Recentemente muitas discussões, pré-julgamentos, estereótipos e até mesmo bandeiras padronizadas estão sendo levantados a respeito dos “rolezinhos” realizados em alguns shoppings centers de metrópoles brasileiras. Essa situação reflete, por um lado, a carência de espaços públicos de cultura e lazer nas periferias do país e, por outro, a reprodução do modelo burguês de homem culto e erudito que permeia os comentários nas redes sociais.

Tudo começou no Natal do ano passado quando jovens oriundos de periferias brasileiras, inicialmente na cidade de São Paulo, convocaram encontros pelas redes sociais para se divertirem pelos corredores dos shoppings, espaços privados supervigiados. Por que isso incomodou tanto a grande mídia e a classe média?  Afinal de contas esses jovens não tem o direito de participar da sociedade de consumo que é oferecida a eles pelos meios de comunicação de massa?

A mídia brasileira tratou logo de criminalizar os jovens participantes dos “rolezinhos”, acusando-os de assaltantes e desordeiros. Os empresários, donos dos estabelecimentos, procuraram articular medidas a ponto de criar multas surreais e até fechar os shoppings para evitar os “rolezinhos”. Nas redes sociais alguns comentários não foram muito diferentes da lógica dominante, em especial os de alguns bibliotecários questionando que os “rolezinhos” deveriam ser realizados em bibliotecas públicas, mas será que existem bibliotecas públicas acessíveis aos jovens que vivem nas periferias brasileiras?

Segundo os dados do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP) através do projeto Mais Bibliotecas, o Brasil possui uma quantidade de 6.019 bibliotecas públicas e a Região Sudeste é a que tem o maior número destes estabelecimentos, chegando a um total de 1933. Os dados do SNBP ainda revelam que existem 118 municípios sem bibliotecas públicas, desse total 11 municípios estão com suas bibliotecas fechadas e 107 municípios nunca tiveram uma biblioteca funcionando.

O ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva durante o discurso de cerimônia dos 110 anos da Academia Brasileira de Letras prometeu “zerar” até o ano de 2008 o número de municípios brasileiros sem bibliotecas, quase sete anos depois essa promessa ainda não foi concretizada. Grandes parte das bibliotecas públicas brasileiras estão localizadas em áreas distantes das regiões periféricas brasileiras – o que requer gastos de passagens (que não é barata) para a locomoção desses jovens, sem contar que em sua maioria são ambientes que parecem estar congelados e pouco atrativo para a juventude.

Alguns espaços públicos de lazer, como praças, quadras de esportes, cinemas de rua acabaram sendo privatizados e cooptados pela iniciativa privada tornando-se verdadeiros conjuntos arquitetônicos supervigiados, cada vez mais colocados como simulacros da cidade ideal e escondendo ou alienando os problemas sociais da sociedade exterior. Com poucas opções de cultura e lazer nas periferias brasileiras, restam aos jovens optarem pelo que é colocado como status social e sonho de consumo.

Bem diferente das periferias, as regiões nobres das metrópoles brasileiras oferecem uma gama de opções de cultura e lazer nesse verão. Na cidade do Rio de Janeiro o Projeto Verão Rio oferece uma variedade de atrações culturais que mesclam atividades esportivas, atrações musicais, passeios culturais, entre outros. Como seria interessante se esse projeto fosse expandido para a periferia carioca, afinal de contas o aparato burguês de cultura e lazer se encontra bem distante e com uma gama de dificuldades de acesso pelos menos favorecidos.

Muito bem alertaram os Titãs na década de 80 através da música Comida e de lá para cá parece que essa realidade não mudou muita coisa:

“A gente não quer só comida
A gente quer comida
Diversão e arte
A gente não quer só comida
A gente quer saída
Para qualquer parte”

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