O deputado federal pelo Solidariedade(SD) do Maranhão, Domingos Dutra, protagonizou em 2013 um dos momentos mais emblemáticos da Câmara dos Deputados. Após uma sessão longa e tensa da Comissão de Direitos Humanos (CDH), da qual era presidente, ele se retirou juntamente com outros parlamentares ameaçando em recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) ou até montar uma comissão paralela. Figura histórica do Partido dos Trabalhadores (PT), Dutra deixou a legenda no ano passado alegando não concordar com os rumos que o ele havia tomado. Encontrei o deputado no interior do Maranhão falando aos garimpeiros. Solicitei lhe uma entrevista e fui atendido. Parte de nossa conversa posto aqui no site da Biblioo e o restante publiquei no Portal Veias Abertas. Confira:

Deputado, qual a sua impressão em relação às bibliotecas e as práticas de leitura no Brasil?

Eu acho fundamental porque todo mundo sabe e diz, embora que muitos não pratiquem, que a educação e a cultura são dois caminhos para emancipação individual das pessoas, das famílias, de uma sociedade e de um país. Temos avançado pouco nas duas áreas. É insuficiente ainda. Você é do Maranhão, eu também sou. O Maranhão é um dos estados mais ricos no ponto de vista cultural, da diversidade, na música, na culinária etc. As bibliotecas são fundamentais, eu dediquei uns três milhões de reais para as bibliotecas, infelizmente a política do governo federal para a construção de bibliotecas é muito complicada e até hoje não consegui salvar esses recursos. Talvez aqui em Lagoa Grande [município do interior do estado] dedicamos 1 milhão de reais para bibliotecas e estamos vendo se salva. Aqui no Maranhão a Roseana Sarney, na época que ela foi governadora pela primeira vez, ela criou os chamados Farol do Saber. Era com essa política de ter biblioteca e isso infelizmente está falido. Na maior parte dos colégios públicos não existem bibliotecas e como não tem isso acaba refletindo na péssima qualidade em Educação que acaba refletindo em tudo. É tanto quando se abre um concurso para promotor e juiz no Maranhão, a maioria que é aprovada vem de fora, aqui está cheio de goiano, cearense, paulista porque o nível da Educação do Maranhão é muito baixo e uma das causas é a falta de bibliotecas nas escolas. Nem as bibliotecas físicas, nem as virtuais com a internet que possibilita um raio muito grande de possibilidades. Lamento o país não está investindo mais nessas duas áreas. A cultura no país tem ministério, nos estados tem as secretarias, mas quase não funciona. Aqui no Maranhão os prefeitos, em sua quase totalidade, nos aniversários das cidades, no carnaval e nas festas de fim de ano, eles não valorizam a cultura local, contratam bandas de fora. Por isso estamos perdendo para o Ceará, para Pernambuco, para Bahia, perdendo para o Pará, porque os prefeitos gastam rios de dinheiro com as bandas de fora. Você vê a multiplicidade de nomes [de manda de forró]:Mel com Terra, Feijão com Arroz, Carrapato com Cobra… Pega 100 ou 200 mil reais aqui e vai embora porque os prefeitos e o governo do estado não investem, nunca vamos ter grandes bandas. Nós temos a maior banda daqui, a Reprise, nossos cantores locais são muito discriminados a não ser um grupo muito pequeno que é do meio da Roseana Sarney, mas o restante como Josias Sobrinho, Joãozinho Ribeiro, vivem a míngua e quem quer sair vai para fora como fez a Rita Ribeiro, o Zeca Baleiro. Tem que sair daqui e fugir para se projetar porque não há incentivo. Espero que o Flávio Dino desaparelhe a cultura, ter um programa que valorize os melhores, que valorize nossa cultura local, o bumba-boi, o cacuriá, as quadrilhas, a música, a culinária para poder aumentar o nosso orgulho.

Imagino que o senhor tenha uma predileção pela leitura, algum autor ou obra preferencial?

Dutra mostra o livro de Flávio Tavares: "É um livro muito interessante sobre o golpe de 64". Foto: Chico de Paula/Agência Biblioo

Dutra mostra o livro de Flávio Tavares: “É um livro muito interessante sobre o golpe de 64”. Foto: Chico de Paula/Agência Biblioo

Na verdade leio pouco porque na vida que a gente leva… Em Brasília fico terça, quarta e quinta, dificilmente almoço porque o volume de trabalho na Câmara é muito grande. As pessoas que não conhecem acham que todos os parlamentares são preguiçosos e vagabundos, desleixado, insensível, mas quando eles vão para Câmara mudam de ideia. Temos três jornais para ler todos os dias: O Globo, a Folha, o Correio Brasiliense e o Estado do Maranhão, que eu tenho assinatura para poder saber o que o Sarney está fazendo de ruim. Temos duas revistas que eu tenho assinatura (tenho que comprar as outras): a Época e a Carta Capital. De vez em quando eu compro o Estado de São Paulo, mas nem esses jornais consigo tempo para ler. Quando dá na quinta pela noite pegamos o avião, chega à capital, pega o carro e vai para o interior. Essa roda viva é o mandato todo. Então não tenho conseguido ler muito. Eu estou lendo agora um livro do Flávio Tavares intitulado “1964: o golpe”. Flávio Tavares é jornalista e conviveu de perto com os últimos momentos do governo de João Goulart, acompanhou os discursos radicais do Carlos Lacerda, toda trama militar e esteve no dia em que o João Goulart estava arrumando as gavetas para ir montar o governo no Rio Grande do Sul para reagir. Fala muito de Brizola, é um livro muito interessante sobre o golpe de 64, como o regime militar completou 54 anos quase no esquecimento. Há uma produção muito grande de livros e na Comissão de Direitos Humanos, que eu continuo fazendo parte, nós temos a Comissão da Verdade, uma subcomissão que eu integro e é presidida pela deputada Luiza Erundina, que é um reforço a Comissão da Verdade que nós aprovamos no Congresso e que hoje está funcionando para tentar desvendar tudo que ocorreu na ditadura. Um livro que eu recomendo, uma leitura boa com uma forma bem diferente de dividir os capítulos e apresenta um monte de informações valiosas para quem quer compreender um pouco o que foi o pré 64 e o que ocorreu depois do golpe militar dado pelo Costa e Silva, Castelo Branco, Médici, Geisel e tantos outros. Tenho lido também a cultura maranhense do Ferreira Gullar. Não sei se você leu a Papisa, um livro muito bom sobre a igreja e a única papisa que teve e foi Papa; por isso durante muito anos o Vaticano tinha uma cadeira que tinha um buraco no lugar do boga porque houve uma mulher que enganou todo mundo e se transformou em Papa. Depois que a igreja descobriu, lá no Vaticano tinha uma cadeira que eles furaram em baixo que era para saber se o candidato a Papa era homem ou não. Já li alguns livros, mas acho que insuficiente para uma necessidade, mas vou lendo dentro do possível.

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