RIO – Em entrevista à biblioo, Jaime Cezário, carnavalesco da Unidos do Porto da Pedra e da Acadêmicos do Cubango  e colunista do portal “o dia na folia”, nos conta um pouco do que o fez querer trabalhar com carnaval e defende o polêmico enredo que a Unidos da Porto da Pedra está preparando para o carnaval deste ano.

Emilia Sandrinelli: Jaime, quais lembranças você tem dos carnavais da sua infância? Você achava que era melhor?

Jaime Cezário: Da infância, eu lembro muito lá de Niterói, dos blocos de rua. Isso marcou muito a minha infância. Além disso, lembro que eu tinha pânico de uma coisa que aqui eles chamam de bate-bola. Lá eles chamam de pierrot. Quando aquilo aparecia eu chorava que nem um louco e ia me esconder. Isso era com menos de dez anos. A partir daí, na década de 70 mesmo, eu já comecei a ficar ligado nos desfiles das escolas de samba que começaram a ser televisionados. Eu admirava bastante até o ponto que eu disse: “eu quero fazer aquilo”.

E. S.: Muitas pessoas ficam com aquele saudosismo das marchinhas…

J. C.: Bom, apesar de eu estar com 50 anos e achar as marchinhas muito legais, o meu carnaval sempre foi mais de bloco de rua e de desfilar em escola de samba. Se eu tiver saudade, eu tenho saudade daqueles sambas antológicos, aqueles que eu consigo cantar até hoje. Mas o do ano passado eu já não consigo. Acho que o tempo evolui, tudo se transforma, não dá para você querer ficar parado em uma década anterior. Ainda pouco eu estava comentando com uma pessoa que trabalha comigo aqui sobre a década de 80 e hoje… Bom, feliz daqueles que puderam curtir e viver um tempo daquele. Hoje é completamente diferente; tudo se transforma!

E. S.: O que você acha da utilização dos aparatos tecnológicos nos desfiles de escolas de samba? Você acha que torna os desfiles artificiais ou você concorda com a utilização?

J. C.: Olha, na realidade, eu não considero mais desfile de escola de samba; eu já considero um show de carnaval, uma apresentação de um grande espetáculo que a escola de samba faz e tem que ter uma série de pré-requisitos e de tecnologias que não dá para se comparar a carnaval da década de 70 ou 80, que os saudosistas ficam sempre falando que eram maravilhosos. Na realidade, tudo evoluiu e a gente tem que se adequar. Eu gosto do carnaval que tem emoção. Pode ter tecnologia sim, mas tem que ter o lado emotivo. Eu não gosto quando usam isso apenas para só para fazer dele um grande espetáculo perdendo toda aquela emoção que quem gosta de carnaval é apaixonado e se emociona com isso.

E. S.: Isso que você comentou da espetacularização tem sido uma crítica muito constante do carnaval hoje em dia. Você concorda com ela? Acha que tem acontecido muito?

J. C.: Tem… É uma exigência do próprio momento do desfile da escola de samba. Aqueles carnavalescos que insistem em se manter fora disso acabam sofrendo uma pesada carga porque os modelos mudaram. Hoje está num “modelo Paulo Barros”. Eu particularmente não acho essa coisa toda, porque eu gosto de enredo. O carnaval do “Vou levar sua alma” eu fiquei “cadê o enredo?”. Tinha espetáculo, mas faltou a coisa básica fundamental que é um quesito: o enredo. Você vai imaginando que é uma coisa depois vai aparecendo Priscilas e Indiana Jones e tudo mais… Só num comparativo, eu gosto de carnaval que tem enredo que você entenda, se comunique com o público, emocione o público. Se tiver aparatos tecnológicos, acho sensacional, mas que contenha essa fusão toda no espetáculo.

E. S.: E como estão os preparativos da unidos do Porto da Pedra?

J. C.: Ah! Estão a todo vapor! Tem que estar, né? Faltam duas semanas e temos que aprontar o carnaval! Acho que a Porto da Pedra vai ser uma boa surpresa, até porque a gente teve desde muito cedo uma enxurrada de críticas, então a expectativa de quem assiste e gosta não é das maiores e nós vamos até usar isso a nosso favor, porque o problema é sempre quando se espera demais de uma coisa e fica difícil de atingir e quando já entra com o nariz torcido e você apresenta algo bonito, você pode surpreender. Então a gente está buscando isso: ser uma agradável, uma excelente surpresa no carnaval de 2012. Um enredo que tem enredo, apesar de falarem que iogurte não dá carnaval, dá carnaval! Tudo dá carnaval desde que você explique e tenha início, meio e fim e consiga contar uma história. Então a Porto da Pedra vai a todo vapor para o seu carnaval!

E. S.: Esse ano, você não esteve a frente da produção do carnaval da Porto da Pedra desde o início do processo. Isso prejudicou de alguma maneira o processo criativo?

J. C.: Olha, eu não tive nem tempo para pensar nisso, vou ser sincero. Eu fui convidado. Me perguntaram ontem : “você mudou alguma coisa?” Lógico que mudei! Se eu não precisasse mudar nada, não precisaria ter entrado um outro profissional. O carnaval teve um realinhamento, algumas coisas foram aproveitadas, mas outras foram mudadas sim, até porque seria ilógico…  Para que você vai fazer uma coisa que mexe com o emocional de uma escola que é tirar um profissional do carnaval que já está na casa, para colocar outro no meio do caminho? Enfim, se atrapalhou eu não tive tempo, porque eu cheguei para ser solução e busquei sempre isso como meta: sem atrapalho, sem problemas e com soluções.

E. S.: E você já entrou para fazer o carnaval desse ano na Porto da Pedra com o tema definido. Você acha mais difícil começar um trabalho que já tenha um enredo definido?

J. C.: Assim, é um desafio profissional. Acho que tudo é muito válido na vida da gente que trabalha com essas coisas e, no meu caso, você está sendo testado. Atrapalhar não pode atrapalhar. Se você está atrapalhado na sua área, sai dela! Vou fazer bolo ao invés de fazer carnaval. Então não pode ter essa coisa de “ah já tava meio caminho andado” ou “Ah, eu peguei o bonde andando”. Não! Se você aceitou o desafio, você assume as consequências; sei de todas elas; não posso ficar culpando quem saiu e nem dizer que eu entrei no meio. Eu tenho que dizer que a gente busca soluções para que o carnaval seja um sucesso.

E. S.: E quais foram as principais dificuldades que você enfrentou?

J. C.: O tempo apenas. Eu entrei na final do samba, então precisou haver um período de tempo massacrante para a gente pode recuperar aquilo que estava perdido que era o tempo. Por isso que eu falo que não se tinha tempo para ficar: “oh vida, oh azar”. Não faz parte nem da minha personalidade como pessoa nem como profissional ficar lamentando nada. Eu dou graças a Deus porque eu estou fazendo algo que eu gosto e espero que fique muito bonito o trabalho que a gente vai apresentar no domingo de carnaval. Sem delongas.

E. S.: Para terminar, a pergunta que todo mundo faz: que surpresa você pode revelar para os nosso leitores?

J. C.: A surpresa vai ser no carnaval! Vai ser aquilo que vocês vão ver na avenida: o carnaval como um todo. Porque não teve nada mais massacrado do que o enredo da Proto da Pedra desse carnaval de 2012. Eu não me lembro de nenhuma outra com tanto massacre assim. A gente já viu de tudo, de bacalhau a cabelo e iogurte virou impossível. Imagina! Já tivemos gás e camarote n. 1, que foi vice-campeão. Nunca vi tanta critica ao iogurte, que é uma delícia mundial de crianças e adultos. Isso não dá carnaval? Dá sim!

Claúdio Rocha: E Camarote n. 1 ainda foi bem avaliado no quesito enredo.

J. C.: Exatamente. Parece que houve uma campanha dirigida à nossa escola e a escola encara isso como um desafio ótimo. Às vezes nós já vimos e cansamos de ver isso em carnavais: escolas que são favoritíssimas e quando chega o carnaval você se pergunta: “essa era a favorita?”. Então, às vezes favoritismo é horrível, porque tem que ser muito. E nós já vamos entrar com o público com aquele pensamento: “não vamos esperar nada deles, eles tem um enredo que é iogurte”. E esse é um enredo que todo mundo pré-julgou, o que é um absurdo, você só pode falar de algo depois que você viu. Ninguém viu nada. Está todo mundo se perguntando: “como ele vai apresentar o iogurte? Como será?”. Eu ouvi esse fim de semana: “você está com a maior responsabilidade porque aquilo que você vai mostrar é que vai determinar o sucesso ou não da escola”. Sim, com certeza, é aquilo que nós vamos mostrar; é um conjunto de plástica, de enredo, de história, de comunidade cantando e alas; aquela coisa toda. Depois disso sim podem falar mal. Antes eu acho uma injustiça muito grande o que fizeram com a escola.

C. R.: Com a escola e com você também.

J. C.: Na realidade eu herdei isso. Qualquer outro profissional que entrasse aqui ia receber a mesma carga. Eu não considero por mim; não acho que é comigo. Foi com o tema escolhido da escola e lógico a mudança de carnavalesco não ia mudar em nada a crítica a favor ou contra. Ela continuou. As pessoas criticam, mas não vem saber qual é o enredo ou como a história vai ser apresentada. Quem chega aqui e a gente conversa e depois pergunta o que achou do enredo, falam: “o enredo é maravilhoso! Quem não der 10, é alguém que está de má vontade”. E isso eu ouvi de comentaristas que vieram e perderam três horas comigo explicando as coisas. Porque é o seguinte: o bom enredo não é aquele que tem um grande tema, é aquele que é bem explicado e bem desenvolvido. Você pode ter o tema mais incrível do carnaval e chegar lá e você não entender nada. E isso passa ser um péssimo enredo. O bom enredo é aquele que tenha início meio e fim, que tenha carnaval, luz, requinte, beleza, que envolva a plateia; um bom samba que dê energia à escola. Esse que é um conjunto de um bom enredo e nós vamos levar essa coisa para lá. Agora, depois do desfile da gente, ai sim pode ter críticas. Antes, é só maldade.

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