RIO – Em 2013 a cultura informacional tomou as ruas. Numa onda de protestos nunca antes vista no Brasil, os recursos de mídia foram acionados, registrando tudo que acontecia no momento em que os fatos se davam. A mídia tradicional perdeu parte de sua hegemonia, vendo surgir de diversas partes veículos alternativos de comunicação. As câmeras, os microfones e a internet se mostraram como armas poderosas do ativismo político e cultural. Foram tantos os acontecimentos que ficou difícil escolher, mas abaixo os leitores da Revista Biblioo têm uma síntese dos fatos considerados por nós os mais marcantes do ano de 2013.

1)      Surge a Mídia Ninja

Em meio às manifestações que sacudiram o Brasil a partir de junho deste ano em diversas cidades brasileiras, surge uma nova maneira de se fazer jornalismo: a cobertura das manifestações pelo grupo “Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação contato”, ou simplesmente “Mídia Ninja”.

Com a reiterada cobertura tendenciosa empreendida pelos grandes veículos de comunicação, a Mídia Ninja tornou-se o canal mais seguro para quem queria acompanhar os acontecimentos em tempo real, no calor dos acontecimentos.

Ganhou grande repercussão a prisão ao vivo pela internet de Felpe Peçanha, integrante do grupo. Peçanha foi detido sem motivo aparente numa manifestação que acontecia em frente ao Palácio Guanabara, sede do governo fluminense, no dia 22 de julho.

Assumidamente militante político, o grupo foi alvo de uma série de criticas por fazer um jornalismo entendido por alguns como de má qualidade ao utilizar equipamentos (celulares) que em geral não atendiam as necessidades técnicas para o que se propunha. Apresar disso, a Mídia Ninja fez escola. Tanto que a partir das manifestações ocorridas em 7 de setembro, alguns veículos de comunicação, como a Globo, por exemplo, passou a fazer transmissões com técnicas parecidas, ou seja, transmitindo com equipamentos móveis do meio das manifestações.

2)      Crise na Biblioteca Nacional

A paralisação realizada pelos servidores da Fundação Biblioteca Nacional (FBN) no final do último mês (dia 26 de novembro, precisamente) é apenas um dos sinais de uma crise que se arrasta há anos, mas que se acentuou em 2013. Em março, Galeno Amorim foi demitido da presidência da FBN, assumindo em seu lugar o cientista político e professor da Universidade Federal Fluminense Renato Lessa, indicado pela ministra da Cultura, Marta Suplicy.

Circulava na internet desde 2012 um abaixo assinado no qual um grupo de intelectuais envolvidos com a questão do livro fazia duras críticas à gestão de Amorim. “Senhora Presidenta [Dilma Rousseff], todo o problema na área do livro, leitura e literatura começou com a intervenção antidemocrática do senhor Galeno Amorim, nomeado presidente da FBN no início de 2011, que se dedicou a desmontar estruturas importantes em nosso setor, a desmobilizar o Colegiado Setorial do Livro, Leitura e Literatura e a retroceder em conquistas fundamentais, tudo em função de uma desastrosa centralização das políticas na Fundação Biblioteca Nacional”, dizia o documento.

Mas o ápice da crise envolvendo o então presidente se deu com o pedido de demissão de duas coordenadoras da FBN: Elisa Machado, coordenadora geral do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP), e Cleide Soares, coordenadora geral de Leitura – uma unidade da Diretoria do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas (DLLLB). Por ocasião do pedido de saída, as coordenadoras enviaram uma carta aos coordenadores estaduais de bibliotecas na qual diziam: “Em função de novas configurações que se estabeleceram na FBN, e com a vinda da DLLLB, as barreiras para garantir a continuidade de um trabalho alinhado com os princípios que entendo serem básicos ao sistema de bibliotecas públicas se tornaram intransponíveis”.

Apesar do pedido das coordenadoras, quem deixou o cargo uma semana depois foi Galeno que escreveu uma nota destacando alguns feitos de sua gestão: “Saio com a consciência de dever cumprido. Me dediquei pelo menos 12 horas diárias, mais fins de semana e feriados, nos últimos dois anos. Procurei dar o melhor de mim e é um privilégio poder ter servido, nesse cargo, à Nação e à nossa gloriosa BN, tendo dado a minha contribuição, assim como ex-presidentes fizeram e futuros farão”, escreveu ele. Galeno, a exemplo de seus antecessores, saiu sem conseguir o feito de zerar o número de municípios sem bibliotecas no Brasil. Tendo se prontificado em conceder uma entrevista para a Revista Biblioo, até o fechamento desta edição o ex-presidente ainda não havia dado uma resposta definitiva sobre a conversa na qual pretendíamos fazer algumas indagações sobre questões que envolvem interesses diretos dos bibliotecários.

3)      Greve na educação

O ano de 2013 foi marcado por manifestações populares que englobaram reivindicações de melhorias em diversas áreas. A Educação foi pauta nos atos de protesto através das lutas dos professores das redes municipal e estadual de ensino da cidade do Rio de Janeiro.

Os recentes cortes nas verbas da educação, o plano de cargos e salários proposto pela prefeitura carioca, as condições de trabalho, entre outros, foram pontos levantados pelos professores durante as manifestações. A classe dos profissionais da educação teve o apoio da população carioca que ocupou as ruas da cidade maravilhosa em grandes manifestações que entraram para a história do Rio de Janeiro.

Como de costume nas recentes manifestações, a truculência das forças policiais na retirada dos professores que estavam acampados no plenário da Câmara Municipal do Rio de Janeiro gerou revoltas e um clamor de indignação na sociedade carioca. Os professores deram uma lição ao poder público municipal e estadual através de muita luta e resistência visando que os direitos a educação não fossem destituídos.

4)      Atentados à liberdade de expressão

O ano de 2013 termina com um saldo mais que negativo no que se refere à liberdade de expressão. São quatro jornalistas mortos até o momento, saldo que coloca o Brasil na posição de terceiro em número de assassinatos destes profissionais. À nossa frente estão Síria e Paquistão, países em estado de guerra civil. A Impunidade ainda é a maior ameaça à liberdade de expressão no Brasil, conforme o Relatório Anual de Impunidade 2013 “Rostos e Traços da Liberdade de Expressão na América Latina e no Caribe” realizado pela IFEX-ACL, organização internacional dedicada a defender o direito de expressão.

Mas não é só a morte de jornalistas que coloca o país em posição delicada em relação ao tema da liberdade de expressão. Todos os dias diversos profissionais de comunicação são agredidos, presos e processados em virtude de suas práticas profissionais. A própria equipe da Revista Biblioo se viu esse ano às voltas com um processo disciplinar dirigido ao editor-chefe da publicação, Chico de Paula, em razão da publicação de uma charge e de um editorial. Carregado de erros crassos, o processo acusava a publicação de denegrir e injuriar a categoria e os órgãos de classe, quando na verdade os dois trabalhos apontados no processo faziam simplesmente críticas genéricas e dentro dos parâmetros legais.

Tendo recorrido da decisão de primeira instância, o editor espera a decisão do recurso que será debatido no Conselho Federal de Biblioteconomia em Brasília ainda este mês, conforme nos foi informado pela própria instituição.

5)      Feira do Livro de Frankfurt é palco de críticas do escritor Luiz Ruffato  

Na abertura da Feira do Livro de Frankfurt (Alemanha), no dia 8 de outubro, evento que homenageava o Brasil, os participantes se surpreenderam com as duras críticas feitas pelo o escritor Luiz Ruffato em seu discurso. Disse o escritor: “Nascemos sob a égide do genocídio. Dos quatro milhões de índios que existiam em 1500, restam hoje cerca de 900 mil, parte deles vivendo em condições miseráveis em assentamentos de beira de estrada ou até mesmo em favelas nas grandes cidades. Avoca-se sempre, como signo da tolerância nacional, a chamada democracia racial brasileira, mito corrente de que não teria havido dizimação, mas assimilação dos autóctones. Esse eufemismo, no entanto, serve apenas para acobertar um fato indiscutível: se nossa população é mestiça, deve-se ao cruzamento de homens europeus com mulheres indígenas ou africanas – ou seja, a assimilação se deu através do estupro das nativas e negras pelos colonizadores brancos”.

Em relação ao abismo cultural a qual os mais humildes estão relegados, Ruffato disse: “A perpetuação da ignorância como instrumento de dominação, marca registrada da elite que permaneceu no poder até muito recentemente, pode ser mensurada. O mercado editorial brasileiro movimenta anualmente em torno de 2,2 bilhões de dólares, sendo que 35% deste total representam compras pelo governo federal, destinadas a alimentar bibliotecas públicas e escolares. No entanto, continuamos lendo pouco, em média menos de quatro títulos por ano, e no país inteiro há somente uma livraria para cada 63 mil habitantes, ainda assim concentradas nas capitais e grandes cidades do interior”.

As palavras de Ruffato repercutiram e não foram bem recebidas pelo governo brasileiro. A ministra da cultura, Marta Suplicy, que estava presente no evento criticou o escritor: “Não era o local para se dar uma aula de sociologia”.

6)      Polêmica das biografias

O direito de publicação de biografias não autorizadas foi marcado por polêmicas e revelou desconfiança com a postura de certos ídolos da Música Popular Brasileira (MPB), dentre eles: Chico Buarque, Caetano Veloso, Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Djavan, Milton Nascimento e Gilberto Gil. A polêmica teve início quando uma biografia não autorizada do cantor Roberto Carlos escrita pelo jornalista Paulo César de Araújo foi tirada de circulação em 2007 pelo cantor.

A discussão tomou novo impulso quando outros nomes da MPB como Chico Buarque e Caetano Veloso saíram em defesa de Roberto Carlos a ponto de criar um grupo para discutir questões no projeto de lei sobre biografias que tramita no Congresso. Roberto Carlos também criou o Procure Saber.

Depois de muitas críticas e debates a respeito o cantor Roberto Carlos voltou atrás e se colocou a favor das biografias não autorizadas. Sem explicar muito a sua decisão, o músico afirmou ser a favor da publicação das biografias sem a necessidade da anuência do biografado. Essa discussão além de criar um desgaste na imagem de alguns ícones da MPB, também criou um mal-estar entre Roberto Carlos e Caetano Veloso depois de um desentendimento entre os músicos.

7)      Marco Civil da Internet

O Marco Civil na Internet no Brasil foi um tema que ganhou urgência devido às polêmicas levantadas em relação à revelação de espionagem dos EUA ao Brasil. Após as notícias da espionagem americana, o governo agiu para acelerar a votação da regulamentação dos direitos na rede mundial de computadores. Enfrentando grandes pressões e um jogo de disputas que envolve as grandes corporações de telecomunicações e as lideranças partidárias, todo o esforço do Governo não foi o bastante e a votação do Marco Civil da Internet só deve ser votada em 2014.

Defensores do direito à comunicação, da liberdade na internet e da privacidade reivindicaram a urgência da votação. Algumas manifestações de movimentos sociais, da Frente Parlamentar pelos Direitos Humanos e do movimento Grito da Liberdade foram realizadas em atos na Câmara de Deputados.

Como essa questão envolve questões que vão de encontro aos interesses das grandes empresas de telecomunicações no Brasil, talvez esse debate pode ser desviado do seu foco principal para atender aos interesses de pequenos nichos que controlam grande parte dos meios de comunicação do Brasil. 

8)      Centenário de Vinicius de Moraes

O centenário de Vinicius de Moraes foi comemorado em grande estilo no ano de 2013, além de homenagens em livros, shows, discos e programas o poeta também foi celebrado com a criação de um novo site (www.vinicius.com.br), o espaço foi desenhado trazendo novas fotos, discografia, prosas, poesias, entre outros. Grande parte das obras que compõem o site foram selecionadas no acervo da família do poetinha e estão disponibilizadas para os admiradores de Vinicius. O site foi inaugurado no dia 19 de outubro de 2013, data que marca o centenário do poetinha. Uma boa oportunidade para ter acesso ao legado deixado por um dos maiores poetas do país.

9)      Fernanda Montenegro é premiada no Emmy Internacional

A atriz Fernanda Montenegro venceu o prêmio de melhor atriz do 41º Emmy Internacional, o Oscar da televisão norte-americana no dia 27 de novembro de 2013. Aos 84 anos de idade a atriz brasileira foi premiada pela atuação no papel Doce Mãe, derrotando candidatas do Reino Unido, Suécia e China. Considerada uma das maiores atrizes brasileira e indicada ao Oscar em 1999 pelo filme Central do Brasil, Fernanda Montenegro, não esperava ganhar o Emmy Internacional e se sentiu surpresa pela conquista.

10)  Morte de Nelson Mandela

Nelson Mandela, ícone da luta pela igualdade racial e presidente da África do Sul entre 1994 e 1999 morre aos 95 anos de idade. Conhecido como “Madiba” na Africa do Sul, Mandela é considerado o mais importante líder da África negra, liderou a transição que encerrou a política do apartheid em seu país e foi ganhador do Prêmio Nobel da Paz de 1993.

Nelson Mandela já demonstrava sinais de fragilidade em sua saúde, com um histórico rotineiro de internações devido a infecções pulmonares, ele estava impedido de fazer aparições públicas na África do Sul. Mandela faleceu em casa junto a sua família.

A cerimônia do funeral de Mandela contou com a presença de grandes líderes mundiais, dentre eles a presidenta Dilma Rousseff. O funeral durou doze dias e Madiba foi sepultado na aldeia Qunu, localizada na província pobre do Cabo do Leste, onde Mandela nasceu.

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