonde acontecem?

Na Rua Prudente de Morais, na oficina chamada Espaço Cultural Café. É um sobrado de século XVII, muito bem conservado, aí tá lá uma centena de bonecos. Todo mundo pode ir me ver, com hora marcada, grupo marcado, onde vou tá falando, palestrando sobre a vivência desse brincante, dessa coisa do boneco gigante, além de fazer uma pequena oficina. Conheço muitos que adoraram de estar presente com o artista e falando e compreendendo e não aquela distância de estar vendo um quadro e não saber nem de quem é. “Eu vi, falei, tirei uma foto com ele”. Isso contribui muito, fortalece muito. São quatro horas durante o dia ou quatro horas durante a tarde ou à noite. O turista passa a ver a cultura local. Eu estou com essa nova etapa, em Olinda, na Prudente de Morais, Espaço Café.

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