– Eita, hoje vocês ralaram hein?

– Verdade, menina. Minhas costas e meus ombros estão doendo até agora.

– Nunca vi meninas de biblioteca trabalharem como vocês trabalham. Quarenta anos de empresa e nunca vi.

– Não sei se agradeço ou se choro. – ri

– Meu ônibus chegou. Tchauzinho, até amanhã. Parabéns!

– Até!

Subi no ônibus, encostei a cabecinha na janela, e desta vez não me imaginei num clipe. Muito menos numa cena triste de filme. Tava repensando umas (muitas) coisas que escutei ao longo de quase 5 anos de faculdade.

Não teve uma só semana, ou posso até mesmo arriscar, uma só matéria que em que não foi debatido o papel do bibliotecário. Já construíram e desconstruíram essa imagem pra mim. E hoje, no oitavo período, ouso em dizer que não aguento mais. De verdade. Choquei, né?

Aqui, amiguinhos, no primeiro período é muito legal. E importante dizer as mil maravilhas que podemos fazer. Debater até exaurir nossas funções no mercado de trabalho é ótimo nos primeiros semestres. Mas cansa, né? Não pode citar uma empresa legal de tecnologia e vir alguém falar que deveria ter um bibliotecário lá. E que é um absurdo, um pecado mortal, um crime contra a civilização a empresa, o sindicato, o conselho não reivindicar essa vaga para gente.

Queria muito que toda a energia gasta defendendo a profissão dentro de sala de aula, num seminário, ou numa conferência nacional, fosse gasta em ação. Eu tô falando do famigerado fazer mesmo. Sabe como alguém reconhece meu trabalho? Quando eu faço. E faço bem. Quando mostro que sou capaz de fazer isso. Não quando eu fico falando aos sete ventos que sei fazer.

O melhor exemplo que eu tive disso foi em um evento que estava pela faculdade mesmo, e dois representantes apresentavam uma biblioteca, bem simples e humilde, que montaram em uma comunidade, de maneira voluntária. A colaboradora do projeto comentou que a biblioteca não possuía voluntários de biblioteconomia, mas que aceitavam. Uma estudante levanta a mão, pede o microfone, elogia o projeto e com a cara de indignação mais elaborada que se pode imaginar diz:

– Oi? Mas como assim uma biblioteca sem bibliotecário?

E na maior finesse que se pode imaginar, a colaboradora respondeu:

– Nenhum bibliotecário se interessou pelo nosso projeto até agora, por isso ele vai funcionar com ou sem bibliotecário. Se alguém sem estudos quiser ajudar, essa pessoa será muito bem vinda. Somos abertos.

Olha só a informação, que coisa mais lindinha da mamãe. É muita prepotência 30 pessoas numa sala de aula acharem que só elas sabem cuidar dessa belezinha. Não. Não é só a gente. Desenvolvemos habilidades que facilitam muitas coisas, mas muitas coisas que foram enaltecidas por serem exclusivas nossas já são intrínsecas de muitas outras profissões. Então meus amigos, vamos fazendo.

Discutir se um geógrafo, um pedagogo, um arquivista pode ser ou não gestor de uma biblioteca dentro de uma academia com pessoas que compartilham da mesma opinião que a sua não fará que o diretor da instituição saiba que você está apto para gerenciar. Gastar energia para gritar aos quatros cantos e para pessoas que já sabem que a vaga deveria ser nossa, levando um discurso a exaustão e ao famoso “ata”, não mudará a realidade. Muda um total de zero coisas. Aliás, até muda sim. A satisfação com a profissão.

Originalmente publicado em: https://docebiblioteca.wordpress.com/2017/02/13/papel-do-bibliotecario.

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